Luci Collin: um silêncio que quer falar
Marcamos uma conversa no dia em que sua gata faz quatro anos. Ísis, a gata, parece não querer dividir a dona pelo que, ela sabe, não será uma conversa curta – Luci escreve desde 1984 e temos uma pauta: uma carreira que começou na música, passou à margem da política e culminou em uma indicação ao Prêmio Oceanos em 2015, na posse de uma cadeira da Academia Paranaense de Letras e no segundo lugar no Prêmio Jabuti de Poesia – os últimos dois em um intervalo de dois dias, em outubro de 2017.
Sua chácara abriga um silêncio acompanhado de plantas, e o ar de fora da cidade equilibra o tom de uma vida dedicada ao zen-budismo, à docência e à literatura. Difícil calcificar em números a quantidade de textos que já saíram das mãos e da cabeça dessa escritora que, à parte o afã que tem causado com os últimos arremates, já está quase no trigésimo livro, além de uma ópera, das traduções, do pós-doc – dois, aliás –, das graduações em Piano Clássico, Percussão e Letras e de uma carreira na UFPR como docente da graduação em Letras.
“Sempre andei sozinha, nunca fui de bando”, confessa. Fez dessa solidão e a necessidade de uma convivência subjetiva com sua biblioteca o motivo para a emancipação precoce. De eventos a discursos políticos, o dinheiro arrecadado na primeira empresa foi o propulsor do primeiro livro publicado: Estarrecer (1984), feito clandestinamente em uma gráfica que operava no contraturno. Há cinco anos, teve sua rotina completamente alterada pelas primeiras validações da crítica. É coincidente que o livro que a tenha projetado se chame justamente Querer Falar. Reclama-agradecendo que quer justamente isso: escrever, uma espécie de falar em silêncio.
A convivência com o turfe, praticado pelo avô e pelo pai, parece explicar o percurso – assume, comprometido pela própria personalidade mais reservada – editorial: à vista grossa, torto e, a quem acompanha de perto, avant-garde. Luci é o cavalo que recebeu poucas apostas ao longo do caminho. E nem por isso menos certeiras. E ela segue, ali à frente, em um passo silencioso, construindo uma nova voz de nós mesmos, ao redor desta vida, como quase diria seu poeta predileto.
*Matéria escrita por Julie Fank e publicada originalmente na edição 206 da revista TOPVIEW.