CULTURA MúSICA

Rock in Rio: o que mudou na carreira dos artistas e bandas desde 1985?

Diego Godoy entrevista o produtor musical Vadeco Schettini para uma perspectiva sobre o Rock in Rio do passado e do presente

Esta semana terminou o Rock in Rio, um dos maiores festivais de música do mundo. Muito provavelmente é o evento que mudou a forma de fazer shows e eventos, principalmente no Brasil.

Iniciado em 1985, o festival deixou marcas na música como o show icônico do Queen de Freddie Mercury que contava que ficou surpreso com o público cantando suas músicas inteiras, como “Love of My Life” que não era um grande sucesso na Inglaterra na época.

Assisti ao Rock in Rio de 2022 e me arrependi de não ter ido pessoalmente! Os shows do Coldplay e da Camila Cabello me chamaram a atenção pela interatividade, com luzes, coreografias, é quase um espetáculo de teatro ensaiado cena por cena.

Um show do Rock in Rio de 1985 agradaria o público de 2022?

ROCK IN RIO 1985
(Foto: reprodução)

Me perguntei isso assistindo aos shows deste ano.

O que mudou na carreira dos artistas e bandas desde 1985?

Convidei o Vadeco Schettini, especialista em música, produção musical e fundador de um grande estúdio para dar sua visão.

Vadeco Schettini, especialista em música, produção musical e fundador de um grande estúdio
Vadeco Schettini (Foto: arquivo pessoal)

Diego: Vadeco, muito obrigado por topar responder essas perguntas. E aí? Uma banda do Rock in Rio de 1985 agradaria o público de 2022?

Vadeco: Eu que agradeço! Adoro falar sobre isso!

Sobre sua pergunta: tenho certeza que não! Posso começar a minha resposta pelo viés da parte técnica envolvida hoje no show business. No que diz respeito ao som: temos graves que praticamente “não existiam” na década de 1980, a qualidade sonora em relação ao espectro de frequências, projeção do som no ambiente e ao volume que podemos chegar hoje é incomparável ao que se podia fazer naquele tempo.

Se falarmos da parte visual temos um outro abismo de tecnologia, são telas de LED, projeções mapeadas, laser, caminhões em equipamentos de iluminação, fogos de artifício e efeitos especiais, tudo devidamente sincronizado com a música sendo tocada.

Assim como para que o show ocorra sem surpresas do início ao fim muitas das ditas “surpresas” virais que compartilhamos nas redes sociais também tem seu planejamento, porém como estamos mais interessados no entretenimento e na emoção que isso nos causa, raramente pensamos sobre isso.

D: O que mudou na carreira dos artistas e bandas desde 1985? Vejo que os artistas precisam ter até mesmo um preparo físico quase atlético para “aguentarem” um show de quase 2 horas dançando e interagindo com o público e se apresentando dia após o outro, funciona assim mesmo? A garrafinha de cerveja em cima do piano de Freddie Mercury ainda seria aceita?

V: Uma das principais questões é que a indústria da música teve que se adaptar às novas tecnologias, antes a música era um dos negócios mais lucrativos da Economia e boa parte do lucro estava ligada a venda de discos, com o advento da digitalização (MP3 e hoje streaming) houve uma queda estratosférica na venda de álbuns físicos e a indústria teve que se reinventar.

Uma das reinvenções é o contrato conhecido como 360 graus. Nesse tipo de contrato a música do artista é apenas uma parte dos interesses da gravadora, além da música, fonograma, edição da composição, existe lucro em cima de shows, eventos, publicidade, sincronização, merchandising, atuação em filmes, séries e reality show, até licenciamento de produtos. Ou seja, a música é apenas uma parte de toda uma cadeia de distribuição e consumo que faz do artista do século 21 uma marca.

“Para que o artista consiga manter tudo isso funcionando é preciso se preparar quase como um atleta sim”.

Nessa preparação está contida alimentação, preparador físico, cabeleireiro, médico nas turnês, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, media trainer, e qualquer outra ferramenta que mantenha a marca funcionando objetivando sempre a melhor performance possível. Junto disso temos um público que está cada vez mais conectado com o que o artista tem para dizer, ele quer saber o que aquela “marca pensa” sobre os mais variados temas atuais. Ou seja, a garrafinha de cerveja sobre o piano do Freddie Mercury estava lá quase que por acaso, mas hoje vemos muito poucos acasos como esse no show business.

D: Como comentei hoje assistimos a shows muito mais interativos, com luzes, coreografias, é quase um espetáculo de teatro ensaiado cena por cena. Você acredita que Michael Jackson mudou a ideia do que um show deve entregar para o público desde “Dangerous”?

V: Não foi só o Michael Jackson, mas também Pink Floyd, Peter Gabriel, Madonna, Prince, Kiss, Iron Maiden, Jean-Michel Jarre, Genesis entre tantos outros.

Houve uma busca por conceituar os seus shows de maneira em que a pessoa do artista gradativamente ficaria menor em relação ao tamanho do palco e da potência de luz e som. Acredito que essa grandiosidade de artefatos contribuiu muito para que outras ferramentas pudessem ser desenvolvidas para aproximar o artista do público, pois ver o artista de perto é apenas um dos motivos que nos fazem ir até a um concerto.

D: Analisando Iron Maiden de 1985 e Iron Maiden de 2022, é a mesma banda? O mesmo show?

V: A banda é a mesma de 1985 com mais um guitarrista, Janick Gers, que aliás é super performático. O show é diferente, mas a essência me parece a mesma. O Iron Maiden é uma banda que não mudou muito desde a década de 1980, as fórmulas são muito parecidas, as referências são as mesmas, os efeitos especiais são muito parecidos com o daquela época, porém com um aparato tecnológico infinitamente superior. Para mim eles são uma banda que conseguiu se manter em um nicho sem arriscar muito, porém seus fãs são fiéis como poucos, talvez seja um dos raros casos em que, caso fossem cerceados de todo o espetáculo tecnológico, ainda seriam ícones em seu nicho.

Para finalizar, uma frase que eu adoro: “Não entendo nada de música. Na minha área você não precisa disso”. Elvis Presley

E você o que achou do Rock in Rio 2022?

Abraço e até o próximo artigo!

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