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Sonia e Wilson Elias: na casa dos curitibanos com a Ton Sur Ton

Os empresários, que comandam a loja pioneira na decoração curitibana, falam sobre as transformações da área, o gosto por viagem e a história que construíram na cidade

Sonia e Wilson Elias não são arquitetos ou designers, mas podem ser considerados lançadores de tendências na decoração em Curitiba. Os empresários comandam juntos a Ton Sur Ton, loja pioneira no setor que se tornou parceira de primeira hora de alguns dos mais requisitados profissionais do ramo na cidade nos últimos 30 anos.

O casal deixou São Paulo em 1979. Wilson, hoje com 67 anos, havia se tornado o responsável pela filial curitibana da extinta marca de tecidos decorativos Formatex. Sonia, 61, tomaria a frente do ateliê Ton Sur Ton, criado pelo casal em 1985 para suprir a escassez de confeccionadores para lidar com os produtos. O negócio cresceu e, mais tarde, incorporou os móveis externos da Tidelli — até hoje uma das principais marcas da loja. Era o vislumbre do que a Ton Sur Ton se tornaria hoje, com seus 1.700 metros quadrados de área de exposição ocupados por uma luxuosa seleção de móveis de alto padrão e peças exclusivas assinadas por designers renomados.

Sonia e Wilson viram a decoração em Curitiba florescer. Quando chegaram, o mercado ainda engatinhava e o gosto do curitibano era bastante diferente, conforme os empresários contam na entrevista a seguir, feita na sede da Ton Sur Ton, na Alameda Dr. Carlos de Carvalho. Eles lembram como as tendências se transformaram nesses mais de 30 anos, comentam o trabalho dos profissionais de decoração, contam como conseguiram se tornar referência neste mercado em Curitiba e o que fazem para conciliar o trabalho e a vida conjugal. Leia a seguir:

Como é trabalhar em casal?

Wilson: Tem os dois lados. Acaba sendo bom, porque você tem uma certa hegemonia de pensamentos e, como o caixa é um só, acaba se voltando para uma filosofia de trabalho única. Em contrapartida, interfere um pouco na vida pessoal. Afinal, são 24 horas juntos.
Sonia: Às vezes, as coisas se misturam. Uma coisa boa que conseguimos foi não ficar na mesma sala. Um fica no andar de cima e o outro, no de baixo.

É difícil impedir que os negócios interfiram na vida conjugal?
Sonia: A gente procura não conversar sobre a empresa em casa. É preferível, às vezes, ficarmos quietos, cada um fazendo uma coisa, para não termos que comentar. A gente procura falar sobre a empresa só aqui.
Wilson: Às vezes, não tem como evitar falar alguma coisa sobre a loja. Mas, na medida do possível, a gente não fala. Eu, por exemplo, a partir das 18h30, se me falarem sobre trabalho, digo: “Esqueça. Amanhã eu faço”.

É um acordo que vocês têm?
Wilson: É um pacto meio implícito. A gente já sabe perfeitamente os limites um do outro e respeita.
Sonia: Esse é um lado bom. Mas, realmente, não é fácil. Não são só 38 anos trabalhando juntos, são 45 anos vivendo juntos. Então, procuramos amenizar.

O que encontraram em Curitiba quando chegaram, há quase 40 anos?
Sonia: Era outra coisa. Curitiba, principalmente, era um mercado em expansão. Faltava praticamente tudo. Por muitos anos, a melhor loja de decoração foi a Formatex. Atrás dela, outras marcas de São Paulo também abriram — apesar de sabermos que o mercado daqui é muito difícil. Para se dar bem aqui, você precisa trabalhar, acredito, como nós trabalhamos. Somos empresários muito participantes. Não somos ausentes.

O mercado daqui é mais difícil que a média?
Wilson: O curitibano é exigente. Se você não trabalhar corretamente com pessoas exigentes, sai do mercado. É um público que sabe o que quer e tem amor ao dinheiro que está gastando.

