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Seria o fim dos matrimônios? Saiba porque ainda casamos em 2019

Mudanças sociais transformaram a função do casamento, que passa pelo segundo ano consecutivo de queda

O casamento já esteve no topo da pirâmide social. Era uma das principais instituições da Roma Antiga e chegou a ser um dever do cidadão, com punições para aqueles que não o cumprissem. Na Europa Medieval era usado para iniciar e manter associações políticas e militares. Até poucas décadas atrás, o ritual ainda podia ser arranjado pelas famílias, que julgavam o que seria mais benéfico para todos. Ou seja, casar por amor era um luxo ao qual muitos não tinham acesso.

A difusão do direito ao divórcio e a crescente independência feminina aliadas a mudanças socioeconômicas transformaram a função do casamento. Com isso, as razões para trocar alianças também mudaram.

Em 2018, o número de casamentos caiu pelo segundo ano consecutivo, de acordo com dados do IBGE. A psicóloga e terapeuta de casais Maria Clementina Menghini explica que isso mostra a desistência da formalização, mas não do relacionamento em si. “Parece que não é preciso mais dar satisfação para a sociedade, então, as pessoas sentem-se no direito de conviver com quem quiserem sem essa formalização”, analisa.

O que antes era uma ferramenta de manutenção de status agora é, em geral, a vontade de compartilhar a vida com o outro. É o caso da médica Maitê Honczaryk Lenz César e do engenheiro civil Breno Thá de Carvalho, casados há apenas um mês. O casal não tinha interesse em seguir os moldes tradicionais e chegou a cogitar apenas uma viagem, mas a vontade de celebrar o amor falou mais alto.

O que antes era uma ferramenta de manutenção de status agora é, em geral, a vontade de compartilhar a vida com o outro.

O primeiro beijo, em 12 de junho de 2014, resultou em uma cerimônia intimista e sem os protocolos comuns. “Desde o início já sabíamos que queríamos ficar juntos. [No casamento] queríamos fazer um dia em que todos estivessem à vontade para celebrar o nosso amor e a história com quem mais amamos”, conta Maitê.

Goals: amor livre

Passamos da correnteza do amor romântico para uma maré ainda recente, o amor livre. A youtuber e escritora Ellora Haonne é referência no tema entre os jovens. Seu primeiro vídeo sobre relacionamento aberto e poligamia, de 2016, conta com centenas de comentários e mais de 200 mil visualizações. As opiniões seguem um padrão: muitos admiram o formato, mas não o aplicam.

Menghini vê a mesma tendência em seu consultório. “Observo gente falando disso, mas não tem uma quantidade significativa de pessoas vivendo dessa forma”, conta. “O amor livre é muito bonito, dá muita liberdade, mas a relação de parceiros ainda não está mudada.”. Isso pode gerar situações de ciúme e medo de perda, o que acaba por enfraquecer a relação.

Mesmo diante de tanta evolução, ainda persistem certas ideias arcaicas. Ludiana ressalta que o preconceito com as pessoas que não casam é comum. “Tem o status envolvido [no casamento]. Aquela que se apresenta como esposo ou esposa é uma pessoa que deu certo, que tem alguém do lado dela”, comenta.

Obra “The Kiss” de Gustav Klimt.

O fim do amor romântico?

Os estilos de relacionamento se ampliaram, mas isso não representa a desistência do amor romântico. Para Maria, o “negócio do amor e do romance é até mais aberto hoje”, na contramão dos que acreditam que as relações estão menos profundas e significativas, ou em uma possível tendência de fuga de relacionamentos amorosos. A união estável ainda atende demandas práticas na garantia de direitos legais à família e aos parceiros.

Outra questão que afeta as relações é a falta autoconhecimento – e, consequentemente, de comunicação clara – no casal, aponta a psicóloga e conselheira do Conselho Regional de Psicologia do Paraná Ludiana Cardozo Rodrigues. “O amor é difícil porque tenho que conhecer meu desejo e ainda levar em conta o desejo do outro. Mas muitas vezes, eu não dou conta de entender nem mesmo o meu próprio, o que pode gerar esse afastamento”, afirma.

O empresário Renan Hamilko Barbosa e a médica Giovanna Golin Guarinello viveram momentos difíceis nos dez anos de namoro, que será oficializado em uma cerimônia no dia 27 de julho. Mas isso só a fortaleceu. Criados em uma família católica, o casal quer assumir o compromisso perante Deus. “[Ao casar], você pensa mais no outro do que pensaria se apenas morasse junto”, acredita Giovanna. “O casamento é a confirmação do compromisso que já temos um com o outro de batalhar lado a lado pelo resto da vida”, ressalta Renan, convicto.

*Matéria originalmente publicada na edição 223 da revista TOPVIEW.

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