Balenciaga: o feio é so cool
O desfile acaba e é natural ver centenas de pessoas criticando determinadas apresentações. Entre os insultos comuns, está o clássico: feio. Como se a peça considerada desagradável visualmente não merecesse seu lugar na passarela. E o caso tem se repetido aos montes nas últimas semanas de moda. Logo vem a mente Balenciaga e seu famoso caso do tênis sujo.
“O que vemos nas passarelas das marcas mais vanguardistas é a consolidação de um movimento que já vem de alguns anos”, aponta Dani Brito, jornalista e professora de Comunicação para Moda no Centro Europeu. Foi o caso de Vivienne Westwood, em 2009, quando colocou ciganos na passarela, ou de Yoji Yamamoto, quando convidou idosos para desfilar suas criações.
“A verdadeira moda é contestadora. Essa obsessão recente por peças consideradas feias é uma resposta da moda a um estilo de vida que parece perfeito, mas é artificial.”
Temos exemplos até mais próximos, como o das Havaianas. Mesmo sem ser consenso, o calçado, que nasceu ligado às classes mais populares, tornou-se símbolo do país e ganhou edições mais elaboradas. “Para os jovens, vestir um tênis, que apesar de ser de grife traz as marcas da rua, é uma forma de contestação, de se colocar neste mundo caótico e imperfeito”, analisa.
Mas a reflexão vai além: para entender o “feio” é preciso, antes, lembrar do belo — que é “relativo conforme a época em que vivemos. O padrão de beleza magro, que por algum tempo foi quase unanimidade, agora abre espaço para outros corpos, por exemplo.” Pessoas querem se sentir representadas, e a imperfeição é a regra no mundo. Foi aí que as marcas — e seu marketing — viram oportunidades de negócio.
“Agora, é como se a moda nos desse a permissão para assumir nossas características se quisermos.”
A abertura para essas novas estéticas está conectada a movimentos sociais mais amplos. “A moda reverbera muito bem esses movimentos de diversidade e representatividade formando um caldo maravilhoso de cultura digital. As grifes que vão além são aquelas que sabem ler os sinais do nosso tempo. Não se trata mais sobre ‘o quê’ – o produto – mas ‘como’ ele é mostrado e em que contexto.”
*Matéria originalmente publicada na edição 249 da revista TOPVIEW.