Em busca de novas formas
À convite da Artefacto, Ruy Ohtake esteve em Curitiba para fazer uma palestra sobre arquitetura contemporânea, em evento que fez parte do Circuito Top View de Arquitetura e Design. Sua palestra e sua sessão de autógrafos foram tão concorridas que esta entrevista teve que acontecer no carro, já a caminho do aeroporto onde Ruy pegaria o voo de volta para São Paulo.
O frenesi em torno deste senhor arquiteto – em plena forma perto dos 80 anos – é totalmente justificado. Autor de mais de 300 obras no Brasil e no mundo, entre elas o Hotel Unique, o Instituto Tomie Ohtake e a Embaixada do Brasil no Japão, Ruy deu várias lições em frases simples. Ele comentou, por exemplo, “que o mais difícil é fazer a forma” e que os arquitetos brasileiros “têm que enfrentar a coisa pelo desenho”, pois o país não tem a mesma tecnologia de construção de outros países, como Alemanha e Suíça.
Em sua fala, o arquiteto deu grande destaque às suas obras sociais, como o Redondinho – projeto de moradia que deu nova cara ao bairro carente de Heliópolis, em São Paulo. Segundo ele, a arquitetura também tem a ver com dignidade, pois “qualidade é possível, não importa o tamanho do imóvel” e que é importante diminuir a diferença entre projetos de grandes recursos e os de pouco dinheiro. Na entrevista a seguir, Ruy enfatiza sua vontade de fazer projetos que sirvam à população.
Top View: Como podemos definir a arquitetura contemporânea?
Ruy Ohtake: Eu me preocupo que a arquitetura contemporânea, entre outras coisas, tenha essa direção de ir cada vez mais para a cidade, à população em geral.
TV: Essa preocupação sempre existiu ou veio ao longo da carreira?
RO: Eu já tinha essa preocupação desde a época do ginásio, principalmente da faculdade, mas de qualquer forma isso foi amadurecendo ao conhecer vários tipos de pessoas, principalmente as das comunidades mais carentes. Eu acredito convictamente que a arquitetura pode ajudar a construir uma cidade melhor, uma sociedade mais justa.
TV: E em termos de urbanismo, qual é o maior desafio? Estamos em uma cidade famosa por isso.
RO: Isso aconteceu porque o Jaime Lerner conseguiu propor itens importantes de urbanismo quando a cidade tinha ainda 400 mil habitantes. Foram tão boas essas proposições que elas continuam ajudando Curitiba a ser contemporânea de uma forma bem correta, com perto de dois milhões de habitantes.
TV: E este seria o maior desafio em termos de urbanismo, prever necessidades?
RO: Sim, as propostas de urbanismo precisam estar à frente das realizações.
TV: E isso pode ser feito mesmo nos grandes centros?
RO: Sempre é preciso pensar e formular estratégias para que isso possa ser realizado. Em Londres, por exemplo, que é uma cidade grande, a parte sul do rio Tâmisa foi totalmente reurbanizada por uma iniciativa governamental. Passou a ser um lugar muito bonito, de convivência muito generosa. E por ocasião dos Jogos Olímpicos, realizado há cinco anos, o governo construiu estádios a 20 km da cidade. O poder público sai na frente da ocupação da cidade, que é o melhor caminho.
TV: Quais são os lugares de Curitiba que você mais admira?
RO: Eu gosto muito de Curitiba. Gosto muito do contemporaníssimo Olho (MON), da Ópera de Arame, da Pedreira Paulo Leminski, e todo o projeto de mobilidade – que foi criado quando essa palavra ainda nem existia. O que o Jaime Lerner criou há 40 anos – os circuito de ônibus e os tubos – foi um avanço muito grande para a época e ainda hoje é muito moderno.
TV: Depois de cerca de 300 projetos realizados, entre hotéis, prédios, museus, tem alguma coisa que você ainda tenha vontade de desenhar?
RO: Mais 300 coisas (risos). Quero fazer áreas que promovam a convergência da população e áreas culturais. A gente não pode somente escolher, mas todo projeto que for bom para a população e para a cidade a gente deve fazer.