ESTILO

O espelho do Rio Negro

Uma viagem pela Amazônia: mesmo país, outra forma de viver

O encontro das águas escuras do Rio Negro com as águas barrentas do Rio Solimões pode ser visto lá de cima, da janelinha do avião. De cada lado, já me emocionei ao ver a imensidão verde que dá uma ideia dessa região de superlativos: a Amazônia é a maior floresta tropical do planeta e ocupa a maior parte do território brasileiro. Saímos de Manaus e depois de um trajeto de 2h30min, chegamos em Novo Airão, o último município acessível de carro. Aqui, restavam os últimos pontinhos de sinal de celular, bateu aquele deses-pero de responder as pendências de email, mandar mil whatsapps, fazer um último post, me despedir da família pois os próximos dias seriam totalmente off-line.

LEIA TAMBÉM: O agente transformador do Rio Atuba

Chegou a hora de embarcar em uma experiência genuína na Amazônia: nosso meio de locomoção escolhido para percorrer o Parque Nacional do Jaú, na região do Rio Negro, foi um barco regional com suítes confortáveis na medida certa com uma tripulação local mais que atenciosa, que nos guiaria por tantas vivências e aprendizados memorá-veis.

Na primeira noite a expedição dava a opção de dormir em um redá-rio construído no meio da floresta. Na minha cabeça poética já imaginei um silêncio absoluto, mas a floresta se mostrou mil vezes mais barulhenta do que muito ronco alheio – vento, macacos, pássaros e outros seres da natureza fazem uma festa durante a noite. Aos poucos fui pegando o “jeito” de dormir na rede e, quando vi, estava acordando com um nascer do sol inesquecível para mostrar que a natureza sempre pode surpreender. Durantes estes dias de navegação, o amanhecer passou a ser o meu despertador e, a cada dia, um show aparecia pela janela do barco.

A navegação pelo Rio Negro é um espetáculo à parte. Durante o dia, os vários tons de verde das árvores refletem nas águas escuras e, ao anoitecer, me emocionava ao ver o reflexo das estrelas, lua e nuvens neste espelho.

Mergulho revigorante no Rio Negro.

Os rios são as estradas da Amazônia, responsáveis por conectar as necessidades atuais das comunidades ribeirinhas aos centros urbanos. Na viagem visitamos algumas delas, conversamos com os moradores, conhecemos mais de um estilo de vida que depende e usufrui basicamente dos recursos da natureza. Nosso guia sabe se guiar naquela floresta densa com a precisão que nenhum Waze ou Google Maps conseguiria.

Comi a verdadeira tapioca, o verdadeiro açaí, tucumã, costelinha de tambaqui e tantas outras comidas locais que eu nem sabia que existiam. Aprendi a fazer farinha, táticas de sobrevivência na floresta, abracei uma Samaúma gigante, conheci e valorizei mais o papel que cada pequeno ser tem na natureza.

Esqueci daquele tal sinal do celular e aproveitei para valorizar ainda mais aqueles momentos especiais. Depois de 3 anos, ainda consigo lembrar do vento puro batendo no rosto quando saímos para fazer um passeio de voadeira, do barulhinho das folhas no chão enquanto caminhávamos pela floresta, da força da queda da cachoeira nas minhas costas, da sensação boa das risadas que dávamos nos jantares, do ar puro das respirações profundas no topo do barco, do frescor revigorante dos mergulhos no Rio Negro.

*Coluna originalmente publicada na edição 234 da revista TOPVIEW.

Deixe um comentário