ESTILO

A emoção do sabor: conheça a confeiteira Sonia Bacelar

Inspiradora na vida e nos sabores que cria, ela reconstruiu seu caminho com creme e chantilly para nos encantar com seus célebres bolos desconstruídos

Há uma alegria única em se encantar com uma mesa maravilhosa, cortar um bolo cujo sabor vem precedido de algo para os olhos, morder um doce e encontrar o melhor em que o açúcar pode se transformar, perder-se na sensação cremosa do puro chocolate. Sonia Bacelar é especialista em produzir tais emoções. Seus doces, bolos e banquetes faustosos têm arrebatado gerações de curitibanos ao longo de três décadas. Confeiteira, empresária, mas acima de tudo empreendedora, essa paulista de Monte Alto (SP), criada em Curitiba, é a tradução da mulher contemporânea: forte, criativa e espiritualizada.

Aos 63 anos, Sonia é uma figura inspiradora. Uma inspiração que se revela em sua fala decidida e cheia de significado. O trabalho com a comida surgiu de uma carência familiar. A filha, que nasceu com uma doença rara, necessitava de exaustivo e dispendioso tratamento. Quando Daniele Bacelar faleceu, aos 13 anos, em 1990, Sonia decidiu repavimentar o seu chão de creme e chantilly. Especializou-se em pâtisserie, inicialmente com Vanir Petter, a lendária confeiteira artística da capital, e depois em inúmeros cursos em São Paulo.

Sonia Bacelar
Foto: Theo Marques.

Comemorações de primeira comunhão, 15 anos, formaturas, casamentos… foi como se ela percorresse os marcos que sonhou para sua filha e os realizasse com muito carinho e dedicação, partilhando da felicidade de outras famílias. “Já adocei a vida de muita gente”, conta. Os cursos cessaram à medida que Sonia Bacelar se transformou em referência, mas a curiosidade e a vontade de se superar a cada dia não. “Sem renovação, não existe continuidade. Leio muito, me informo, crio. Jamais copio uma referência. Transformo em cima delas. A grande sacada para sobreviver é não perder a visão do futuro”, disse, em uma tarde gelada de julho.

A perda fez parte da construção

Conheci-a naquele mesmo dia e o gelo preliminar logo foi quebrado quando Sonia começou a desvendar seu lado mais transcendental. Adepta de meditação, confessa que já leu mais. Agora, o conhecimento vem por meio de podcasts e audiobooks, um hábito que revela seu gosto e sua atenção pelas novas tecnologias. Um dos temas preferidos é mecânica quântica, que a ajuda a “mudar o filtro do olhar”. Em um mundo cheio de perdas e provações, ela acredita que temos de nos manter em pé, uma resiliência que só a espiritualidade pode proporcionar.

Sonia Bacelar
Foto: Theo Marques.

“Todos os dias, tento acordar melhor do que deitei, mas, se não tiver ferramentas para isso, vou ficar igual.” Filha de pai ucraniano e mãe italiana, que se conheceram refugiados no Brasil pós-Segunda-Guerra, Sonia cresceu com o exemplo da obstinação do sempre bem-humorado e decidido Stanislaus Laskowski. Seus avós paternos, Anton e Bárbara, tinham oito filhos, mas apenas cinco chegaram a tempo no porto para embarcar para o Brasil. A avó nunca superaria a ausência dos três filhos extraviados e morreria três anos depois de desgosto e tristeza. “Para mim, a perda fez parte de minha construção. Para minha avó, foi a destruição”, compara Sonia, com sua sinceridade cortante.

Sonia Bacelar
Foto: Theo Marques.

Essa empreendedora, que mantém um certo orgulho pelas vidas dos colaboradores que consegue melhorar, está sempre presenteando os comensais com novidades criativas, saborosas e surpreendentes. Foi assim com o sorvete frito, com a maçã do amor nos casamentos; é assim com os atuais bolos desconstruídos. Quando fala da arte do bem servir, seu espírito parece se elevar ainda mais. “A gastronomia é uma arte. O artístico sempre me tocou e me fez ‘sair da caixa’.” Novos projetos estão por vir. Com pitadas de uma tremenda sabedoria feminina.

Além de Sonia Bacelar: conheça todos os personagens da matéria “A emoção do sabor”

Matéria escrita por Dani Brito e publicada originalmente na edição 226 especial Gastronomia.

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