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Cientistas brasileiras são referência mundial em pesquisas sobre o meio ambiente

Mulheres que atuam nas ciências naturais são exemplos para despertar o interesse das novas gerações

Nesta quarta-feira (8/7) comemora-se o Dia Nacional da Ciência e o Dia Nacional do Pesquisador Científico, datas criadas para celebrar as conquistas brasileiras na área, mas que se tornam especialmente importantes de serem lembradas nestes tempos em que a ciência vem ganhando mais destaque no mundo todo e, ao mesmo tempo, sendo bastante desafiada.

No Brasil, são muitas as áreas que se destacam. Nas ciências ambientais, por exemplo, o País sempre foi uma voz expressiva no cenário internacional e um campo em que as mulheres têm um expressivo papel, coordenando alguns dos maiores projetos de conservação existentes. Em abril, por exemplo, a bióloga Patrícia Médici venceu o Whitley Gold Awards, considerada a maior premiação de conservação ambiental do mundo, por seu trabalho em proteção da anta brasileira.

E outras figuras de inspiração como o de Patrícia não faltam. Neiva Guedes, membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN), doutora em biologia e professora da pós-graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento Regional na Universidade Anhanguera-Uniderp, há 30 anos vem trabalhando para salvar a arara-azul. A espécie, que já esteve ameaça de extinção, saiu da lista de animais em perigo graças às pesquisas científicas que ela e sua equipe vêm fazendo ao longo dessas décadas.

Os resultados são impressionantes. É fácil perder a conta com a quantidade de prêmios e condecorações conquistadas pela bióloga. Entre as honrarias obtidas por Neiva estão o Prêmio Pieter Oyens, da WWF, o Grand Master of the Order of the Golden Ark (título honorário concedido pelo Príncipe Bernhard da Holanda) e o Prêmio Ambiental Von Martius, da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Alemanha.

“Estamos no caminho certo. Não imaginava chegar até aqui e realizar o imenso trabalho que conseguimos. É difícil até acreditar que demos conta de fazer tudo isso. O que mais me deixa feliz é o engajamento da sociedade. É muito claro que quando você produz ciência de qualidade e compartilha de maneira simples para as pessoas, para elas entenderem, você ganha muitos aliados e consegue ajudar ainda mais no objetivo da conservação. Atribuo muito à população em si, nossos apoiadores, colaboradores, patrocinadores e à imprensa todos esses resultados”.

Para Neiva, a ciência vive um momento desafiador, mas ao mesmo tempo de fortalecimento. “Neste momento, em função da pandemia do novo coronavírus e do uso constante da palavra ciência, vem crescendo de maneira notável o interesse das pessoas por tudo aquilo que tem base científica. Fico muito feliz de isso estar estimulando os jovens a irem para a ciência, pois temos no Brasil uma riqueza muito grande de tudo, inclusive de conhecimento e talento. É importante para o futuro”.

O trabalho científico da pesquisadora está concentrado no Pantanal, onde se localiza a maior parte da população de arara-azul no Brasil. No entanto, a espécie também pode ser encontrada no Norte e no Nordeste. É graças ao monitoramento constante das centenas de ninhos país afora que a pesquisadora consegue mapear a situação das aves. Nos últimos anos, por exemplo, identificou alta mortalidade na população de arara-azul por Herpesvírus, que se espalhou entre os animais, levando o registro de óbito de mais de 200 indivíduos.

“Infelizmente, temos visto um retrocesso na área ambiental, inclusive com perdas de conquistas realizadas anteriormente e um verdadeiro descaso com a conservação. Tudo isso gera um grande problema, agravado pelos desmatamentos, queimadas e aumento dos efeitos das mudanças climáticas, aliados aos poucos recursos destinados à conservação, sobretudo públicos, para fomentar pesquisas na área”.

Opinião parecida tem Flávia Miranda, membro da RECN, doutora em zoologia e reconhecida por seu trabalho em defesa dos tamanduás, animal símbolo do Brasil. Em 2017, ela descobriu e descreveu seis novas espécies do mamífero, um feito raríssimo em qualquer lugar do mundo. O trabalho virou sua tese de doutorado, que um ano depois ganharia menção honrosa numa das principais distinções acadêmicas do Brasil: o Prêmio CAPES de Tese.

“Depois de dez anos, a pesquisa teve o ápice na descrição de seis novas espécies de tamanduaís, menor espécie de tamanduá do mundo. É bastante raro descrever um mamífero em pleno século XXI e essa é a base de toda a conservação. Sem conhecer a espécie não tem como montar todo um plano de conservação e de manejo. Nosso trabalho, nosso grande legado, foi essa descrição”, diz Flávia, que é coordenadora do Instituto de Pesquisa e Conservação de Tamanduás do Brasil e coordenadora científica do Programa de Conservação do Tatu-Bola pela Associação Caatinga.

Para a cientista, é essencial que se invista em ciência muito mais do que é investido atualmente. “A ciência natural para mim é a mais importante, ou uma das mais importantes, porque não tem como separar o homem da natureza. Além do mais, a pesquisa natural é fundamental para preservar a nossa própria espécie. Temos muito a aprender com os outros animais, a como se viver em um ecossistema em constante mudança e aprender a impactá-lo menos se quisermos permanecer. Já tivemos cinco extinções em massa, se não for agora, nesse momento de pandemia e de tantas mudanças, quando vai ser?”, observa. 

Em relação à participação feminina na área, Flávia declara. “Não gosto muito da diferença de gênero, mas é legal mostrar que, hoje, os grandes projetos de conservação no Brasil são coordenados por mulheres. É importante para mostrar que conseguimos enfrentar as dificuldades do campo. Às vezes sou só eu de mulher, e consigo buscar o respeito, fazer a pesquisa e trabalhar com todos de forma única. Esse é um grande incentivo para mostrar que lugar de mulher é onde ela quiser”.

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