Um papo reto sobre veganismo e consumo consciente com Alana Rox, do Diário de uma vegana
No Instagram ela tem mais de 170 mil seguidores. No Facebook, mais de 70 mil fãs. No total, pelo menos 250 mil pessoas são impactadas diariamente por ela que, bem diferente do estereótipo clichê do “vegano-alternativo”, é uma pessoa normal – se é que o uso desse conceito pode ser aplicado. Culinarista, blogueira, apresentadora e escritora – ela comanda o programa Diário de Uma Vegana, no canal GNT, e publicou um livro homônimo em 2016 – Alana Rox é embaixadora da Mercy For Animals Brasil – uma das maiores organizações mundiais de Direitos Animais.
Recentemente, esteve em Curitiba, à convite da marca de snacks saudáveis Seed of Life, para dar um curso de culinária na loja Bem Integral. Enquanto visitava o espaço, topou receber a TOPVIEW para uma conversa franca sobre os desafios do veganismo, consumo consciente e o poder de produzir a própria comida, “dá pra transformar toda receita”, garante. Nesta entrevista, ela revela também o que mais gosta de comer – e o que não conseguiu adaptar.
Aos 38 anos, Alana admite que nunca comeu carne. Nunca! Nem quando criança. “Acho que é coisa de outra vida”, brinca. Filha de mãe gaúcha e pai carioca, ela cresceu em Joinville, Santa Catarina – um dos estados mais carnistas do Brasil (maior produtor de carne suína e vice-líder em frango, segundo dados do Sindicato da Indústria de Carnes e Derivados de Santa Catarina, o Sindicarne). “Até os 12 anos eu apanhava por não comer carne. A hora do almoço era um terror”, lembra Alana, ao mesmo tempo em que admite: não fazia ideia de que era ovolactovegetariana. “Eu não tinha noção do que acontecia com os animais. No Sul não se falava sobre isso. Fui conhecer um vegano quando me mudei para São Paulo, há 15 anos”. A cidade a fez abrir os olhos para sua saúde e começar, então, a transição para o veganismo.
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TOPVIEW: Você nunca comeu carne. Mas como foi se enxergar vegetariana?
Alana Rox: Eu sempre tive problemas de saúde. Tinha muita enxaqueca, TOC, síndrome do pânico e crises de ansiedade sem nem saber que era isso. Minha mãe também tinha enxaqueca e teve três AVCs gravíssimos, então, todas as vezes que eu tinha as minhas dores acionava o gatilho do pânico. Quando fui consultar um neurologista ele fez a pergunta que mudou a minha vida. “Alana, será que o que você come não está te causando todas essas dores?”. Eu era vegetariana, pensei “não, imagina”. Me achava super saudável, mas fiquei pensando naquilo. No outro dia pedi a ele todos os livros possíveis sobre o assunto. E foi assim que comecei a conhecer o meu corpo, minha fisiologia. Coisas que a gente deveria aprender na escola, como se alimentar. A gente perde essa inteligência instintiva que os animais possuem. Depois de estudar muito entendi que nós herdamos muito mais do que a genética, herdamos hábitos errados de uma família e uma sociedade inteira. Somos manipulados e induzidos por uma indústria que só visa o lucro. As pessoas não estão doentes. Elas estão envenenadas. Pense o contrário: se você pode se alimentar de coisas que podem te beneficiar, seu corpo se transforma numa potência.
“Ser vegano é isso. Você para de pensar em você para pensar no outro, porque você é vegano por você e pelo outro. O veganismo é o único caminho para uma humanidade.”
TV: E foi em São Paulo que você se tornou vegana, né?
AR: Sim. Quando eu fui para São Paulo, por causa da música [ela já foi cantora e compositora], queria colocar em prática aquilo que eu tinha aprendido. Fui tirando aos poucos o ovo, leite, queijo… Mas queria comer coisas gostosas e veganas, e naquela época [15 anos atrás] não existiam livros e informações como hoje. Pesquisando, descobri a causa animal. Quando eu despertei para essa razão, pensei ‘quem eu seria na minha vida se eu soubesse tudo isso e continuasse consumindo esses produtos fornecidos pelas indústrias?’. Foi quando eu mudei mesmo e comecei a fabricar meu próprio leite e fui fazendo outras coisas. Errei muito. Fiz cookie no lugar de bolo. Fazia receitas inteligentes. O meu pão não é só o mais fofinho e gostoso. Ele é o mais fofinho, gostoso, barato e fácil de fazer. Ele vai te desinflamar, te curar, te trazer um benefício. E comecei a ver as mudanças em mim mesma.
