Paraná: o celeiro do Brasil
Acordar junto ao nascer do sol, com o canto do galo e o piar dos passarinhos, agitados com o novo dia que se inicia. No campo, a vida é assim. No campo, a vida parece tranquila, mas, no meio das plantações, o que não falta é trabalho árduo, disposição e muito amor.
É por amor que Anselmo Coutinho Machado, produtor rural de Pitanga, região central do Paraná, está há 40 anos trabalhando no agronegócio. A inspiração, claro, veio do pai, agricultor que introduziu Anselmo na valiosa vida do campo desde que este nasceu. “Eu sempre tive vontade de fazer agronomia, desde pequeno, para poder dar sequência às atividades rurais do meu pai. Sempre quis seguir esse caminho, sem titubear”, relembrou Anselmo.
Médio produtor da região, Anselmo trabalha com gado de corte de cruzamento industrial e lavoura de soja e milho na fazenda que era do pai. Ele toma conta da produção na propriedade há 30 anos.
Ele e mais dois funcionários cuidam da produção. Pai de três filhos, Anselmo explica que todos estão, de alguma forma, ligados ao rural.
“Todos meus filhos, mesmo que não trabalhem diretamente comigo, estão ligados a esse mundo. São veterinários, agrônomos e biotecnólogos”, explica o produtor.
Anselmo e sua família são apenas um grupo entre tantos outros que movem o agronegócio na região. A agropecuária, negócio no qual o Anselmo trabalha, é a atividade econômica mais importante da microrregião, respondendo por 58,3% do que Pitanga produz, segundo dados da Federação da Agricultura do Estado do Paraná – FAEP.
O agronegócio, no Paraná, tem enorme peso para cada um dos 399 municípios da região. Afinal, não à toa, o estado é um dos principais produtores rurais do Brasil. O resultado é tão expressivo que há municípios que dependem quase que exclusivamente do agro. Em Ariranha do Ivaí, cidade no norte central do Paraná, com 2,5 mil habitantes, é, proporcionalmente, o nono município em que o campo tem mais peso – a produção rural representa 88,6% das riquezas da cidade.
Esses números expressam a importância do agronegócio para o Paraná, movimentando, inclusive, a economia do Estado. Segundo a Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento do Estado do Paraná (Seab), em 2017, o agronegócio foi responsável pelo valor de R$ 142,2 bilhões, montante que representou 33,9% do PIB estadual. Nesse mesmo ano, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), o Paraná tinha 10,7 milhões de hectares destinados à produção de lavouras, 1,5 milhão de hectares com floresta plantada e a área de pastagem ocupava 3,8 milhões de hectares.
Entre os principais produtos agrícolas produzidos no Paraná, estão a soja, o trigo e a aveia. No setor pecuário, os destaques são para a avicultura e a suinocultura. Além disso, o setor de silvicultura também teve grande expansão na região nos últimos anos, contribuindo para o aumento do Produto Interno Bruto do agronegócio.
Para tamanha produção de sucesso, o Paraná detém condições quase perfeitas para a atividade econômica. “Temos boa qualidade de sol e clima. Assim, é possível produzir de duas a três safras por ano, muito diferente de outros estados e países. Digo que somos o maior produtor de alimentos por metro quadrado”, afirma Luiz Eliezer Ferreira, economista da FAEP.
Por conta disso, o agronegócio é o setor que mais movimenta os portos do Paraná, representando quase 90% do total exportado. Em 2021, dos US$ 19,83 bilhões oriundos dos embarques, US$ 17,93 são referentes aos produtos agropecuários, segundo a OCEPAR. Os principais produtos foram a soja e o frango, com mais da metade dos embarques.
Inclusive, o setor conhecido por trazer riqueza para o campo também gera empregos e renda. Em relação ao estado do Paraná, de acordo com o governo do estado, em 2021, a agropecuária foi responsável pela criação de 3.303 novos postos de trabalho, 1,9% do total gerado pelo estado.
CRESCIMENTO POR MEIO DE INOVAÇÃO E TECNOLOGIA
Mas tamanho sucesso rural, ano após ano, não é fruto somente da região favorável. Nesse meio, há muito investimento, estudo, tecnologia e inovação envolvido. Nos últimos três anos, o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE), banco com grande foco no agronegócio, financiou aproximadamente R$ 1 bilhão de investimentos na produção agropecuária paranaense. O agronegócio, que inclui agroindústrias e outras empresas do setor, representa cerca de 60% da carteira do banco.
