Sexo na terceira idade, sim! Desvende os principais mitos e verdades sobre o assunto-tabu
Na terceira temporada da divertida Grace & Frankie, série da Netflix com as veteranas Jane Fonda e Lily Tomlin, as protagonistas “sessentonas” desenvolvem e tentam comercializar vibradores para mulheres mais velhas e com artrite. Muito além da comédia e do entretenimento, a série, que acompanha o recomeço na vida das personagens após divórcios em plena terceira idade, toca um tabu social: como se dão os relacionamentos afetivos e, principalmente, quais são os desafios de uma vida sexual ativa nessa fase?
O aumento da expectativa de vida e as melhorias na sua qualidade nos fazem repensar costumes e comportamentos pré-estabelecidos socialmente. Ter 65 anos em 2017 é indiscutivelmente diferente de ter 65 anos em 1980, 1970 ou qualquer década passada. Conversamos com três especialistas – uma sexóloga, um geriatra e uma psicóloga – a respeito das principais dúvidas sobre sexo depois dos 60 anos.
A libido morre quando envelhecemos?
Segundo a sexóloga Marina Beduschi, da Clinibella Curitiba, fatores fisiológicos alteram o organismo de homens e mulheres ao longo dos anos. No caso delas, por exemplo, após a menopausa há uma significativa queda hormonal no organismo. Os hormônios atuam em diversas partes do corpo, como genitais, cérebro, ossos e coração, acarretando em sintomas como calores noturnos, insônia, dificuldade de concentração e memória, irritabilidade e ressecamento vaginal. Tais fatores podem atrapalhar o rendimento sexual, porém têm tratamento. Entretanto, o maior problema do sexo na terceira idade não é a falta de desejo, mas a repressão sexual nessa etapa da vida, com impedimentos psicológicos e sociais. “Uma educação familiar rigorosa, a época em que se viveu, religião, problemas relacionais com o (a) parceiro (a) e com os filhos, tudo isso pode causar um bloqueio sexual”, pontua a especialista. O corpo muda, mas a libido não necessariamente acaba.
Quais são as implicações psicológicas?
Para a psicóloga Cristine Nogueira, do Hospital São Lucas, as pressões sociais geram cobranças tanto sobre as mulheres, que se sentem impelidas a manter a jovialidade, quanto sobre os homens, de quem se espera a tal virilidade. Envelhecer deve ser encarado como algo tão transformador quanto natural, e ao mesmo tempo em que não se pode esperar o mesmo desempenho físico em diferentes fases da vida, também não se deve descartar o sexo como algo que não pertence à terceira ou quarta idade. “Para a Psicologia, é muito importante que se mantenha a libido, no sentido de se ter vontade de fazer algo que traga prazer”, destaca a especialista. “Acima de tudo, as pessoas precisam se sentir bem emocionalmente, e devem se permitir sentir desejo em se relacionar afetiva e sexualmente, como em qualquer outra fase da vida”.
É perigoso para o coração?
Um estudo da Universidade de Michigan publicado em novembro do ano passado no Journal of Health and Social Behavior aponta que relações sexuais frequentes aumentam o risco de ataque cardíaco em homens idosos, mas, para mulheres em idade avançada, o orgasmo é benéfico e inclusive pode ajudar a reduzir riscos de hipertensão. Médico geriatra do Hospital São Lucas, o Dr. Paulo Luiz Honaiser afirma que é mais importante prezar pela qualidade do que pela frequência do sexo nessa fase. E vale lembrar: medicamentos como Viagra ou Revatio, que visam tratar disfunção erétil (a chamada impotência sexual), só devem ser usados com prescrição médica.
Como tratar disfunção erétil?
Hábitos de vida saudáveis, como boa alimentação, atividade física regular e ir ao médico regularmente são atitudes-chave para combater a impotência. Quando ocorrer um episódio de disfunção erétil, é aconselhado conversar com o (a) parceiro (a) e encarar com naturalidade, pois pode acontecer eventualmente. A ansiedade de “bom desempenho”, pode piorar a situação pela pressão psicológica autoimposta.
Como tratar o ressecamento vaginal?
Ele acontece por causa da queda de produção do hormônio estrogênio durante a menopausa. “A mulher pode e deve repor esses hormônios por meio de TRH (terapia de reposição hormonal, via medicamentos de uso oral) ou também utilizando cremes de estriol, que ajudam a tratar os efeitos da menopausa no organismo feminino e melhoram o desempenho sexual”, recomenda o Dr. Paulo Honaiser.
Quais são os benefícios?