Como conseguiram conquistar o curitibano?
Sonia: Todas as pessoas que nos conhecem, que conhecem a nossa história e nos veem no nosso dia a dia, dizem: “O diferencial da Ton Sur Ton são vocês, que conhecemos há 38 anos, que nunca abandonaram o negócio, que resolvem as coisas”. O diferencial é a confiança que as pessoas depositam na empresa. É isso que nos permite estar há tanto tempo no mercado e continuar. Também temos um trabalho muito forte com os profissionais do mercado — arquitetos, decoradores, designers de interiores. Quando eles acreditam na empresa, trazem os clientes.

Como é este trabalho com os profissionais?
Sonia: Fazemos a mostra Casa de Ideias uma vez por ano. Em 2018, são 17 profissionais, cada um montando um ambiente da loja. Teremos uma vitrine assinada por Jayme Bernardo, que, para nós, é um ícone — e que conhecemos desde que estamos aqui. Escolhemos grandes nomes todos os anos. Somos muito parceiros da Casa Cor. Neste ano, estamos com sete ambientes lá, com espaços muito diferenciados — tanto a Ton Sur Ton quanto a Natuzzi Itália, da qual também somos sócios. E, de vez em quando, reunimos arquitetos aqui, seja para um café da manhã de aniversário, seja para uma palestra. Sempre estamos procurando trazer os profissionais para algum evento.

“O curitibano é exigente. (…) É um público que sabe o que quer e tem amor ao dinheiro que está gastando.” – Wilson Elias

Quais diriam que foram os profissionais mais importantes da trajetória de vocês até agora?
Wilson: Há muitas pessoas que foram importantes na trajetória da Ton Sur Ton…
Sonia: Yara Mendes, Rosi Guelmann, Francis Meister, Gabriel Valente, Rosa Dalledone, Yvone Miyamura…
Wilson: Mais recentemente, Elaine Zanon, da Arquitetare, e Jayme Bernardo.
Sonia: São muitos nomes para lembrar. Há cerca de 300 profissionais com quem a gente já trabalhou.

Em termos de profissionais disponíveis, o mercado também mudou muito neste período?
Wilson: Quando nós chegamos, estávamos entrando na era em que o arquiteto começava a atuar no interior das residências. Quando eu comecei na decoração, há 51 anos, ouvia-se falar pouco em arquiteto de interiores. Havia decoradores — pessoas que tinham bom gosto e que foram se profissionalizando. De uns 40 anos para cá, a situação se inverteu. A maioria dos que fazem interiores são arquitetos. Isso também deu um impulso muito grande para o mercado de decoração.

Como?
Wilson: O arquiteto se tornou fundamental, principalmente para a decoração de alto nível. Para uma decoração média, qualquer vendedor de loja sabe mais ou menos o que pode ser feito — ele coloca os móveis na planta e faz uma casa razoável.
Sonia: Mas a ousadia depende dos arquitetos.

Que tendências puderam observar nestes mais de 30 anos?
Sonia: Nós começamos a trabalhar com uma linha de móveis mais clássica. Hoje, está muito contemporânea.
Wilson: Entraram em Curitiba indústrias que trouxeram bastante coisa de fora. A Itália entrou em peso na decoração. A decoração em Curitiba era muito puxada para o lado francês. Hoje, a linha italiana impera.
Sonia: E os designers de móveis também estão muito com a cabeça em Milão. Esse “rococó”, digamos, que havia antigamente, deu espaço para o moderno. Hoje está tudo muito limpo, clean.

