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PRESTE ATENÇÃO! O que está por trás de um adolescente com ideias suicidas?

Qual o mundo que se apresenta a esses jovens? Quais as expectativas que podem ter perante uma sociedade em que o sucesso é uma ideia que escorre pelas mãos?

Um adolescente com ideação suicida, quando entra em meu consultório, geralmente trazido pelos pais, carrega o peso da decisão de suportar ou não a vida. Precisa de um tempo para organizar as ideias e, quase sempre, precisa de ajuda médica para suportar esse período. Esse tempo significa algo que chamo de “conversa à beira do abismo”, um lugar onde se olha para além da escolha da morte, um lugar mais difícil e que traz marcas de histórias e afetos.

Junto com ele, vem uma estrutura familiar complexa, em que o desejo de morrer também está ligado às relações entre os familiares. Com frequência, os pais querem apenas entregar o filho ao cuidado do profissional, sem se implicar no tratamento e entrar em contato com a possibilidade de que as ideias suicidas são um sintoma de algo que acontece na família e que não é falado.

Entre adolescentes, encontramos múltiplos fatores para as causas do suicídio, desde o uso de drogas lícitas e ilícitas, questões orgânicas, hormônios típicos da faixa etária, o início de uma separação dos pais e a definição de carreira, entre outros. Este texto foca apenas em um dos recortes, que é o do aprendizado da tolerância à frustração, a saída da superproteção às crianças e o mal-estar do mundo que se apresenta ao adolescente ao perceber a desesperança que o rodeia.

Conversas sobre esses temas deveriam estar mais presentes nas famílias e nas escolas, sem romantismo, especialmente após fatos ocorridos. Longe da possibilidade de tornar aquele que se suicidou alguém especial, por vezes um herói, precisamos dar voz e acolher aqueles que sentem a angústia de enfrentar um mundo vazio.

“O suicídio na adolescência foi a segunda principal causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos em todo o mundo, em 2016.”

A palavra “adolescente” vem do latim “ad” (a, para) e “olescer” (crescer), significando o indivíduo apto para crescer, como também é uma palavra derivada de “adolescer”, que significa “adoecer”. A partir dessa dupla origem, há uma conotação que aponta tanto para uma aptidão “para crescer” como para “adoecer”.

Encontramos jovens que, frente a uma angústia aniquiladora e sem defesa, dirigem a sua agressividade a si mesmos e aos outros. Talvez possamos pensar que alguns desses jovens não se sentem bons o suficiente para que outros reconheçam o valor de sua existência. Assim, por vezes, procuram, por meio de atos extremos, um reconhecimento, um arriscado pedido para o seu valor, a sua existência. Talvez o suicídio seja o último e extremo pedido.

Qual o mundo que se apresenta a esses jovens? Quais as expectativas que podem ter perante uma sociedade em que o sucesso é uma ideia que escorre pelas mãos? Será que preparamos os adolescentes para a vida adulta e as frustrações decorrentes dela? Podem eles ainda terem sonhos de vida perante o “sucesso” imediato de outros adolescentes que ostentam poder, joias, armas e violência? E os pais, quando estão presentes, conseguem ter resiliência suficiente para dar amorosamente aos filhos esse olhar para a vida? Seguem essas e tantas outras perguntas.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 800 mil pessoas morrem por suicídio todos os anos. O suicídio foi a segunda principal causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos em todo o mundo, em 2016. De acordo com o órgão, um em cada cinco adolescentes enfrenta desafios de saúde mental. A instituição estima que metade de todas as doenças mentais começa aos 14 anos.

Um brasileiro se suicida a cada 46 minutos, segundo dados fornecidos pelo Ministério da Saúde para o ano de 2016, que, possivelmente, são um subdiagnóstico. Esses dados certamente são maiores para o ano passado e devem crescer neste ano. Em dez anos, houve um aumento de 28% de suicídios em homens e 2,4% em mulheres, de acordo com o Ministério. Nesses dados, não estão em conta as tentativas de suicídio nem os acidentes de pessoas com ideação suicida.

A adolescência é um longo período de escolhas, de elaborar a falta dos cuidados que se teve ou não teve na infância e tornar-se responsável por eles. Assim também é o tratamento psicológico com um jovem com ideação suicida. O adolescente que não fala sobre suas questões tem o risco de colocar em ato sua insuportável angústia.

No consultório, esse adolescente nos conta suas angústias das mais diversas formas. Fala por meio das músicas que escuta, da forma como se veste, de como é a sua vida com os amigos e em casa. Com frequência, sente-se isolado, não aceito pelos outros jovens, e elabora crenças que toma como verdade.

Segundo os Cadernos de Socioeducação Paraná, “os adolescentes que vivem sozinhos ou são separados da família estão mais vulneráveis ao cometimento de suicídio, decorrente, dentre outros fatores, do sentimento de desamparo e/ ou falta de contato familiar”. Esses adolescentes, por vezes, vão encontrar somente no suicídio a saída de suas dores, ainda mais quando há um transtorno mental aliado ao uso de drogas, especialmente o álcool. Compreender esse adolescente como um ser singular e possibilitar a ele um espaço de escuta e de troca são importantes estratégias para lidar com as ameaças de suicídio.

A dor de existir, de entender que vivemos em relação e troca com outras pessoas, de não ser mais uma criança autossuficiente e, por isso, aprender a se frustrar, é o desafio para o adolescente e, muitas vezes, para a sua família. A mesma dor toca a todos nós em intensidades diferentes, produzindo sintomas ou, mais saudavelmente, poesias e atos poéticos, que nos dão outro sentido à vida.

*Por Tonio Luna

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