Valdir Cruz ganha exposição no MON
Muito do que se vê nas fotografias de Valdir Cruz, agora expostas no Museu Oscar Niemeyer, não existe mais. Quedas d’água secaram, tropeiros de Guarapuava viraram história e a Catedral Basílica de Nossa Senhora dos Pinhais mudou com a cidade. “Outro dia eu passei pela Catedral, me deu dó.
Está destruída, cheia de maluco lá por perto”, conta o fotógrafo, que realizou um estudo da construção neogótica no início dos anos 1990. “Na época, os malucos éramos nós, rodando e rodando lá dentro com a câmera o tempo todo.” Mas o trabalho de Cruz pouco tem de “maluco”, vide as imagens feitas com câmera de grande formato – em que composição, foco, luz devem ser pensados na hora, sem possibilidade de correção posterior –, os projetos que se desenrolam por anos e o zelo perfeccionista para com a impressão. Persistência é uma virtude que a fotografia lhe ensinou.
Nascido em Guarapuava, em 1954, e radicado em Nova York desde o final dos anos 1970, Valdir Cruz ganhou reconhecimento internacional a partir de 1995, ao retratar comunidades indígenas no Brasil e na Venezuela. A crítica especializada o definiu como uma feliz combinação de artista e antropólogo, ao documentar, durante cinco anos e com “raro senso estético”, culturas que estavam se perdendo.
Outro destaque da época é o retrato de uma cigana (ao lado), adquirido pelo MoMA, em Nova York, há 20 anos, e que somente agora é exibido em Curitiba – e é hipnotizador.
O paranaense acredita que o retrato é uma interação entre quem está por trás e na frente da câmera. “Quando você trabalha olho no olho, se não tiver essa entrega, não tem retrato. Não estou roubando nada de ninguém. Eles estão entregando”, explica, rememorando a célebre foto.
E Cruz conserva tantas outras anedotas de seus personagens. São tropeiros, imigrantes, ciganos – “esse era um pé de valsa”, “essa, devoradora de maridos” –, que registrou ao longo de 30 anos em Guarapuava (tanto tempo que se tornou mito entre os moradores da cidade). Cada imagem é um sorriso da Gioconda e uma narrativa a ser lida por mil e uma noites.
Entre o preto e o branco
O cabelo de Cruz, enquanto passeia pela montagem da exposição, parece carregar tantas cores quanto suas fotografias. Se alguém disser a ele que são imagens em preto e branco, talvez ouça uma negativa. “A foto clássica em P&B tem que ter dez tonalidades: do preto sem textura até o branco sem textura, ela passa por essa gama de cinzas”, ensina o autor, que desenvolveu, depois de três anos, sua própria técnica de pigmentação.
Para ele, o método confere cores únicas a suas imagens (enquanto outros fotógrafos utilizam as mesmas industrializadas, perdendo personalidade) e permite recriar o ambiente da forma mais fiel possível. “No laboratório, você tem que buscar aquele momento, aquele entardecer, aquela caminhada sob a chuva. Tem que trazer aquele sentimento”, afirma, apontando para a série sobre as quedas d’água no Paraná, que completa a exposição no MON.
Com raras exceções, os projetos de Cruz partem de uma preocupação socioambiental. O mais recente, que levou quatro anos para ser concluído, vai dar origem a seu décimo livro, retratando os pacientes do Hospital do Câncer de Barretos (SP). No entanto, não há ode ou alarde, mas empatia. “Eu registro e mostro o povo, o local, e encerro ali meu trabalho”, ele resume, deixando as histórias para as fotografias.
SERVIÇO
Valdir Cruz: Imago – O olhar do sabiá
Museu Oscar Niemeyer_(41) 3350-4400
Rua Marechal Hermes, 999, Centro Cívico. Até 4 de dezembro (de terça a domingo, das 10h às 18h). Ingressos: R$ 12 e R$ 6 (meia-entrada).