A oxitocina liberada durante o orgasmo promove a melhoria da qualidade do sono, e um bom sono está associado à manutenção do peso e pressão arterial saudável. A liberação da endorfina durante o sexo também ajuda a aliviar dores de cabeça, artrite e outros incômodos, bem como o estresse, e fortalece os músculos do assoalho pélvico (ajudando a combater a incontinência urinária).
Há posições mais arriscadas ou recomendadas?
As condições físicas e de saúde dos parceiros e da personalidade sexual de cada um determinam a posição. Não há, portanto, posições mais adequadas. Cada casal precisa aprender suas limitações particulares e não fazer esforços físicos além do que seus corpos permitam. Este é um bom momento para redescobrir o sexo e compreender que o prazer não se dá apenas pela penetração peniana: o gouinage é a prática na qual o prazer sexual vem de carícias, beijos, abraços e estímulos de diferentes partes do corpo.
Qual a frequência média?
A frequência varia muito de casal para casal. Uma pesquisa do Datafolha aponta que 47% das pessoas acima dos 60 fazem sexo regularmente e, destas, 91% dizem nunca ter usado remédio para disfunção erétil. Mas a pesquisa revela um paradoxo: 74% dos homens afirmam ter vida sexual ativa, enquanto 76% das mulheres afirmam exatamente o contrário. Considerando o índice de casados na terceira idade (47%), com quem eles têm relações sexuais? O estudo aponta possibilidades: sozinhos (masturbação), com companhias eventuais ou por meio de outras formas para chegar ao orgasmo, sem penetração peniana. Daí surge outro ponto curioso: a evidência do machismo também presente nas relações sexuais. Parte das mulheres considera sua “missão sexual” cumprida após ter filhos, e, do lado dos homens, existe uma eterna cobrança social pela virilidade masculina. “Felizmente hoje as mulheres mais velhas também estão buscando liberdade e satisfação em suas vidas sexuais, deixando de lado velhos tabus e preconceitos e conversando mais abertamente com seus médicos de confiança sobre possíveis dúvidas e inquietações”, ressalta a sexóloga Marina Beduschi. As principais dúvidas, segundo Marina, são sobre a diminuição do desejo e a possibilidade de orgasmo.
Há produtos eróticos exclusivos para a terceira idade?
Sim! O mercado de acessórios e cosméticos eróticos é extremamente diversificado e procura atender a todos os públicos e exigências. A melhor idade não poderia ficar de fora: já existem linhas especificamente voltadas para pessoas acima dos 60 anos. A marca brasileira Hot Flowers é responsável por uma delas e comercializa lubrificantes de alta intensidade, estimulador de ereção para homens maduros, e excitante/estimulador feminino.
5 filmes sobre sexto e relacionamento na melhor idade
Elsa & Fred (2005): Elsa (Shirley MacLaine), 75 anos, é divertida, alegre e sonhadora, enquanto seu novo vizinho, Fred (Christopher Plummer), aos 80 anos, é rabugento e de mal com a vida. Com o dom de driblar a sisudez das pessoas que a rodeiam, Elsa se aproxima de Fred e tenta arrancá-lo do marasmo diário.
Ainda adoráveis (2008): como iniciar um relacionamento na terceira idade? O tímido funcionário de supermercado Robert (Martin Landau) quer aproveitar o clima de Natal e chamar sua simpática vizinha, Mary (Ellen Burstyn), para sair, mas parece que ele perdeu o traquejo da juventude. Um surpreendente conto sobre amor, doença e recomeço.
E se vivêssemos todos juntos? (2011): cinco amigos acreditam que serão fardos para seus filhos, e por isso decidem morar todos juntos em uma grande casa. Eles se apoiam uns aos outros nos momentos difíceis típicos da velhice, e atraem a atenção de um estudante de antropologia, que decide usar o grupo para escrever sua tese. No elenco estão Jane Fonda e Geraldine Chaplin.
Amor (2012): campeão em Cannes e no Oscar, o filme conta como o relacionamento de um casal de idosos é afetado pela doença de Anne (Emmanuelle Riva). O amor é colocado à prova e a realidade crua de dificuldades e superações marca a obra.
Gloria (2013): traz como protagonista Gloria (Paulina García), uma mulher de 58 anos, independente, divorciada, que sente um desejo constante de se reinventar. Recusando-se a viver noites de solidão, começa a frequentar baladas voltadas à terceira idade, em busca de companhia. Entre encontros e desencontros, ela conhece Rodolfo (Sergio Hernández), sete anos mais velho, por quem se apaixona.
*Matéria publicada originalmente por Fernanda Maldonado na edição 203 da revista TOPVIEW.