O gosto dos clientes também mudou?
Wilson: Eu diria que Curitiba formou um mix de população bem diferenciado. Muitas pessoas vieram morar em Curitiba. Isso traz outras culturas, outras formas de ver o mercado. Na realidade, o curitibano nato continua, ainda, bastante conservador. Mas os arquitetos também mudaram a cabeça dele. O próprio público curitibano acabou notando que é bom se modernizar.
Sonia: Hoje também há muitas coisas ao alcance dos profissionais. Muitas palestras, cursos, mostras. Há a feira de Milão, a feira de High Point, a Art Basel em Miami. Eles estão indo a tudo e estão muito antenados. Acho que Curitiba está à frente de muitos lugares importantes em termos de profissionais, desde os mais jovens até os mais velhos.

“O arquiteto se tornou fundamental, principalmente para a decoração de alto nível.” – Wilson Elias

Como vocês procuram ficam a par das principais tendências?
Sonia: Nós temos parceiros exclusivos. Temos parcerias que já têm seus 30 anos. E temos uma parceria muito forte com a Tidelli, com a Natuzzi Itália, a Natuzzi Editions e com designers que nos dão exclusividade. O produto que temos aqui agrada porque só será encontrado aqui.
Wilson: Os principais lançamentos ficam a cargo desta gama de fornecedores que temos. São os fornecedores que estão na ponta, em sintonia com os lançamentos do mercado internacional. Então, temos realmente a confiança de que eles estão nos trazendo as últimas novidades.

Vocês acham que também acabaram influenciando nas tendências que ganharam força na cidade?
Wilson: Nós ainda lançamos tendências em Curitiba, como os móveis em couro e os móveis em corda da Tidelli. Toda vez que a gente lança alguma coisa que dá certo aqui, pode ter certeza que, logo em seguida, todas as outras lojas estarão procurando ter alguma coisa similar ao que a gente está vendendo.
Sonia: A gente arrisca, principalmente quando conseguimos exclusividade de produto.
Wilson: Acabamos trazendo o que há de vanguarda. Nossos fornecedores são realmente top de linha. Como somos a revenda exclusiva da grande maioria, quem acaba lançando a tendência somos nós. E os outros vêm rapidinho na cola. [risos]

Que assinaturas podemos encontrar na Ton Sur Ton hoje?
Sonia: Nós temos um trabalho forte com o Jader Almeida. Há um espaço bem expressivo na Ton Sur Ton com produtos dele — é um designer renomado, presente já há anos na feira de Milão e em muitos outros países. Tem o Ronald Scliar Sasson, também muito em alta. E, neste ano, também estamos lançando o [designer carioca] Zanini de Zanine. Então, estamos com algumas parcerias bem fortes. Mas os espaços exclusivos dentro da Ton Sur Ton são Tidelli, Natuzzi e Jader Almeida. Por enquanto. Quem sabe aparece mais algum daqui a algum tempo? Estamos nos estreitando e nos afinando para que, a cada dia que passa, a gente consiga fazer alguma coisa melhor e mais atrativa.

Como é a casa de vocês? Estão sempre trocando de móveis?
Wilson: A gente trabalha só com móveis da Ton Sur Ton. [risos]
Sonia: A gente não usa muito a casa. Todo mundo pergunta: “Com cada coisa bonita que chega aqui, vocês vão trocando tudo?” Mas, na verdade, não.
Wilson: E tem outra coisa. Estou com um sofá novo no depósito há um ano e pouco. Mas não troco o meu, que já tem 12 anos, porque está novo. A qualidade dos produtos que vendemos é muito boa.

“Muitas pessoas vieram morar em Curitiba. Isso traz outras culturas, outras formas de ver o mercado. Na realidade, o curitibano nato continua, ainda, bastante conservador. Mas os arquitetos também mudaram a cabeça dele.” – Wilson Elias

