Alfabetizando Betina
Por Virgínia Magalhães
Quando o assunto é criação e educação, os pais se dividem entre diversos modelos, metodologias e opções de ensino. Há os mais idealistas, os mais preocupados com o futuro e os que entendem a importância de viver o presente. Há os que veem a agenda do filho como a própria agenda, cheia de atividades extracurriculares, e aqueles que preferem segurar as crianças o maior tempo possível dentro de casa.
Quando Betina nasceu, havia uma preocupação muito grande de minha parte em estar o máximo presente na vida dela, o que foi impossível nos primeiros anos, já que não havia me planejado para isso. Antes tarde do que nunca: aos três anos de idade, isso se tornou possível, quando optei pelo modelo de trabalho home office. Foram bons anos acompanhando seu crescimento de perto,
sem deixar de lado minha carreira profissional. Mas então veio a pandemia.
Obrigou a todos, inclusive as crianças, a seguir aquele modelo que, para mim, já era muito confortável. A adesão foi obrigatória, mas não bem quista pela maioria. No que diz respeito à educação, principalmente a infantil, as dificuldades foram inúmeras. Todos tivemos que nos reinventar, sem exceção.
No caso de Betina, o principal desafio em ano de homeschooling foi a alfabetização. Pois, por mais que fosse muito ativa junto às tarefas que vinham da escola, não era meu o papel de ensinar o bê-á-bá até aquele presente momento. E, mesmo sem a didática necessária ou a paciência de uma típica professora do ensino infantil, descobri-me naquele momento alguém que queria muito fazer dar certo essa nova experiência.
“Na prática, foram dias de verdadeiros desafios – alguns verdadeiramente insanos. Mas, no final, ver minha filha, antes de finalizar o primeiro ano, lendo e escrevendo fluentemente o bom português é, sem sombra de dúvidas, um orgulho que levarei para o resto da vida.”
Encarei as dificuldades de forma sistemática. Estipulei horários e desenhei uma agenda flexível, em que se encaixavam minhas obrigações maternas, profissionais e, então, pedagógicas. E, ao longo de um ano letivo, ao mesmo tempo que via minha filha aprender a ler e escrever, vi também uma mãe aprender a lecionar. Claro que colocado assim no papel parece fácil e poético! Na prática, foram dias de verdadeiros desafios – alguns verdadeiramente insanos. Mas, no final, ver minha filha, antes de finalizar o primeiro ano, lendo e escrevendo fluentemente o bom português é, sem sombra de dúvidas, um orgulho que levarei para o resto da vida.
Com isso, reflito: sentiria o mesmo orgulho, ao final de cada ano, um professor em relação a cada um de seus alunos? Teriam eles a verdadeira consciência da importância que têm na vida de cada criança? Saberíamos nós o valor real que cada um desses profissionais tem não só na vida dos nossos filhos como, também, na nossa própria vida, já que um dia estivemos sob seus cuidados e ensinamentos? Seríamos gratos, de forma sincera, a cada professor que nos ajudou, literalmente, a escrever a nossa história?
Sigo ensinando e aprendendo com Betina. Hoje, menos de um ano depois de ela aprender a ler e a escrever, já vejo-a fazendo o mesmo com o inglês. Admiro sua evolução e me sinto parte disso, não só como mãe, mas como alguém que soube entender que aquele momento caótico era, na verdade, uma oportunidade inigualável de ficar ainda mais perto e presente na criação, educação e formação da minha filha. Mas isso só foi possível quando me permiti errar, permiti-me aprender e, então, permiti-me acertar!
*Crônica editorial originalmente publicada na edição #251 da revista TOPVIEW.