SELF COMPORTAMENTO

Expertise para quem precisa – a história de Luiz Hamilton Ribas

Como Luiz Hamilton Ribas se entregou à causa das pessoas com deficiência e fez da ASID Brasil uma organização sustentável

Luiz Hamilton Ribas tinha 17 anos quando descobriu que teria que passar por uma cirurgia complicada na coluna. A escoliose que vinha tratando há anos com intermináveis sessões de fisioterapia havia piorado a ponto de diminuir sua expectativa de vida. Nos seis meses que o separavam da operação, preocupado com os riscos, o adolescente começou a questionar o que estava fazendo da vida.

O resultado da autoanálise foi incômodo. Ele se deu conta de que passava 12 horas por dia jogando no computador, estudava pouco e não se comprometia com nada. “Comecei a pensar se estava usando o meu potencial, dando atenção para a minha família e meus amigos”, lembra. “Veio a cirurgia e fiquei um mês dependendo de as pessoas me darem banho, me ajudarem a andar. Foi uma lição de vida muito grande. Essa experiência foi muito importante para formar quem eu sou.”

O safanão fez Ribas abrir os olhos e, talvez, tenha sido o responsável por fazê-lo se interessar pelo trabalho da empresa júnior dos cursos de Ciências Sociais Aplicadas da UFPR quando começou a cursar Economia, pouco tempo depois. Foi ali, num ambiente de trabalho voluntário, que ele conheceu o então estudante de Administração Alexandre Amorim e o colega de curso Diego Moreira — junto com Ribas, os co-fundadores da ASID Brasil.

A ideia da organização, criada para beneficiar pessoas com deficiência, nasceu de um trabalho de faculdade. Amorim elaborou o projeto inspirado por sua experiência com Laura, sua irmã mais nova, que tem síndrome de Down e autismo. Os colegas compraram a ideia de colocar o trabalho em prática em 2010.

“Já nos conhecemos num ambiente altamente empreendedor e de voluntariado. Ninguém estava interessado em ganhar dinheiro, mas em aprender”, conta Ribas.

Empreendedorismo

Ribas em evento da ASID. O ideal da organização é a criação de uma sociedade em que pessoas com deficiência possam se desenvolver em toda a sua potencialidade e ser incluídas no mercado de trabalho e em todas as áreas da sociedade.
Ribas em evento da ASID. O ideal da organização é a criação de uma sociedade em que pessoas com deficiência possam se desenvolver em toda a sua potencialidade e ser incluídas no mercado de trabalho e em todas as áreas da sociedade.

Até aqui, pode parecer uma história sobre altruísmo. Mas a trajetória da ASID também é um “case”. Os três fundadores começaram a tocar a organização sozinhos, com um capital de R$ 330 e sem receber um tostão de retorno durante um ano e meio. Ribas conta que fazia bicos nos finais de semana lavando louça em um restaurante e entregando panfletos.

Hoje, instalada em um escritório de dois pavimentos perto da Praça do Gaúcho, a organização já tem uma equipe de quase 30 pessoas e é — contra todas as circunstâncias — sustentável.

Os fundadores usaram toda a expertise que tinham para criar um modelo de negócio em que as empresas que pagam pelos serviços da organização financiassem o trabalho gratuito que a ASID presta para instituições que atendem pessoas com deficiência. Segundo Ribas, é o que se chama de estratégia Robin Hood — algo diferente da caridade ou do assistencialismo que costumam ser associados ao trabalho sem fins lucrativos. É a economia que está por trás de uma famosa instituição indiana de combate à cegueira chamada Aravind, que cobra cirurgias de pacientes que podem pagar e opera sem custo os que não podem, exemplifica Ribas.

“Cada vez mais a sociedade está entendendo que trabalhar numa organização que gere impacto social e tenha um modelo de negócios sustentável é possível.” – Luiz Hamilton Ribas

“A grande diferença entre uma boa ideia e algo que vai gerar impacto para muitas pessoas é o modelo de negócio”, diz o economista, hoje Diretor de Marketing e Inovação da ASID — Amorim ficou como Diretor Executivo e Moreira deixou a organização recentemente. “Cada vez mais a sociedade está entendendo que trabalhar numa organização que gere impacto social e tenha um modelo de negócios sustentável é possível.”

Para chegar neste ponto, eles precisaram desenvolver um serviço que tivesse valor para os possíveis investidores — no caso da ASID, ações de voluntariado e inclusão nas empresas.

“Nossa caminhada até ter um faturamento foi muito difícil”, lembra Ribas. “A gente pensava que, tendo uma ideia bacana, as empresas iriam nos apoiar com doações. Mas não é bem assim. Você precisa dar algum tipo de retorno para elas.”

Na outra ponta, a organização ajuda as instituições que atendem pessoas com deficiência a desenvolver uma gestão mais qualificada — uma das principais lacunas encontradas por eles no terceiro setor.

Hoje, a receita anual da ASID é de cerca de R$ 1 milhão. “É como uma empresa”, explica Ribas — a certa altura da entrevista, interrompido por uma sineta na sala ao lado que sinalizava que um dos colaboradores tinha batido a meta de notas fiscais cadastradas.

“A única diferença é que tudo o que entra de receita acima dos gastos não é chamado de lucro, mas de superávit, que não é dividido e é reinvestido na organização”, explica o economista de 29 anos, disfarçado com camisa, calça e sapato sociais. “É por isso que você chega aqui e vê que a gente está vestido de roupa social e todo mundo tem metas. Funcionamos, no dia a dia, como uma empresa.”

Causa

ASID significa Ação Social para a Igualdade das Diferenças. O ideal da organização é a criação de uma sociedade em que pessoas com deficiência possam se desenvolver em toda a sua potencialidade e ser incluídas no mercado de trabalho e em todas as áreas da sociedade — cenário ainda distante do que temos hoje.

Diferentemente de Alexandre Amorim, que conheceu o tamanho do desafio a partir da experiência da própria família, Ribas não tinha qualquer ligação especial com a causa. A escolha de se lançar em um projeto sem fins lucrativos, por sinal, causou certa resistência em sua família, preocupada com sua segurança financeira. Mas, para ele, era uma questão de colocar seu conhecimento a serviço de algo em que acreditasse — poder “dar o melhor sem medo”.

“Fiz estágio em um banco e vi que estava dando o meu melhor para conferir cheques. Para quê?”, questiona, sugerindo que as indagações sobre o propósito de sua vida naquele susto da adolescência eram para valer. “Minha causa é colocar o meu conhecimento em prol de instituições e pessoas que precisam”, diz.

O jovem economista dá certa razão aos pais ao reconhecer que empreender em uma ONG significa abrir mão de ter uma vida financeira melhor. “É o conceito econômico do trade off. Quando você escolhe uma coisa e abre uma porta, está fechando várias outras”, explica.

“Mas, hoje, é engraçado: chegam as festas de família e meus pais querem contar as novidades da ASID para os parentes — que ganhou algum prêmio, ou que eu vou viajar para algum lugar para representar a ASID. Meu pai vai a restaurantes e diz que o filho é fundador de uma organização e precisa das notinhas. Hoje, eles são as pessoas que mais compram a ideia.”

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