SPFW N51: o penúltimo dia de desfiles contou com conforto, representatividade e muita música
No penúltimo dia do São Paulo Fashion Week, o conforto se uniu à preocupação por tecidos naturais e aconchegantes feitos de forma precisa. O caimento e o corte não foram deixados de lado pelas marcas que marcaram o 4º dia de desfiles, que aconteceu no sábado (26).
LEIA TAMBÉM: SPFW 51: a edição de 2021 conta com 10 marcas estreantes
A representatividade também marcou presença, com grifes de estilistas negros exaltando suas raízes africanas, como Isaac Silva e TA Studio. A música em destaque guiou algumas das apresentações, como a da LED, de Celio Dias, que mostrou quatro miniclipes com cantores diferentes, todos em cenários que representavam ambientes de casa. Uma das estreantes no evento, Carol Bassi, escolheu Bárbara Fialho para cantar uma música de sua autoria enquanto passeava por praias e espaços do Rio de Janeiro.
Confira os highlights do penúltimo dia de desfiles:
ROCIO CANVAS
A marca Rocio Canvas, do curitibano Diego Malicheski, fez sua estreia no SPFW mostrando uma coleção feminina muito ligada com a arquitetura e a alfaiataria, com looks atemporais, para uma mulher prática e contemporânea. Peças sem gênero em tons como amarelo, rosa, verde claro, além de jeans, em cortes perfeitos.
Diego Maliceski, investe no minimalismo em suas coleções. Ele fez sua estreia no SPFW e abriu a agenda de desfiles online de sábado.
LED
A LED, de Celso Dias, apresentou o fashion film “Desejo Coletivo”, dividido em miniclipes com novos cantores, filmados em ambientes dentro de casa. Davi Sabbag, Cibi Caetano, Alice Caymmi e Dani Vieira foram os cantores parceiros. O estilista, que sempre faz uma moda política, não deixou passar em branco o momento atual.
“Quis mostrar esse desejo coletivo que todos estamos tendo agora, apesar do retrocesso e do desgoverno que dificulta a vontade de sair”, afirmou na entrevista após a apresentação.
Cada miniclipe mostrava o cantor ou cantora ao lado de amigos, demonstrando o desejo de relacionamentos e aglomeração. Com seus crochês coloridos, sem gênero e atemporais, que se misturam a looks feitos em tecidos tie-dye.
Estampas de roupas assinadas em uma collab com João Vitor Lage, foram colocadas pelas paredes dos ambientes. Os tecidos estarão à venda para quem quiser levar alegria para casa. Os looks de crochê feitos com fios Pingouin também poderão ser adquiridos.
LED apresenta uma moda acessível, diversa e com propósito, além de ser muito confortável, ideal para ficar em casa ou sair. No fim, uma das frases emblemáticas de Celio Dias: “Abaixo o Macho Astral”, escrita numa bandeira é mostrada por um modelo negro.
SANKOFA: TA Studios
A TA Estudio, da estilista Gisele Caldas, a qual participa do Projeto Sankofa, criado pelo movimento Pretos Na Moda, apresentou sua coleção Adinkra. A coleção trouxe elementos da cultura Iorubá e seus arquétipos divinos. As peças são marcadas por cores terrosas, verdes e avermelhadas, as quais remetem a rituais de oferendas e confirma a importância da religião na criação da estilista. E a camisaria é o fio condutor de todos os looks.
Gisele apostou na camisaria e em roupas confortáveis, como saias e calças. As estampas também estão ligadas aos rituais Adinkra, como o Akoma Ntoaso (a cruz coração): tolerância, paciência e união. E o Bese Saka (a flor): poder, riqueza e abundância.
SANKOFA: Silvério
A escuridão serviu de modelo para a grife Silverio. Os looks pretos, sem gênero, apareceram ora em apenas uma manga, ora em recortes inesperados, mas sempre mais justos que o restante. Na verdade, a ideia foi desmitificar o fato da escuridão ser uma coisa ruim.
“Essa matéria escura é tão benevolente que permite que se transforme tudo que desejarmos, pois nesse domínio é possível dar vozes aos desejos mais originais, reconectarmos com nossa intimidade, religiosidade e intuição”, afirmou o diretor criativo Rafael Silvério. Essa ideia errada de que o escuro é perverso, segundo ele, é a raiz do racismo. Rafael é um dos criadores do projeto Sankofa, pensado para valorizar estilistas negros.
FREIHEIT
A grife Freiheit, de Marcio Mota, com apenas dois anos de vida, apresentou sua coleção filmada na Vila Itororó, em São Paulo, um local de 6 mil m² entre os bairros Liberdade e Bela Vista, com um palacete histórico e 20 casas que estão sendo restaurados pela prefeitura de São Paulo.
