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A cidade de que precisamos

Confira cinco artigos assinados por especialistas sobre o futuro de Curitiba em cinco vertentes: arquitetura, educação, meio ambiente, mobilidade e moda

Se viver o presente com consciência é a melhor forma de garantir um futuro seguro, Curitiba está em consonância com essa certeza, por ser a melhor capital para se viver no Brasil. São inúmeras iniciativas ofertadas pelo poder público, por empresas privadas, pelo terceiro setor e pelos cidadãos apaixonados pela cidade, a fim de que ela continue sendo referência em áreas distintas para vários outros municípios do país e para o mundo.

A prefeitura, em parceria com a ONG Comunitas e a Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep), possui um planejamento estratégico chamado “Curitiba 2035”, que tem como propósito preparar a capital paranaense para um crescimento ordenado e de acordo com os princípios de sustentabilidade, desfrutando de forma atenta das oportunidades e dos investimentos inerentes à cidade, visando ao bem-estar e à qualidade de vidas dos residentes da Cidade Sorriso.

Nos últimos anos, os holofotes da inovação e da tecnologia foram atraídos para Curitiba – que até ganhou o apelido de “Vale do Silício Brasileiro”, o qual foi carinhosamente adaptado para “Vale do Pinhão”. O grande propósito dessa iniciativa é fortalecer e potencializar o ambiente de inovação por meio do empreendedorismo, da economia criativa e da tecnologia, possibilitando que novas ideias saiam do papel e se tornem realidades que transformem o dia a dia das pessoas.

Nas próximas páginas, você confere cinco artigos assinados por especialistas que falarão sobre o futuro da capital paranaense em cinco vertentes: arquitetura, educação, meio ambiente, mobilidade e moda. O objetivo desses conteúdos é fazer uma análise e refletir como Curitiba deve evoluir e se adaptar às necessidades da população daqui em diante. Confira!

Curitiba 5.0

(Foto: Daniel Castellano / SMCS)

Por Guilherme Klock, Curitibano e arquiteto no Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC) e na Secretaria Municipal de Meio Ambiente durante a gestão do prefeito Rafael Greca

Cidades surgem e se adaptam às circunstâncias socioeconômicas. Em Curitiba, não foi diferente. Começamos como arraial de mineração de ouro, tornamo-nos pouso de tropas de gado, geramos riquezas com o chamado “ouro verde” – a erva mate –, recepcionamos convergências migratórias, fomos projetados por um urbanista francês – Alfred Agache, em 1943 –, planejados por um urbanista italiano – Jorge Wilhelm, que criou, em 1965, o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC) –, recebemos os “pés vermelhos” do norte do Paraná – após a geada negra de 1975, que devastou a economia da cafeicultura –, industrializamo-nos e, hoje, somos essencialmente uma cidade de serviço e a capital de um estado agrícola.

Agora, o mundo se prepara para entrar na nova revolução: a da indústria 5.0. Trata-se do alinhamento entre a inteligência humana e a tecnologia robótica. Em síntese, o homem terá mais tempo para explorar o seu lado criativo e as atividades de lazer.

No livro Urbanismo, o arquiteto e urbanista Le Corbusier afirma que é necessário adaptar a cidade à sua época, restituindo-lhe a sua nobreza e desenvolvendo a sua eficácia. Para isso, é preciso transformá-la fundamentalmente.

Já vislumbramos um futuro. Por que não criar soluções que nos direcionam e se aproximam desse objetivo? Imagino uma Curitiba sustentada nos pilares primordiais da boa arquitetura, técnica, plástica e função. No equilíbrio desses conceitos, adaptados ao locus e ao tempo em que vivemos. Idealizo uma cidade estruturada em parques lineares ao longo dos rios e córregos, criando corredores urbanos de diversidade ecológica com edificações inteligentes e energias limpas, embarcada com toda tecnologia da revolução 5.0. Algo que dê qualidade de vida e crie espaços de convivência harmônica com a natureza: homem, natureza e tecnologia em equilíbrio.

