O jantar mais excêntrico de 2016 em Curitiba
Suspense é um tempero incomum por aqui, mas foi ele que marcou o Gelinaz Shuffle em Curitiba. Era perceptível desde fora do restaurante Manu, onde um grupo de 20 pessoas ansiava por descobrir qual chef, entre os 40 nomes de 20 países, assumiria a cozinha da curitibana Manu Buffara naquela noite – e, claro, o que ele iria servir.
Assim funciona o Shuffle, promovido pelo coletivo internacional de chefs Gelinaz: grandes chefs de todo o mundo trocam de país (e restaurante) por alguns dias, com o desafio de explorar a cultura e os sabores locais e servir um jantar que celebre esse diálogo gastronômico.
Manu e Alex Atala, do paulistano D.O.M, foram os representantes brasileiros, enviados para Nova York (EUA) e Sidney (Austrália), respectivamente. Por aqui, no evento em novembro, os convidados foram recebidos pela equipe transfigurada do restaurante curitibano: os garçons estavam maquiados à la Kiss, numa referência à decoração do pequeno e trendy Black Axe Mangal, restaurante especializado em kebab em Londres. Era uma indicação da sequência ousada que estava por vir nas mãos do chef Lee Tiernan.
O jantar em oito tempos começou com pão de açaí, gema de ovo e ouriço-do-mar em conserva decorado com purpurina. Em seguida, houve uma aclimatação com o clássico pastel de feira recheado com carne de cordeiro, acompanhado por pimenta biquinho turbinada e uma soda de cumaru para equilibrar.
Tiernan perdeu a timidez com um prato de lula, noodle de pele de porco e molho apimentadíssimo (ele jura que maneirou na pimenta). Rim, condimentos asiáticos, feijão, bacalhau com carne de porco vieram na sequência.
”Eu gosto de ter um impacto forte – um tapa na cara”, comentou o chef após o jantar, vestindo uma camiseta da seleção brasileira de futebol e segurando uma latinha de Bavaria (ele não gosta de cerveja artesanal).
Seu estilo de fato se mostrou ousado e bem-humorado, inclusive em relação à apresentação, ora ironizando os excessos da gastronomia contemporânea (todo uma mise em scène para o pastel), ora realmente tentando se encaixar nos pratos esculturais do Manu.
Por vezes, era difícil achar o tal “diálogo gastronômico” entre os dois países e com a cozinha delicada da curitibana. Mas com uma “personalidade gastronômica” forte como a de Lee Tiernan, mais vale sentar e esperar que ele faça aquilo em que é bom: nos tire da zona de conforto. É o que o chef fez até o fim, com uma “pavlover” deliciosa decorada com pênis.