Cenário em ruínas perfeito para o universo punk rock que serviu de inspiração, ao lado do movimento russo chamado suprematismo, criado pelo pintor Kazimir Malevich (1878 – 1935), que tem como alvo usar formas geométricas básicas, como círculos e quadrados.
Tudo isso serviu de base para a confecção de roupas retas, secas, com cortes exatos e minimalistas, mas de forma ampla. Essa rigidez nas formas se transformam em capas, bermudas, calças, moletons largos e t-shirts. Uma marca masculina, mas possível de ser usada por mulheres, como provou Daiane Conterato, única mulher a desfilar nesse cenário “apocalíptico”.
As estampas em preto e branco foram criadas pelo artista Lucas Lander. Cores escuras são marcantes nas peças, que depois recebem tons alegres como o rosa. Tricôs e náilon também marcaram presença na coleção.
NERIAGE
Falando de intimidade e liberdade, a estilista Rafaella Canielo, da Neriage, teve como inspiração principal a obra “Sentimental Journey” do fotógrafo japonês Nobuyoshi Araki, a qual retrata sua esposa deitada sobre um velho barco. Quatro modelos dentro de uma casa em preto e branco e depois em meio à natureza mostram a necessidade do ser humano em estar livre.
Roupas delicadas em cores como amarelo, azul, verde e rosa clarinhos se combinavam com detalhes em brancos e pretos. Com destaque especiais para os plissados poderosos em determinados looks, especialmente nas mangas, que quando abertas lembravam asas de borboletas. Os looks traziam um ar oriental e, como está sendo o foco deste penúltimo dia do SPFW, muito conforto.
MISCI
Uma viagem ao passado do estilista. Airon Martins, da Misci, natural da cidade de Sinop, no Mato Grosso, apresentou sua coleção Boléia, uma homenagem a sua infância passada no bar da família à beira de uma rodovia. O filme feito na lateral da Marginal Pinheiros, em São Paulo, sob a ponte Estaiada, é emblemático, principalmente para quem vem de fora.
Formado em designer de mobiliário, o estilista da Misci, cujo nome vem de miscigenação, critica o fato de seda e algodão brasileiros serem exportados para grifes gringas e voltarem para cá com preços altíssimos, e o design brasileiro não receber a mesma atenção.
“Exportar o design é exportar toda a cadeia que faz parte desse processo”, afirmou Airon Martin.
Estampas, texturas, cores e dizeres inspirados nas famosas frases da cultura popular brasileira aparecem em destaque feito com matéria prima nacional, como o algodão orgânico da paraíba.
Essa ideia de caminhão, segundo o estilista, é uma viagem à sua infância. Se antes o foco era mais no masculino, agora a marca veio com uma conexão mais forte com o feminino. O estilista colocou bolso em camisas e tops, um deles fazendo referência à memória de suas avós e mãe, que guardavam dinheiro no sutiã.
CAROL BASSI
A modelo Barbara Fialho foi a estrela do fashion film da estreante Carol Bassi, marca que tem sete anos, exibindo vestidos monocromáticos com mangas amplas, bufantes e com babados, leves e confortáveis, em locais inesperados.
Barbara também cantou a música tema do vídeo, de sua autoria, chamada “Um Beijo”, enquanto passeava em praias e recantos do Rio de Janeiro, a inspiração da marca.
A coleção traz modelagens amplas, numa cartela de cores vibrantes, uma tendência para o pós-pandemia proposto pelas grifes neste SPFW. Os comprimentos são variados do curto ao longo. A coleção foi desenvolvida em parceria com o stylist Marco Gurgel.
ISAAC SILVA
Uma homenagem aos povos antigos brasileiros e africanos marcou a apresentação de Isaac Silva, que trouxe inspirações afro-indígenas para sua coleção feita em parceria com a Havaianas, as estampas enfeitaram tanto as roupas quanto os chinelos.
Elementos da religiosidade e espiritualidade se somaram ao respeito pela natureza, sempre presente na cultura dos dois povos representados na coleção. O filme fez referências a rituais de purificação e proteção. A cabocla Jurema, entidade conhecida por expressar de forma popular a fusão de culturas que resultam do misticismo afro-indígena, também foi representada no vídeo.
Com modelos negros e índios, incluindo o pataxó Noah Alef, a coleção traz cores como verde, amarelo, vermelho, além do branco e do preto, em peças que respeitam a silhueta de todos, não importa o tamanho.
Isaac reinterpretou as capulanas africanas, tecidos estampados usados principalmente pelas mulheres de Moçambique, desenhos indígenas e demais elementos presentes nas religiões africanas para fazer sua coleção “Axé, Boca da Mata”.