Waldir Simões de Assis Filho: o galerista que assina sua obra
No início da década de 1980, o arquiteto Waldir Simões de Assis Filho se dividia entre projetos de um escritório que tocava com amigos e os quadros de um espaço de exposição que mantinha na mesma casa. Pouco a pouco o bom gosto nato do jovem direcionou suas atenções mais para as telas do que para a prancheta de trabalho. O escritório (e a profissão, por que não dizer?) ficou pequeno para os novos planos que começavam a ser esboçados.
A história da prestigiada Galeria de Arte Simões de Assis poderia ser bastante diferente não fosse o encontro do seu idealizador com o maior colecionador de arte do Brasil: Gilberto Chateaubriand. Waldir, já tendo decidido o que faria como projeto de vida, procurou pessoalmente o filho do magnata dos Diários Associados para tomar conselhos e ter algumas portas importantes abertas. Pesou (e muito) a boa vontade do diplomata e dono de cerca de sete mil obras em apresentar para o jovem sonhador os principais artistas em atuação naquele momento.
Pelas mãos dele, Waldir conheceu gente de peso no mercado, tal como Alfredo Volpi, Tomie Ohtake, Arcangelo Ianelli dentre outros. Além deste networking mais do que necessário para ter acesso às valiosas telas, Gilberto deu um conselho que foi seguido à risca: “O nome da galeria tem que ser o seu próprio nome. Assine sua obra – enfatizou o colecionador.”
Assim, em 2 de julho de 1984 nascia a Simões de Assis Galeria de Arte. Tal como um artista que se entrega por completo à criação antes de grafar seu nome na obra, Waldir empenhou até as últimas economias no projeto. Naquele mesmo ano, dando os primeiros passos como galerista, já tinha recebido o “sim” de Flávia, a futura esposa. Para a primeira exposição, procurou o renomado Alfredo Volpi. Foi até seu ateliê em São Paulo para acertar os detalhes. Na conversa, ouviu uma pergunta, que na verdade era uma espécie de intimação: “E o senhor já tem um Volpi na sua coleção?”.
Não tinha. Tampouco fazia ideia de quanto isso custaria e de onde tiraria dinheiro para pagar. A poupança já estava comprometida com o recém-inaugurado negócio e com as bodas que seriam firmadas em meses.Sem coragem, tampouco condições de falar não, voltou para Curitiba feliz por contar com um medalhão daquele quilate na sua primeira exposição – e também apreensivo pelo valor que teria que desembolsar pela sua aquisição que ainda estava em trabalho.
Depois de algumas semanas, recebeu uma ligação da equipe do artista. A tela estava pronta. “Ao menos pude parcelar”, relembra. “Quatro chequinhos. No dia de compensá-los, saía igual louco pela cidade para arrumar dinheiro pra cobrir”, afirma.
No início, precisou ir além da imagem de um galerista bem relacionado e apto a trazer os melhores nomes para a capital. Waldir afirma que travou uma luta contra a expectativa regionalista do público. “As pessoas queriam ver uma arte paranista, com araucárias e outros temas locais”, lembra.
Este não foi o tom do trabalho desenvolvido por ele, claramente posicionado como um elo entre os artistas mais representativos da arte moderna e contemporânea e quem tem bom gosto para admirar – e bolso para comprar. “Há 30 anos luto para mostrar o valor real da arte e criar um público para isso”, contabiliza. O mercado do alto consumo que envolve este tipo de aquisição só funciona na base do conhecimento e da confiança. “A partir do momento em que a pessoa conhece a história do quadro e do artista, fica mais fácil que ela compre a obra”, resume.
A casa que abriga a galeria fica em um dos espaços mais nobres de Curitiba, o Batel. Conhecida como “Casa de Pedra”, o imóvel é locado. Mesmo assim, recebeu várias benfeitorias que transformaram a antiga residência em um espaço de exposição amplo e confortável. Uma das paredes se transformou numa grande vitrine, de maneira que da rua seja possível admirar algumas obras expostas.
- E o grande motivo de orgulho de Waldir está justamente no conteúdo que trouxe e mantém no espaço. Na lista de artistas que já estiveram na galeria, ele destaca Cícero Dias, Gonçalo Ivo, Arcangelo Ianelli, Juarez Machado, Tomie Ohtake, além de Volpi, só para citar alguns dentre dezenas.
O acervo próprio da galeria conta com quadros de diversos desses pintores. Por vezes, algumas obras são emprestadas para museus e exposições pelo mundo. Se sente ciúmes? Garante que não. “O colecionador tem prazer em mostrar os quadros que compra”, afirma, mesmo que isso lhe tire a proximidade com a obra por meses a fio.
A casa de Waldir Simões de Assis Filho é um reduto aberto para poucos. Ele não lista sequer quais são os artistas que estão no seu acervo particular. Zelo? Preocupação com a segurança? Não exatamente. O receio é chatear os que ficaram de fora dessa seleção íntima e prejudicar futuras relações da galeria. Por alto, ele apenas indica que possui em torno de 150 obras no lar. Falta parede para tanto quadro, garante, o que lhe obriga a aplicar um rodízio.
O futuro da Simões de Assis está mais do que traçado. Uma das salas da galeria abriga as apostas, as tendências, os novos artistas. Quem toca este empreendimento inaugurado em 2011 são os filhos do galerista com Flávia, sua esposa. O casal de gêmeos Laura e Guilherme tentaram seguir por outras áreas, como o Direito e a Economia. Mas, por força do convívio com tantos artistas e influências, aos poucos foram corrigindo a rota a ponto de assinar a SIM Galeria.
O espaço busca difundir artistas que trabalham com os mais variados suportes, tais como pintura, fotografia, escultura e vídeo. Para os novos investidores, ele aconselha justamente a olhar a produção contemporânea. “O jovem tem que investir em obras de artistas jovens, tem que comprar algo do seu tempo”, afirma.
Se há 30 anos Waldir Simões de Assis Filho fez questão de assinar o seu empreendimento com o próprio nome, de certa forma, o mesmo foi feito pelos filhos. Afinal, SIM são as iniciais de Simões – e um novo começo para essa família de amantes das artes.
*Matéria originalmente publicada por Luiz Andrioli na edição 161 da revista TOPVIEW.