CULTURA ARTES

Exposição mostra arte pelas lentes de uma Polaroid

Em cartaz no MON, fotógrafo belga aborda temas como conflitos culturais e o sentimento de ser estrangeiro

Num período em que crise migratória e termos como radicalismo, intolerância e embate – na política, na religião, na cultura – são preeminentes, a exposição Charif Benhelima: Polaroids 1998-2012 adquire um interesse especial. A temática, no entanto, não é nova para o fotógrafo belga.

Já nos anos 1990 o artista construía séries em torno da identidade, conflitos culturais, memória, os sentimentos de ser estrangeiro e de não pertencimento. Exemplo é Welcome to Belgium (1990-1999), que inclui seu próprio retrato, bem como o de imigrantes que viviam em situação ilegal no país.

A busca por identidade e pertencimento diz respeito à biografia de Charif Benhelima (Bruxelas, 1967), filho de pai marroquino e mãe belga, órfão aos oito anos, de origem semita, como descobriu na idade adulta.

Suas fotografias expostas no Museu Oscar Niemeyer dão sequência aos assuntos dos anos 1990, mas com uma estética distinta de Welcome: Benhelima passou a utilizar uma câmera Polaroid 600 há quase 20 anos – ela “te convida a olhar de uma forma diferente”, já afirmou o artista. Mais do que o resultado plástico, o artista vem experimentando efeitos como excesso de luz, reflexo, contraste e quebras para borrar referências de tempo e espaço, questionar conceitos e noções prévias e elaborar sentimentos.

Estética da invisibilidade
Harlem on my mind: I was, I am (1999-2002) é o ponto de partida desse projeto em Polaroid e uma das quatro séries exibidas no MON, num percurso cronológico ilustrativo do desenvolvimento da pesquisa e que confere unidade à mostra. Pelo próprio uso da Polaroid e pelas distorções causadas por reflexos em vidro ou na água, excesso de luz ou sombra, o Harlem documentado por Benhelima (há sujeira, desordem, corpos obscuros) é fragmentado, elaborado por negativos e poderia muito bem ser o de décadas atrás.

Semites (2003-2005) também constrói um “documento” ao reunir retratos de anônimos (alguns do próprio artista) de origem árabe e judaica, mas perde força ao reduzir suas 135 fotografias da mostra original ao pequeno conjunto atual. Afinal, o interesse aqui não parece estar tanto nas imagens individuais – porque Benhelima borra traços físicos e de vestimenta, da identidade dos retratados –, mas nesse mesmo, único patamar em que o artista os coloca.

O resultado dos efeitos é uma estética da evanescência ou da invisibilidade, como já foi cunhado, que demanda a atenção e a subjetividade do espectador não tanto para desvendar o objeto fotografado, mas para repensar temas livres de contexto, sem história, em sua efemeridade, instabilidade, no limite da existência. O conjunto da exposição cria nesse espaço como que um tempo suspenso, em que o mundo é zerado. Por vezes beirando o abstrato, as imagens de Benhelima provocam uma realidade a ser (re)construída.

SERVIÇO
Charif Benhelima: Polaroids 1998-2012
Curadoria: Daniella Géo e Christophe De Jaeger
Em cartaz até 3 de abril de 2016.
Museu Oscar Niemeyer – R. Marechal Hermes, 999, Centro Cívico. (41) 3350-4400.

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