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A solidão conectada: a discussão começa agora

A pandemia tornou urgente questões que andavam a passos lentos – e trará impactos ainda pouco conhecidos

Talvez em poucos momentos históricos tenhamos visto tão claramente a nossa vida estar sob nossa responsabilidade. Com a pandemia do novo coronavírus, nossa saúde – e do restante da população – depende, a grosso modo, da higienização das mãos e do isolamento social. São as decisões e cuidados individuais que vão definir, em parte, os impactos do vírus na sociedade.Ficar em casa, hoje, é a maneira mais eficaz de prevenção da Covid-19, que, até o fechamento desta matéria, já infectou mais de 1,6 milhão de pessoas no mundo.

A pandemia é comparada a da gripe espanhola, do século XX, que também utilizou medidas de isolamento para frear o avanço da doença. Mas os níveis de globalização atuais tornam a situação bastante diferente. Pela primeira vez na história recente, mais de um terço da população mundial – cerca de 2,8 bilhões de pessoas – está sob algum nível de restrição de circulação, apontou um balanço da Agência France Presse (AFP) nos últimos dias de março. Os efeitos emocionais, sociais e financeiros da quarentena se revelam aos poucos. “A gente não tem uma fórmula pronta de como enfrentar isso. São situações extremamente difíceis”, reflete Claudia Lucia Menegatti, psicóloga, analista do comportamento e professora da PUCPR.

Para ela, a primeira questão do isolamento é como a pessoa pode se manter conectada com o mundo de uma forma saudável.Reduzir o acesso às notícias é um dos pontos essenciais, já que, com tantos acontecimentos ruins, pode ser bastante estressante. “Acho que é uma das questões mais importantes para que as pessoas consigam ter energia, disposição e o mínimo de paz mental para procurar outras alternativas de atividades nas suas próprias casas”, resume.

As pessoas com excesso de conexão às informações podem se sentir ansiosas, com medo exagerado de contágio da doença, extremamente tristes e desesperançosas. “Temos falado muito sobre a proteção às pessoas vulneráveis do ponto de vista físico, obviamente. Mas também precisamos prestar atenção e achar maneiras de proteger as pessoas que têm um histórico de problemas emocionais“, pontua Menegatti. “Elas podem estar mais suscetíveis do que todos nós já estamos.”

No geral, essa situação pode causar sintomas como insônia, ansiedade intensa, pensamentos repetitivos ou excesso de medo em relação ao contágio, além de sensações profundas de tristeza. Entra aí a importância de canais de acolhimento virtual. “Muitos voluntários estão se dispondo a fazer esse trabalho, de ouvir as pessoas, de se conectar com elas, para que possam falar de seus medos. Elas podem telefonar, trocar ideias, fazer atendimento online para que sintam que estão mais protegidas nessa situação”, conta. A ideia é que ninguém tenha a sensação de que está sozinho, já que todos estão passando por momentos bem parecidos ao redor do país e do mundo.Um desses serviços – já bastante utilizado antes da pandemia – é o Centro de Valorização da Vida (CVV).

O trabalho, realizado por voluntários treinados, é baseado na premissa de oferecer apoio emocional para todo tipo de situação e pessoa. O CVV conta com linhas de atendimento online (por e-mail e chat) e por telefone 24 horas. “O papel do CVV é acolher o sentimento da pessoa e facilitar seu desabafo. Tentamos criar um ambiente em que ela confie no voluntário para compartilhar suas angústias, dores e fragilidades da vida”, conta Claudiane Araújo, voluntária há oito anos e porta-voz do CVV. É importante que esse acolhimento seja praticado entre colegas, amigos e família também. “Agora é momento de apoio mútuo das pessoas próximas”, relembra Araújo. “É essencial que esse ombro amigo se espalhe, não tenha que ser um serviço externo apenas. Você poder se doar naquele momento para ouvir a pessoa, para poder dar esse auxílio.”

“Temos falado sobre a proteção às pessoas vulneráveis do ponto de vista físico, mas pre-cisamos também prestar atenção e proteger as pessoas com histórico de problemas emocionais.” – Claudia Lucia Menegatti

Confira o restante da matéria aqui:

*Matéria originalmente publicada na edição 235 da revista TOPVIEW.

 

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