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O ovo e a importância de um bom cardápio

Para quê servem os cardápios? mais que tinta sobre o papel, eles são um convite a nossa imaginação e despertam lembranças e emoções

Abri o cardápio de sobremesas, passei o olho e fiquei hipnotizado por aquela terceira linha. Eram quatro letras, divididas em duas palavras – só isso. Sobre o papel branco, fosco, de gramatura alta, lá estava escrito: “O Ovo”.

O ovo?

Como assim “O Ovo”? Que tipo de descrição é essa? Estão de sacanagem comigo. E como é bom ser alvo desse tipo de sacanagem. Todo cozinheiro que se preze, nos salões de tantos milhares de restaurantes espalhados por aí, tem a chance de nos provocar em cada cardápio apresentado, no entanto, são poucos os que têm a coragem de fazê-lo.

Dessa forma, o mínimo que podia fazer era dar voz àquela brincadeira, até porque ela era genial e todo toque de genialidade merece ser reconhecido. Fui fisgado na hora. Com direito a sorriso de canto de boca que nos é imediato quando somos surpreendidos. Confirmo o pedido. Esse mesmo, “O ovo” digo ao garçom. Sigo a conversa porém, 10 minutos depois, sou novamente surpreendido.

Dentro de um pote que imita o formato de um ovo, descansa na borda uma espuma alta que simulava a clara e, bem no meio, algo amarelo e redondo, isto é, literalmente como uma gema. O detalhe era que aquilo de fato não era um ovo, apesar de não o ser na sua forma original.

Na primeira colherada, logo na borda, descubro o gosto de coco. Assim sendo decido ir direto à fonte e encontro o doce de algo aí sim com ovo. Em resumo: o ovo de Helena Rizzo, chef do Maní, em São Paulo, era um sorvete de gemas envolto por uma espuma de coco sobre coquinhos caramelizados crocantes.

Uma baita de uma releitura, o que, portanto, tornou bem divertida a descoberta.

Um bom cardápio

Esta edição da TOPVIEW fala sobre gastronomia e, com o compromisso de tratar o tema sob o ponto de vista do marketing, não pude deixar de mencionar essa lembrança.

Os cardápios têm um poder além do enxergado pelos donos de restaurantes e chefs. Eles são passaportes para nossa imaginação. Nos levam longe, para memórias de infância e projeções de sabores que não conhecemos. Portanto está aí toda a graça da expectativa que é gerada em cima de um somatório de letras derramadas sob um tanto de tinta em uma folha branca. Alex Atala também merece ser lembrado por essa habilidade.

No menu do Dalva & Dito, por exemplo, você pode encontrar frases como “Pudim de leite. Generoso porque tenho trauma de infância”, “café de bule da avó” ou “Galeto macio como só a nossa televisão de cachorro consegue fazer”. Legal, né? Dá outro gosto comer assim. Bom apetite!

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