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Tatuagem: transformação social com arte na pele

Cada vez mais, a tatuagem é associada à arte e distanciada da marginalidade

Ter a pele marcada por tatuagens não era algo aceito socialmente. Na Europa, em 787 d.C., a Igreja Católica baniu a arte com o argumento de ser uma prática demoníaca de vandalismo ao corpo. Séculos depois, em 1879, a tinta na pele foi usada para identificar criminosos — resultando, então, na conotação de que pessoas tatuadas estão à margem da sociedade.

Contudo, essa forma de expressão, apesar de criminalizada, faz parte da história de inúmeras culturas mundo afora. No século III, por exemplo, o historiador romano Herodes registrou que os homens tatuavam seus corpos com artes de temas diversos – envolvendo animais e natureza – e não se vestiam para deixar os desenhos à mostra.

Hoje, cada vez mais pessoas têm o entendimento de que a tatuagem, na verdade, é uma arte. Para o tatuador Vinicius Gunha, o preconceito contra essa prática foi enraizado simplesmente pelo fato de ser algo diferente. “Na verdade, é uma forma de arte. A tatuagem não é só um desenho que é feito sobre a pele sem qualquer significado: existe todo um contexto por trás”, opina.

O especialista Vinícius Gunha acha que tatuagem não é apenas um desenho que ficará eternizado na pele (Foto: Acervo pessoal)

Marco Teixeira, também tatuador, acredita que a técnica seja uma forma de linguagem, assim como a pintura, a música e a escultura. “Arte é o fruto do trabalho de um artista. Então, se o profissional consegue gerar isso a partir de uma linguagem, ele está criando arte – e isso pode ser feito por meio da tatuagem”, afirma.

O fato de uma pessoa ter um pouco de tinta sobre a pele, para o senso comum, cada vez menos significa que a personalidade e competência do tatuado sejam afetadas. “É apenas uma alteração corporal que não vai transformar nenhum outro aspecto da pessoa. Esse estigma de marginalizar a tatuagem é passado. Não existem mais motivos para que isso aconteça”, reforça Teixeira.

Tatuagem é uma forma de linguagem, assim como pintura, música e escultura — é o que acredita o tatuador Marco Teixeira (Foto: Acervo pessoal)

Partindo do entendimento de que a arte é uma forma de expressão de determinada pessoa para o mundo, Gunha acha que tatuagem não é apenas um desenho que ficará eternizado na pele. Para ele, é um tipo de arte que pode ser expressada do profissional para o cliente, que por sua vez pode utilizá-la para exteriorizar o que gostaria. “É uma cadeia, um ciclo de arte que não deixa a tatuagem morrer”, conclui.

Em terras tupiniquins

Entre o final dos anos 1950 e início dos anos 1960, no Brasil, a história da tatuagem começou na cidade de Santos, em São Paulo, com o dinamarquês Knud Harld Likke Gregersen, conhecido como Lucky Tattoo, que abriu seu primeiro estúdio na rua João Otávio — local onde com grande concentração de clientes marinheiros.

Não demorou muito e logo o profissional, pioneiro da arte no país, montou outro estúdio, dessa vez mais próximo ao cais — lugar que, na época, era zona de prostituição, o que contribuiu para a disseminação do preconceito e descriminação da prática. Era comum, inclusive, que imigrantes alcóolatras, usuários de drogas e prostitutas frequentassem as redondezas, gerando o estigma de arte marginal que se enraizou e existiu por décadas.

Contudo, apesar de ainda existir ressalvas contra a tatuagem, a arte perdeu o tom de marginal de forma significativa no século XXI com o acesso à informação, transformação de comportamentos, quebras de tabus, apoio à diversidade cultural e, principalmente, com a aceitação e incentivo às diferentes formas de arte. 

*Matéria originalmente publicada na edição #246 da revista TOPVIEW.

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