Água limpa e sossego

(Foto: Daniel Castellano / SMCS)

Por Eduardo Fenianos, Autor de 63 livros, entre eles, Viagem por Curitiba em 90 Dias, em que relata sua experiência de navegar os rios da cidade e conhecer todas as suas ruas

Não há nada mais futurista para tratar de questões ambientais do que uma frase dita pelo filósofo Lao-Tsé há 26 séculos: “Antes de iniciar o trabalho de mudar o mundo, dê três voltas ao redor de sua própria casa.” A frase nos ensina a cuidar do mundo e do ambiente a partir do que mais próximo nos rodeia: a própria casa, o bairro e a cidade.

Na Curitiba do início do século XXI, a falta de água preocupa, a poluição dos rios e represas aumenta e, no 156, o tema “barulho e ruídos urbanos” lidera a lista de reclamações, mostrando que ainda é preciso gritar muito para se ter silêncio.

E, para que a Curitiba do futuro não sofra com essas e outras questões ambientais, precisamos de curitibanos cada vez mais exigentes, mais “briguentos”.

Curitibanos que reclamem das empresas ou daqueles que não respeitam a Lei do Silêncio, que pressionem os órgãos que deveriam cuidar das águas e do esgoto e não cuidam. Que cuidem da cidade como cuidam de sua própria casa.

Curitibanos que saibam que somos frutos do meio, mas o meio também é fruto de nós, fruto das nossas exigências e, infelizmente, também da nossa submissão.

Curitibanos que deem três, cinco ou mil voltas ao redor de nossa “Casa-Curitiba” para, a partir dela, consertar o mundo.

Curitibanos que trabalhem e exijam muito para que tenhamos no futuro o que um dia já tiveram os nossos avós no passado: água limpa, natureza próxima e sossego.

Como avançar na educação?

(Foto: Daniel Castellano / SMCS)

Por Marcos Meier Cidadão, honorário de Curitiba, matemático, psicólogo, escritor e palestrante

Éfácil criticar a educação de qualquer cidade do nosso país, pois sempre há algo a melhorar. Entretanto, sem querer bajular nossa cidade, creio que Curitiba tem se destacado pela forma como atende a população. Há problemas, sim, mas são enfrentados.

Contudo, a proposta deste texto é dizer o que esperamos daqui para frente – e a população merece que seus filhos recebam uma educação cada vez melhor. E isso se faz com formação continuada de professores e atualização frequente das metodologias de ensino. Não adianta receber um professor diplomado por uma universidade e não fazer mais nada. É preciso dar cursos de atualização nos tópicos curriculares, criar congressos, seminários, jornadas e todas as outras formas de trazer conteúdo de qualidade e aplicável. E agora, com a inserção das novas tecnologias, precisamos formar os professores para que as utilizem de forma otimizada, de forma a não ficar esperando que, novamente, trabalhem dobrado, como o fizeram na pandemia.

Além disso, precisamos mudar a mentalidade em relação à autonomia dos alunos. Nos países em que o investimento em educação trouxe desenvolvimento social e econômico, os alunos têm aulas como aqui no Brasil, mas trabalham muito nas disciplinas específicas: fazem pesquisas em grupo, individuais, criam textos, resolvem listas de exercícios, envolvem-se em projetos nos quais aprendem e aplicam o que aprenderam… enfim, são ativos. Chega dessa passividade em que os alunos recebem tudo pronto dos professores. Isso não traz desenvolvimento.

E, por fim, cidadãos críticos, ativos e que constroem uma cidade melhor são o fruto de famílias mais envolvidas, empresas que apoiam a educação, instituições que fortalecem os projetos educativos e uma mentalidade geral de que nosso futuro depende de investimentos reais na educação. Aí, sim, vamos crescer.

Moda e consumo consciente

(Foto: Nuno Papp e acervo Pessoal)

Por Camila Ferreira da Costa Teixeira, Designer de moda, mestre em Educação e professora do curso de Design da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR)

Curitiba completa 328 anos em 29 de março de 2021. No Brasil, o município é conhecido como a “cidade do design”, com um público extremamente exigente e o reconhecimento em várias áreas, como na da mobilidade urbana, da separação do lixo e da reciclagem – só para citar algumas.

Muitos devem se lembrar da famosa Família Folha, nos anos 1990, que nos ensinava a separar o lixo por meio do famoso jingle: “Lixo que não é lixo não vai para o lixo! se-pa-re!” Trata-se de uma forte lembrança, que permanece viva em minha memória – e tenho a certeza de que está na memória de muitos conterrâneos contemporâneos.

