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Cezinha Mocelin, o persistente empresário que transforma a cena de eventos de Curitiba

“A emoção e o prazer das pessoas que participam de um evento – isso é a maior realização" revela Cezinha Mocelin em entrevista EXCLUSIVA

O curitibano Cezinha Mocelin se consolidou como um grande nome da produção de eventos no Sul do país. O produtor se orgulha de ter feito parte da profissionalização da noite curitibana e das festas do litoral do Paraná, como sócio do Bali Hai Guaratuba e de bares que fundaram o entretenimento coletivo. Hoje, aos 47 anos de idade – destes, duas décadas no ramo -, o enfoque de suas produções se direciona para novos horizontes: suas próprias paixões.

Recentemente, sua 302 Produções investiu em trazer para a cidade grandes eventos, como o Curitiba Blues Festival, o Parada Pet e (os futuros) Arraiá do MON e BMS Motorcycle. A seguir, você confere uma entrevista exclusiva com Cezinha Mocelin, que abriu as portas de seu escritório na Usina 5 – fábrica desativada do Açúcar Diana que funciona como cenário dos novos eventos curitibanos – e revelou os segredos, as dificuldades e os bastidores da produção de eventos.

TOPVIEW: O Festival Crossroads Especial Dia Mundial do Rock acontece neste sábado, 14 de julho. O que podemos esperar?

Cezinha Mocelin: Quando Alessandro Reis, do Crossroads veio com a ideia de fazer o evento na Usina Cinco a gente comprou, por acreditar que, aqui, conseguimos fazê-lo de forma diferente. Pela primeira vez, ele se transforma em um grande festival de rock, com mais de 30 bandas, quatro palcos e 12 horas de música. Fazemos com que a festa tome um novo patamar. Marcamos ele como um grande evento de rock nacional – o que já é.

Para saber mais: Usina 5 recebe Festival Crossroad no Dia Mundial do Rock

TV: Você já produziu para grandes marcas, festivais de música e de gastronomia. Qual evento foi o mais desafiador?

CM: Cada evento é extremamente desafiador, por menor ou maior que seja. Em cada um você percebe que sempre pode aprender algo a mais. Até um aniversário pode ser desafiador. Sempre existe um desafio e alguns limitadores – o clima é um dos maiores.

TV: Qualquer pessoa que pensa em fazer eventos externos em Curitiba é taxado de louco. Principalmente, por conta do tempo. Como aprendeu a lidar com esse fator?

CM: Para o produtor e para o público: de louco todo mundo tem um pouco, ainda mais nesse ramo! Não tem como fazer uma previsão. Então, quando você marca um evento, acaba contando com um pouco da sorte. Infelizmente, em 25 anos de evento, já errei muitas vezes e tive que fazer embaixo de chuva, frio e tempestade. O maior desafio, para qualquer produtor de evento, é a questão de liberação, de atender todas as exigências legais, o que é difícil. É como se fosse abrir uma empresa: em outros países, você abre em dois dias; no Brasil, são 60. Então, sempre que você vai fazer um evento que não seja em um espaço já determinado para isso – utilizar espaços públicos ou novos para, exatamente, trazer novidades –, é o desafio de tramitar dentro dos órgãos públicos. Mesmo que hoje você consiga divulgar rapidamente nas mídias sociais, não consegue liberar um evento em menos de três meses. Esse é o grande dificultador. Não é por má vontade da Prefeitura, que é o principal órgão de regulamentação, é pelos processos não serem bem estabelecidos.

Antiga Fábrica Diana.

A maior habilidade de um produtor de eventos é lidar com as pessoas: as que estão a trabalhar com você, as que virão ao seu evento e as que estão apostando no seu evento.”

TV: Donos de pets, motoqueiros e fãs de artistas – como é possível agradar todos os tipos de público?

CM: Na minha idade, eu tenho feito só o que eu gosto, daí fica mais fácil. Pet, por exemplo, eu gosto muito. Quando você faz um evento [sobre algo pelo] que você já tem paixão, é muito mais fácil você àqueles que têm essa mesma paixão. Não conheço tudo de gastronomia, muito pelo contrário, mas gosto do segmento. Quando você fala em moto, pet, rock, por mais que eu não saiba tudo, eu gosto desses mundos. Quer dizer que a gente não pode fazer eventos de outros segmentos? Pode e, quanto mais experiência, melhores os eventos serão. Mas com paixão é tudo mais fácil.

TV: Quais são as suas outras paixões?

CM: Eu ando em uma sequência de tantos eventos que não tenho me dedicado muito a algumas paixões. Mas, dentro de eventos, consigo me dedicar a alguns hobbies: moto, animais e espaços alternativos. Consegui juntar, por mais trabalhoso que seja, os meus principais gostos com o que eu faço. Teoricamente, fica mais fácil.

TV: E qual é a sua formação?

CM: Por incrível que pareça, eu fiz Economia, mas logo abandonei e comecei a trabalhar empresariando. Se eu tenho uma sugestão é que o produtor de evento tem que conhecer um pouco de tudo, mais do que [ter uma] formação específica. Uma coisa que influencia muito é a parte psicológica, tendo tantos altos e baixos como a gente tem, a ansiedade de saber se seu evento vai dar certo. E, eu sempre digo: não é dar ou não dar dinheiro, é as pessoas irem ao evento e gostarem dele.

“A expectativa de pagar menos com a de cobrar mais não dá para fechar a conta. Quando a gente conseguir ajustar isso, seremos uma capital dos grandes eventos.”

