FASHION

Desfile de Viktor & Rolf leva um Van Gogh 3D à passarela

por Yasmin Taketani

 

Pode a moda ser arte? Ou mesmo arte fazer parte da moda?

Essas questões estão sempre a ressurgir em meio à ascenção do fast fashion, ao aumento dos estudos filosóficos e sociais sobre o tema e à valorização da moda como um fenômeno cultural. Sobretudo, a indagação costuma vir à tona no período dos desfiles de alta costura, quando a competitividade comercial perde relevância frente à criatividade, ao savoir faire, ao luxo e, quem sabe, ao avant-garde dos designers de moda.

A dupla holandesa Viktor & Rolf reformulou a questão ao levar Vincent Van Gogh (1853-1890) à passarela de sua alta costura primavera-verão 2015. A coleção Van Gogh Girls representou a busca pela essência e uma homenagem às raízes de Viktor Horsting e Rolf Snoeren, tanto na referência ao seu país de origem quanto ao seu primeiro momento na moda. Partindo da série de pinturas de Van Gogh em torna da temática campestre, o duo levou à passarela um clima bucólico e simples: assim como não há excessos ou exuberância nos quadros, que inclusive repetem seus objetos (os campos de trigo, por exemplo) em prol de explorar formas, cores, composições e intenções, também o desfile se quis simples.

Sua base foi o vestido baby-doll em formato trapézio, com chinelos e chapéus de palha. Mesmo a maquiagem – sombra, blush e batom rosa – evocava simplicidade e naturalidade. A partir daí, a marca explorou estampas floridas (feitas em batique) e, como é seu costume, as formas assimétricas e inusitadas. Em um crescendo, as flores saltaram do tecido em apliques 3D; os volumes aumentaram e ganharam novas formas; as cores se multiplicaram; a música passou do bucólico ao moderno; e os vestidos e chapéus evoluíram, interligados, em verdadeiras esculturas orgânicas.

 

Paisagens campestres de Vincent Van Gogh serviram de inspiração para a alta costura dos holandeses Viktor & Rolf.
Paisagens campestres de Vincent Van Gogh serviram de inspiração para a alta costura dos holandeses Viktor & Rolf.

 

Desfile de Viktor & Rolf leva um Van Gogh 3D à passarela
“Nós sempre usamos a moda como comunicação – é o nosso meio primordial de expressão artística”, afirma a dupla de designers.

 

Como nos quadros do pintor holandês, cada ângulo possibilitava uma nova visão. Frente, lateral, detalhe; tecido, forma, cor e técnica – todos os detalhes traziam uma nova informação e acrescentavam ao prazer estético das criações, apresentadas no Palais de Tokyo, em Paris. Ao contrário da Dior, que investiu em um grande cenário para a sua apresentação de alta costura, a dupla apostou nos próprios looks para desenvolver a ambientação: se as primeiras modelos, em vestidos mais simples, são como personagens de um quadro, na sequência os looks crescem para se tornar o quadro em si.

 

Desfile de Viktor & Rolf leva um Van Gogh 3D à passarela
Olhar os designs de Viktor & Rolf é como se posicionar frente a um quadro: a cada ângulo, os looks ganham uma nova conotação.

 

Expressão artística
Seis dias após o desfile, o site WWD revelou que Viktor & Rolf encerraria sua linha ready-to-wear, focando a produção na alta costura e na perfumaria, em um movimento para aproximar sua assinatura do segmento de luxo. “Nós sentimos uma forte urgência de focar novamente nossas raízes artísticas”, disse a dupla, sempre lembrada pelos desfiles-espetáculos, na ocasião. Para os designers, moda não é “apenas comprar roupas”, e sua criação visa mais do que um consumidor. A pergunta “como e em que ocasião usar isso”, que com frequência se faz aos designs mais irreverentes, torna-se irrelevante.

 

 

Desfile de Viktor & Rolf leva um Van Gogh 3D à passarela
Estampas de flores evoluem ao longo do desfile: do 2D ao 3D.

 

Como Miuccia Prada e Elsa Schiaparelli recentemente, também Horsting e Snoeren entraram no radar dos museus contemporâneos. Em 2000, o Groninger Museum (Holanda) realizou uma exposição sobre sua obra, e três looks da coleção de alta costura serão doados ao Museu Boijmans Van Beuningen, em Roterdã, pelo colecionador de arte Han Nefkens.

“Nós sempre usamos a moda como comunicação – é o nosso meio primordial de expressão artística”, afirmaram. Após a semana de alta costura em Paris, ninguém ousou dizer o contrário – pouquíssimo, aliás, se comentou sobre Van Gogh. A Viktor & Rolf roubou a cena.

 

Desfile de Viktor & Rolf leva um Van Gogh 3D à passarela
Referência: Van Gogh foi a inspiração do desfile. Este é o quadro Campo de Trigo com Ciprestes.

 

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