Outro grande incentivador do setor é o evento Show Rural, da Coopavel – Cooperativa Agroindustrial de Cascavel. O objetivo do evento é contribuir para o aprendizado de produtores rurais e a economia do campo. Portanto, o Show Rural reúne empresas do agronegócio nacional e internacional durante cinco dias por ano. O evento é aberto para o público e, neste momento, os produtores rurais podem adquirir conhecimento e equipamentos.
“O Show Rural é uma escola a céu aberto. É uma universidade no campo. As empresas que geram tecnologia aproveitam esse ambiente para mostrar o que eles têm de inovação e de novas tecnologias para oportunizar isso de uma forma dinâmica e acessível ao produtor. Assim, ele pode comprar essas tecnologias e melhorar todo seu trabalho de produção”, afirma Rogério Rizzardi, coordenador geral do Show Rural.
O evento, que movimenta mais de 300 mil pessoas por ano, mostra o quanto a inovação está presente no agronegócio. A agricultura digital, ou agricultura 4.0, é um exemplo disso. O termo se refere a um conjunto de tecnologias que auxiliam o produtor rural a acompanhar melhor as atividades rurais. São softwares e dispositivos responsáveis pela coleta e processamento de dados sobre a fazenda.
“Antes dessas ferramentas, o produtor fazia uma agricultura baseada naquilo que ele via. Sem elas, ele planta, colhe e trata as sementes com base na média que acha que colheu. No entanto, com a coleta de dados, ele consegue ter um valor exato disso”, comenta o engenheiro agrônomo e gerente de serviços e transformação digital da Nutrien Soluções Agrícolas, Elizeu Vicente dos Santos.
Ele explica que esse processo pode ser feito por meio de imagens de satélite. “Por meio de latitude e longitude, o satélite manda imagens para a minha plataforma. O sistema, então, vê qual área está mais verde e qual está mais amarela na lavoura. Assim, é possível investigar por que a produção está agindo de maneira diferente”, conta. Ainda segundo Elizeu, dessa forma, o produtor consegue tirar uma maior produtividade e, em 100% das vezes, consegue um maior retorno financeiro.
Outra inovação na agricultura que garante um maior retorno financeiro é o projeto de microtermoelétrica de biogás da Delta S. Engenharia. Segundo o sócio-diretor da empresa, André Cavallari, o projeto usa os dejetos de suínos para gerar energia. “Nosso cliente tem quase sete mil animais, gerando dejetos o dia todo. Essa é uma grande dor de cabeça para o produtor, que não consegue destinar tamanha quantidade”, afirma o engenheiro.
O projeto, então, conta com um canalizador que joga os dejetos dos porcos em um sistema de tratamento, em que é possível separar o resíduo sólido do líquido. Esse líquido, portanto, vai para uma lagoa no solo, ou seja, o biodigestor. Uma lona fecha essa lagoa durante 15 dias e, conforme o líquido se decompõe, ele solta um gás, que vira combustível para o biodigestor. Dessa forma, o produtor consegue gerar energia, que é usada em sua própria produção rural.
O projeto, além de viável e vantajoso, também auxilia na resolução de um problema ambiental, já que dá um fim responsável aos dejetos dos animais.
Trazendo esse e mais outros projetos inovadores para o meio da agricultura, André relata a boa vontade do produtor em se abrir para a inovação do campo. “A gente enxerga que o produtor está em busca de qualquer coisa para melhorar sua produção. Hoje, quase tudo envolve investimento e retorno. Por isso, se você provar que aquilo é viável, ele tem muito interesse em investir”, afirma.
AGRO É CULTURA
De fato, os números do agronegócio são impressionantes – e a importância do setor para a economia local e nacional é indiscutível. Porém, não apenas o setor alimentício é impactado. Culturalmente, o agro movimenta diversos setores, como o musical.
Uma dupla sertaneja paranaense que nasceu no meio rural é a prova de que ambas as coisas estão conectadas. “O sertanejo nasceu contando a história do homem do campo, as músicas de viola caipira e a vida do interior… está enraizado”, afirmam Gustavo Toledo e Gabriel, também conhecidos como “GTG”.
Em meio ao nome da dupla, está uma conhecida cidade paranaense, Toledo, localizada no oeste do estado. A homenagem, no entanto, vem das lembranças da infância. “Apesar de o Gabriel já ter nascido na capital paranaense, eu nasci no interior. Por isso, tenho uma ligação muito forte com a região. Minha família é de Toledo, então íamos passar o final de semana na cidade e crescemos ouvindo sertanejo. Apesar de hoje ouvirmos, também, outros estilos, o que está no coração é o sertanejo raiz e o campo”, conta Gustavo.
*Matéria originalmente publicada na edição #260 da revista TOPVIEW.