TV: Como são os bastidores reais da produção de eventos em Curitiba?

CM: É um desafio atrás do outro. Aquele glamour que as pessoas percebem, nos bastidores não existe. Você tem as dificuldades não só financeiras, mas de relações interpessoais com todo mundo que trabalha, com a própria equipe. Eu sempre brinco que os eventos são como um “Big Brother”: você tem um convívio muito próximo de um mês com diversas pessoas. A maior habilidade de um produtor de eventos é lidar com as pessoas: as que trabalham com você, as que virão ao seu evento e as que estão apostando nele. Além do clima e das liberações, é conseguir lidar com todas essas variedades de pessoas, de desejos e de expectativas.

TribalTech. (Foto: Ebraim Martins)

TV: E no que o público curitibano se diferencia?

CM: A grande pergunta! Se a gente comparar com outros públicos, o curitibano tem um nível de exigência muito grande. Curitiba é conhecida como a cidade para lançamentos de produtos. Isso faz com que a gente tenha grandes eventos e, em média, um atendimento em nível superior (isso também em bares e restaurantes). Claro que, de uns 10 anos para cá, a cidade mudou muito: os curitibanos são minoria, mas o nível de exigência permaneceu. Eu acho que ainda tem uma realidade desencontrada entre o nível de exigência do público com o que ele realmente pagaria para que isso acontecesse. Isso não é culpa do público e dos produtores, é uma relação cultural.

TV: E como isso pode mudar?

CM: Faltam ainda grandes eventos culturais sem cobrança de entrada com uma entrega fantástica. O evento sem cobrança de entrada não é necessariamente um evento ruim, né? Mas o produtor que está fazendo vai ter que achar outra forma de recurso para recompensar isso. É uma pena que a cidade ainda não seja centro dos grandes shows, [como] Porto Alegre, Rio de Janeiro e São Paulo. Isso está próximo de acontecer, temos grandes espaços, como a Pedreira Paulo Leminski, dois estádios e a Usina Cinco. O que falta é a relação custo de ingresso vs visão do público que justifique pagar isso. A expectativa de pagar menos com a de cobrar mais não fecha a conta. Quando a gente conseguir ajustar isso, seremos uma capital dos grandes eventos.

“(…) a emoção e o prazer das pessoas que participam de um evento – isso é a maior realização.”

TV: Alguns grandes shows de Curitiba foram cancelados no ano passado. Você arrisca o motivo?

CM: Foram alguns outros problemas já citados, mas não foi o público que não quis pagar. Como é que você marca um evento com investimento de R$ 6 milhões para a Pedreira com uma capacidade limitada e uma previsão de chuva? Outra é ter shows que entram para a agenda curitibana com pouco tempo de produção. Como há todo o trabalho de liberação, você pode até divulgar que vai acontecer, mas o tempo hábil para execução não é possível. Outra é a questão cultural: quanto é um ingresso justo?

TV: Como você equilibra os eventos pagos e gratuitos?

CM: O Curitiba Blues Festival fizemos com ingressos extremamente acessíveis, trabalhamos com bandas locais, 20 e pouco artistas. Um ingresso barato pode cobrir todos os valores inerentes a um show, como os custos de ambulâncias. Já o Parada Pet, um evento muito organizado, desde sua primeira edição é sem cobrança de entrada.

TV: Qual evento, artista ou festa você sonha em trazer?

CM: Eu sempre fiz muitos shows, talvez nenhum internacional de grande proporção nacional. Meus sócios já o fazem, eu nunca participei efetivamente. Não porque eu não tive oportunidade, mas por ter muito medo. É um desafio muito grande, então, eu diria que hoje meu sonho é trazer um grande artista de rock internacional. Mas isso é sonho.

“Cada vez que você está desistindo, vem alguém que te abraça dizendo “foi ótimo passar a tarde aqui”, “foi ótimo trazer a minha família”, e isso vai te dando força.”

TV: Qual é a dica final para quem quer produzir?

CM: Persistência, cara. São mais de 20 anos de mercado. Nesse tempo, passei por altos e baixo. Como em qualquer negócio, não adianta você pensar que, em poucos anos, vai ter sucesso e viver só de eventos. Claro, há raras exceções que acertam de primeira. A grande maioria – e é o meu caso – foi com essa persistência de se manter no mercado, que constrói fortes relações, um grande network. Como eu sempre falo, se você tiver mais momentos bons que ruins, você já é um sucesso. Seja financeiro ou de realização. A grande dica para quem quiser entrar no mercado é acreditar no que quer. Você não precisa se especializar em um determinado tipo de evento, pode trabalhar com uma gama mais ampla. Não desista, porque a emoção e o prazer das pessoas que participam de um evento – isso é a maior realização.

TV: Você não tem vontade de sair desse meio?

CM: Todos os dias (risos). Eu penso muito em ir para fora, para qualquer lugar, por conta da dificuldade de empresariar no Brasil. Não só para eventos. Seguir a mesma área em outro lugar. Eu não faço isso porque ainda acredito que é passageiro. Logo ali na frente a gente vai ver uma luz no final do túnel. Não desisto porque a emoção e a realização das pessoas no final de um evento vai te dando força sempre para não desistir. Cada vez que você está desistindo, vem alguém que te abraça dizendo “foi ótimo passar a tarde aqui”, “foi ótimo trazer a minha família”, e isso vai te dando força. Mas se você perguntar quantas vezes por mês eu penso em desistir, são praticamente 15!

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