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Deltan Dallagnol assume os riscos e os cuidados após a Operação Lava Jato

Conheça os desafios do coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato

Uma personalidade masculina ganhou destaque no último ano pelo excelente trabalho que vem realizando. Eleito o Homem do Ano pelo Prêmio Personalidades TOPVIEW 2019, Deltan Dallagnol, um dos nomes à frente do conjunto de investigações da Lava Jato, é coordenador da força-tarefa da Operação em Curitiba. Confira a entrevista concedida por ele para esta edição.

O que o motivou a escolher o Ministério Público e não o Judiciário?
Tanto a função de juiz como a de promotor ou procurador pode contribuir muito para uma sociedade mais justa e melhor, o que tornou a escolha difícil. Após orar e refletir bastante, entendi que meu perfil é mais proativo e, por isso, mais harmônico com o papel do Ministério Público, que é um defensor da sociedade.

Por meio dos resultados obtidos pela Operação Lava Jato e do destaque do seu trabalho, o senhor obteve notoriedade internacional. O que mudou em sua rotina?
O trabalho é muito intenso, o que me fez abandonar atividades físicas e reduzir tempo de lazer e com amigos. Além disso, vieram cuidados com segurança. Agora, o mais importante é o que não mudou, a minha identidade e como eu me vejo. A Lava Jato é um dos meus papéis, mas tenho outros: de marido, pai, filho, discípulo, cidadão, amigo — e tudo isso que está acontecendo em uma das dimensões da minha vida, a profissional, é passageiro.

Como conciliar os riscos e as atribuições da força-tarefa com o convívio familiar?
Há um preço que devemos estar dispostos a pagar se queremos construir um país melhor. No meu caso, os riscos trazem, certamente, algumas limitações e cautelas, mas ainda existem muitas opções para conviver e construir momentos significativos em família. Foco bastante na qualidade do tempo e no papel que tenho. Com meus filhos, por exemplo, por identificar como parte do meu papel o de prepará-los para a vida, tenho buscado investir uma parcela do tempo que passo com eles no desenvolvimento de valores, criatividade, empatia e habilidades para relacionamento e negociação. São capacidades que não faziam parte da educação tradicional e são importantes para a vida.

“A Lava Jato diagnosticou um esquema de corrupção sistêmica que ainda existe e tem que indignar você.”

Quais são os principais benefícios que a Operação deixa para a sociedade?
O benefício ultrapassa a responsabilização de dezenas de poderosos e a recuperação de muitos bilhões de reais, embora inéditas. A Lava Jato diagnosticou um esquema de corrupção sistêmica que ainda existe e tem que indignar você. Isso abre uma janela de tratamento do problema. A Operação incentivou ainda a cidadania, promoveu o compliance nas empresas, resgatou para muitos o idealismo e nos fez acreditar que podemos, sim, enfrentar e resolver nossos problemas.

Recentemente, foram divulgados supostos diálogos que teriam sido mantidos entre os integrantes da força-tarefa. Esse vazamento pode ter afetado a imagem da Lava Jato?
Por serem reportagens sensacionalistas e fantasiosas, o apoio da Lava Jato permaneceu inabalado. Uma pesquisa do Datafolha de dezembro de 2019 mostrou que mais de 80% dos brasileiros quer que a Operação siga em frente. Agora, foi de fato um ataque, entre tantos, que a Lava Jato sofreu na sua história. Trechos de supostas mensagens foram distorcidos ou descontextualizados para produzir acusações que a realidade prova serem falsas.

Apesar do expressivo número de denúncias de condenações em primeira instância, a Lava Jato somente obteve uma única condenação no STF. A que você atribui esse fato?
Tribunais como o Supremo desempenham funções essenciais para o nosso país, mas não foram preparados para instruir e julgar casos criminais. Por isso, o foro privilegiado nunca funcionou. A primeira vez que o tribunal mandou alguém para a cadeia foi em 2013. O Mensalão foi um ponto fora da curva na história do Supremo e muito se deve à atuação diferenciada do Ministro Joaquim Barbosa. Entre os problemas, está a sobrecarga de trabalho. A corte pode limitar os casos que julga, mas tal faculdade não tem sido exercida de modo suficiente. 

Sandra Comodaro e Deltan Dallagnol. (Foto: Antonio More).

*Matéria originalmente publicada na edição #233 da revista TOPVIEW.

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