TV: Produtos orgânicos, saudáveis ou sem lactose, geralmente, costumam ser mais caros. Como democratizar o acesso ao veganismo?
AR: Primeiro, vegano pode não ser saudável. Você pode passar a vida comendo batata frita e ketchup, por exemplo, mas é saudável? Sobre preço, se você quiser conforto, como encontrar tudo pronto, com certeza será mais caro. Quando eu fiz essa transição [de vegetariana para vegana] eu tinha R$ 30 para passar o mês. Ia na feira, pechinchava, dava um jeito. Comia bem e fazia sobrar para o dia seguinte. E tudo saudável. Eu fazia tudo – a comida, os produtos de limpeza, cosméticos… Arroz e feijão é mais barato que bife. E comprar remédios é muito mais caro! Se você fizer as contas, vai ver que o custo benefício é maior. As pessoas se incomodam em pagar R$ 30 em um óleo de coco que pode durar até seis meses, mas não se importam em pagar R$ 50 numa pizza que vai fazer mal. São prioridades.
“O ‘vegano chato’, na verdade, está desesperado para te conscientizar e fazer você parar de se envenenar.”
TV: Qual o maior desafio hoje como vegana?
AR: O único desafio são as pessoas. É esperar o tempo do outro. É muito difícil você estar desperta e entender as pessoas que ainda não despertaram. Quando me falam ‘mas eu amo comer carne’ é a coisa mais difícil de ouvir, por que ela está pensando só nela. Ser vegano é isso. Você para de pensar em você para pensar no outro, porque você é vegano por você e pelo outro. O veganismo é o único caminho para uma humanidade.
TV: Esse “despertar coletivo” está acontecendo?
AR: O planeta não comporta mais isso [o consumo de carne]. A maior produtora de carne animal dos Estados Unidos é também a empresa que mais investe em carne vegetal, pois sabe que não tem mais como comportar esse hábito. A internet está unificando as pessoas e trazendo as informações para despertá-las. As pessoas estão entendendo que as grandes indústrias produzem os remédios para as doenças que elas mesmas criam. Não faz sentindo as pessoas desejarem saúde, amor e celebrar a vida comendo morte. Os veganos estão dominando os esportes, basta olhar na história. Os gladiadores tinham sua alimentação baseada em grãos. O ‘vegano chato’, na verdade, está desesperado para te conscientizar e fazer você parar de se envenenar.
TV: Você testa muitas receitas, inventa muita coisa na cozinha. Tem alguma que você não conseguiu recriar, ou que o resultado te decepcionou?
AR: Tem uma. No início [da transição] eu tinha um desafio de transformar tudo, todas as receitas. Eu não consegui com o quindim, que é basicamente ovo e açúcar. Mas tudo bem. Eu descobri tantas outras coisas maravilhosas…
TV: E qual sua comida preferida?
AR: Essa pergunta é muito difícil! Meu barato é criar e emocionar com as receitas. Mas as minhas preferidas são as tailandesas, árabes, indianas. Com muito tempero, muito mais nutrientes.
TV: Quais fontes você indica para as pessoas se informarem mais sobre o veganismo?
AR: Tem um documentário na Netflix bem bom chamado What the Health. Fala sobre médicos não corrompidos pela indústria que mostram tudo isso, a indústria por trás dos estudos que, muitas vezes, são financiados por interesses próprios. Ele nem abrange muito a questão animal, mas fala sobre saúde. Tem outros que são bons e falam mais da questão animal, Terráqueos e Cowspiracy. Não tem como você continuar igual depois de ver esses documentários. A verdade liberta.
TV: Pra finalizar, quais dicas você dá para quem quer começar a transição para o vegetarianismo ou veganismo?
AR: Assistir aos documentários, ir num nutricionista apto para atender veganos, comprar meu livro (risos). Conhecer pessoas na mesma vibe para não se sentir sozinha nessa. E se informar. Saber que tem coisas que não estão no nosso controle, afinal, nós não vivemos num mundo vegano. Uma vez postei no Instagram que estava no cinema. Uma pessoa me questionou ‘você vai no cinema mesmo sendo vegana?’. Não consegui pensar mais em nada, só queria saber o que eu estava fazendo de errado. Depois descobri que algumas telas antigas têm revestimento de gelatina. Então, faço o melhor que eu posso fazer.