Quais são os planos para o futuro da loja? Pensam em sucessão?
Wilson: Eu diria que a nossa sucessão será com o pessoal que trabalha com a gente. Gradativamente, estamos dando funções para aqueles que são mais próximos da administração e estamos tentando fazer com que a própria equipe tome as rédeas de alguns setores para que a gente, a cada dia que passa, tenha um pouco menos de ação sobre a empresa. Mas, com certeza, a empresa vai existir enquanto nós existirmos.
Sonia: Nós temos um filho [Luciano, 43] que mora nos Estados Unidos há 18 anos. Ele nos ajuda de lá, porque é publicitário e designer gráfico, mas não quis cuidar da empresa. Então, fizemos uma diminuição [na prestação de serviços] para podermos dar conta e cuidar melhor do que gostamos, que é a parte da loja, da escolha de móveis, de viajar para conhecer algumas coisas. E para ter um tempo um pouco maior e melhor para nós, já que respiramos Ton Sur Ton.
Wilson: Quando começou a se tornar muito grande para nós, optamos por diminuir. Até os 120 anos, acho que não aguento trabalhar. Pretendo trabalhar só até os 110. [risos]

“Para se dar bem aqui [Curitiba], você precisa trabalhar, acredito, como nós trabalhamos. Somos empresários muito participantes. Não somos ausentes.” – Sonia Elias

Parar e levar uma vida mais pacata não passa pela cabeça de vocês?
Wilson: Nós não temos espírito para isso. Sou um pouco mais tranquilo, menos agitado. Mas, ao mesmo tempo, não posso ficar dois ou três dias sem fazer muita coisa.
Sonia: Viajar de férias, por exemplo, só se for para lugares com muita coisa para fazer. Não é aquela coisa de viajar para lugares em que não têm nem telefone e televisão. Vamos para a Disney, Nova York, para uma viagem de navio com coisas para fazer dia e noite. Nossos passeios são assim.

Conseguem fazer isso com alguma frequência?
Wilson: De duas a três vezes por ano a gente sai. E também fazemos algumas coisas alternadas. Eu, por exemplo, tenho um grupo de pescaria. A gente sai e eu fico uma semana fora. Neste dia 22, vou pescar no Pantanal. No dia 14 de setembro, vamos pescar na Argentina.
Sonia: Para as meninas já é um pouco mais complicado. Temos um grupo muito bom. Já fizemos viagens de navio, por exemplo. Estamos tentando retomar. Mas são mulheres — todas casadas, e nem todos os maridos são dos grupos de pescaria dele. Então, não é sempre que conseguimos administrar esse grupo.

Essa turma pega peixe ou é só história?
Wilson: Pega bastante.
Sonia: Eles só aprenderam agora a não trazer mais. Não adianta trazer o peixe grande, senão sobra na geladeira. Se trouxer em postas, até tem o que fazer.

“O diferencial é a confiança que as pessoas depositam na empresa. É isso que nos permite estar há tanto tempo no mercado e continuar.” – Sonia Elias

A cozinha faz parte dos momentos livres de vocês?
Sonia: Eu adoro cozinhar. E meu gosto pela cozinha está aumentando. Sempre cozinhei, minha vida toda. Quando nos mudamos para cá, eu cozinhava. De vários anos para cá, não dava mais, porque trabalho o dia inteiro. Então, agora, faço bolo para os meus clientes na loja duas vezes por semana. O cliente chega aqui sabendo que vai comer o bolo feito por mim. É um carinho que tenho pelas pessoas. E procuro fazer jantares no sábado à noite, um almoço no domingo. Estou pegando gosto de novo. E o Wilson faz parte de uma confraria de 17 amigos onde ele também aprende alguma coisa. Estou até sentindo ele começar a pegar um pouquinho o gosto.
Wilson: Eu só não faço mais em casa para não tirar o brilho dela. [risos]
Sonia: Tá bom… Mas é gostoso. É uma hora em que eu relaxo.

Para encerrar, quais são os maiores desafios para a Ton Sur Ton hoje?
Wilson: Enfrentar a carga tributária e algumas concorrências desleais. E a situação atual. Se o mercado melhora, tudo fica bem. Nós estamos em um patamar em que sabemos perfeitamente qual é o nosso ponto de equilíbrio e aonde a gente vai chegar.

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