Mas você pode estar se perguntando: “o que isso tem a ver com o mercado de moda curitibano?” Na minha opinião, muito!

Antes da chegada da pandemia do novo coronavírus ao Brasil, a capital paranaense já estava se consolidando como um forte polo da moda autoral, com muitas marcas focando o conceito de slow fashion. Elas têm como princípio se concentrarem na qualidade do design e da produção, assim como na apreciação, por parte dos consumidores, de seu valor. O foco desse movimento está na relação mais cuidadosa entre estilistas, fornecedores, distribuidores e consumidores, cada vez mais conscientes do impacto da produção de moda sobre as relações sociais e a natureza.

O novo consumidor está empoderado, é informado e tem voz ativa, com alto grau de conhecimento. Além disso, os residentes da cidade da Família Folha estão cada vez mais preocupados com o processo produtivo do que consomem e com o impacto que essa produção causa.

Assim, conforme já demonstram as tendências, acredito que o futuro do mercado de moda curitibano estará cada vez mais voltado ao desenvolvimento de produtos autorais que colaboram para um ciclo produtivo mais sustentável e com foco no consumidor consciente.

Curitiba rumo à evolução da mobilidade

(Foto: Daniel Castellano / SMCS)

Por Luiz Fernando Jamur, Presidente do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc)

A garantia da mobilidade, nos mais diversos modos, é componente estratégico e indispensável ao desenvolvimento urbano e humano. Cabe ao planejador de cidades facilitar o ir e vir dos habitantes, criando melhores condições de acesso à casa, ao trabalho, ao lazer e tendo como referência as origens, os destinos e os motivos desses deslocamentos.

Mobilidade representa a soma do transporte e do trânsito (de veículos, pessoas, bicicletas) e está vinculada ao planejamento urbano. Mobilidade não é apenas fazer o trânsito andar.

Em Curitiba, o planejamento tem por base o transporte público, o uso do solo e o sistema viário. Um tripé permeado pela mobilidade em todos os seus componentes.

Foi a transformação do planejado em prática, sem perder o foco no Plano Diretor, que fez de nossa cidade a pioneira no funcionamento dos corredores exclusivos ao transporte, com ônibus expressos nas canaletas, ladeadas por vias lentas, em que é possível promover mais adensamento, integrando moradia ao comércio e aos serviços. Uma equação que garantiu, por anos, a alimentação e a eficiência de um sistema troncal de transporte integrado a terminais e com tarifa única.

O sistema expresso começou a funcionar em 1974 no eixo norte-sul, com 20 ônibus e duas linhas. Hoje, são nove linhas expressas em funcionamento e seis corredores de transporte (norte, sul, leste, oeste, Boqueirão e Linha Verde) operando com ônibus biarticulados em 81 quilômetros de canaletas exclusivas, no sistema que passou a ser conhecido mundialmente como BRT.

Nos últimos anos, o exponencial aumento da frota de automóveis, favorecida pelo incremento do crédito, bem como o surgimento do transporte por aplicativos, entre outras variáveis, tiveram grande impacto na perda de passageiros pelo transporte de massa.

Para mudar essa realidade, o transporte público precisa ter condições de competir em conforto, tempo de deslocamento e custo compatível. E é com vistas a essa demanda importante que o Programa de Mobilidade Sustentável de Curitiba prevê grandes investimentos no transporte público, em infraestrutura viária, cicloviária e em engenharia de tráfego.

Faz parte desse contexto a promoção da intermodalidade, com veículos movidos à energia limpa, tanto no Novo Inter 2 como no corredor leste-oeste. Tudo isso integrado a uma base tecnológica que une o serviço público de transporte coletivo aos sistemas flexíveis de compartilhamento de bicicletas, micromobilidade, car-sharing, entre outros, com o objetivo de racionalizar os deslocamentos no espaço urbano.

O que se propõe é a mudança de patamar para um salto de qualidade. O planejamento de Curitiba garantiu a infraestrutura para podermos contar com um sistema de transporte moderno, seguro e integrado à mobilidade ativa para o benefício de todos os curitibanos. E é nesse caminho que seguimos.

*Matéria originalmente publicada no Caderno Especial Curitiba 328 anos, na edição #247 da revista TOPVIEW.

 

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