Contrato de namoro em tempos de Covid-19
Nas últimas duas colunas eu tratei sobre os efeitos e as consequências imediatas que tenho sentido e observado com a pandemia no que tange aos ex casais e seus filhos. Hoje venho trazer a vocês a análise de outra relação que também já tem se mostrado afetada com o Coronavírus: o namoro.
O namoro é uma relação afetiva mantida por duas pessoas que se propõe a estarem juntas para se conhecerem melhor, e a distinção entre namoro e a união estável se faz pelo interesse na constituição de família. Mas, como saber diferenciar se o casal de namorados que resolveu, durante a pandemia ir morar junto, não tem interesse em constituir família? Em que momento fica claro para cada um que o interesse é somente não se separarem durante o período de isolamento?
Difícil, não? Pois então, imaginem se durante o período de quarentena ao invés de amor e desejo de estarem junto, surgirem discussões, a certeza de que foi precipitado e é o fim do romance. Será que ambos saberão lidar da mesma forma com o rompimento? Todas essas perguntas são naturais, pois um pode achar que está em um namoro, enquanto o outro pode achar que está em uma união estável, e a lei brasileira permite que qualquer relacionamento amoroso seja convertido em união estável, independentemente da duração e formalização por escrito, desde que não haja proibição legal.
É importante deixar claro que a união estável terá os mesmos efeitos do casamento e vigorará pelo regime da comunhão parcial de bens, se não houver contrato escrito estabelecendo outro regime, ou seja, ao fim da relação, caberá a partilha dos bens e dívidas adquiridos na constância da união. Os bens não precisam ser imóveis, estou falando de algo a curto prazo, como investimentos, verbas rescisórias, FGTS, dívidas de cartão de crédito, até mesmo de pets, etc.
À primeira vista, quando se está bem com seu/sua namorado(a), pode até parecer exagerada o cenário que trago, mas quando há o rompimento e um fica magoado e acha que tinha uma relação de união estável, aí inicia-se o problema. Inclusive, hipoteticamente, havendo a ajuda financeira habitual ao “namoro”, não importando a razão, já haverá a configuração da união estável, ainda que não morem juntos.
Como falei na entrevista que dei na plataforma TopviewonLive, em 18 setembro de 2018, o contrato de namoro é uma alternativa quando o casal mantém essa relação que pode ser confundida com uma união estável e não é do interesse de ambos a extensão a um projeto de vida juntos (noivado, união estável ou casamento), pelo menos por ora. Então, esse documento trará expressa e formalmente cláusulas minuciosas quanto a vontade de que esta relação não configure união estável, e, portanto, não sofra seus reflexos patrimoniais. Quero deixar claro que não é colocar termo ao amor. O contrato de namoro nada tem a ver com o amor que um sente pelo outro, porque o Direito não se preocupa com o amor, se é recíproco ou não. O objetivo do Direito é com o crescimento e a gestão patrimonial do casal.
Acredito que com as circunstâncias tais como tem se apresentado no Brasil, será bem mais penoso juntar provas para convencer o Juiz de que não havia o interesse de constituir família, do que formalizar um contrato de namoro. Nessa fase em que não sabemos por quanto tempo o coronavírus fará parte da pauta do dia e quando o isolamento social deixará de ser necessário, ser cauteloso e tentar evitar ações judiciais futuras, utilizando de meio extrajudicial que tem validade jurídica, é uma alternativa extremamente sensata.
Sobre a colunista
Advogada inscrita na OAB/PR nº 61.717, Cristiane Goebel Salomão é especialista em Direito Processual Civil, Direito de Família e Sucessões e Membro do Grupo Permanente de Discussão sobre Direito de Família da OAB/PR. Se destacou desde cedo na atuação em Divórcios, Dissoluções de Uniões Estáveis, Regulamentação de Visitas, Execução de Pensão. Hoje, sua grande paixão é a área de Família, na qual consolidou a maior clientela. Em seu trabalho utiliza muito da experiência adquirida enquanto trabalhou como conciliadora no Juizado Especial Cível, Criminal e da Fazenda Pública em São José dos Pinhais (Paraná). Natural de Porto Alegre (Rio Grande do Sul), escolheu Curitiba para fixar residência e construir carreira.