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Daniel Katz: diante das lentes do fotógrafo, todos se revelam

Quando se trata desse curitibano, 40 anos em diversas áreas da fotografia têm algo em comum: pessoas e suas histórias. Conheça a de Daniel Katz

Daniel Katz teria sido arquiteto se não tivesse se apaixonado pelas imagens. “Na verdade, as duas disciplinas são muito parecidas”, ele conta. “Tratam de organização de espaços, mas em planos diferentes.” Mais do que organizar espaços, porém, o fotógrafo curitibano revela pessoas.

Esse talvez seja o seu ponto forte, como tantas vezes mostrou em colaborações para a TOPVIEW e em veículos como Vogue Brasil, clicando de editoriais de moda a grandes chefs, arquitetos, atletas e outros: encontrar quem realmente é essa pessoa que se coloca na sua frente. E aí, quase 40 anos depois do início de carreira, tecnologia alguma faz diferença: “A fotografia está no olho, não no equipamento”, Katz resume nesta entrevista, concedida por e-mail.

Na conversa a seguir, o fotógrafo revisita sua experiência na França – trabalhando ao lado de Robert Doisneau –, fala sobre a influência das redes sociais e novas tecnologias, sobre a relação com seus personagens e histórias de bastidores, entre outros assuntos.

 “A fotografia está no olho, não no equipamento.”

“(…) foto de moda, antes de mais nada, é o retrato de um comportamento de determinado momento do nosso tempo.”

Seu primeiro curso de fotografia foi em 1979. Quais são as principais mudanças, na sua visão, sobre o assunto de lá para cá?
A principal mudança foi a passagem da fotografia analógica para a digital. Na analógica, você precisava realmente entender de fotografia e na digital, você precisa realmente entender de Photoshop. Eu achei muito interessante essa passagem, deixou o trabalho mais prático e mais livre. A fotografia está no olho, não no equipamento.

Você atua em diversos campos da fotografia – de arquitetura a moda, de retratos a publicidade. Em qual dessas áreas você sente que se expressa melhor?
Foram os retratos que nortearam toda a minha trajetória na fotografia! Primeiro os retratos pessoais e, na sequência, os institucionais e publicitários. A moda veio em consequência disso, porque foto de moda, antes de mais nada, é o retrato de um comportamento de um determinado momento do nosso tempo. E a arquitetura é, realmente, um universo que me interessa muito. Eu teria sido arquiteto se não tivesse me apaixonado pelas imagens. Na verdade, as duas disciplinas são muito parecidas, tratam de organização de espaços, mas em planos diferentes.

“Você tem que gostar das pessoas, naturalmente, para fazer um bom retrato. Você tem que ter curiosidade por elas.”

Qual foi o retrato que mais gostou de fazer? O que busca nesse tipo de imagem?
Esta é realmente uma resposta difícil, mas posso dizer que, em cada um deles, eu sempre busquei a mesma coisa: chegar a um resultado que dissesse, nem que fosse em uma só imagem (entre tantas que fazemos), quem era realmente aquela pessoa. Busco nessa dinâmica – fotógrafo e fotografado – uma atitude real, natural, verdadeira.

Você parece ter ou desenvolver uma relação de amizade com quem fotografa. O que isso diz sobre a sua personalidade?
Chegar ao melhor resultado não depende de nenhum padrão pré-estabelecido e tampouco está no suporte de uma megaprodução. Você tem que gostar das pessoas, naturalmente, para fazer um bom retrato. Você tem que ter curiosidade por elas. É interessante o universo de estúdio. De certa forma, ele cria um ambiente de mais proximidade, e a relação que você estabelece com quem fotografa determina todo o trabalho. É sempre um cenário diferente, uma luz diferente. Histórias diferentes!

Você deve ouvir muitas histórias nessas sessões. Você se sente, às vezes, como em um confessionário?
A fotografia me proporcionou ser cúmplice de histórias pessoais importantes, e os fotografados também foram cúmplices de algumas das minhas histórias. Não chamaria de confessionário, pois as pessoas não se confessam numa sessão de retratos – elas se revelam.

 

with Master Chef @ivor_lopes in studio! Changing roles!

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Como equilibra a maneira como você acha que deveria retratar o personagem com o modo que ele acha que deveria ser retratado? Como equilibra as duas percepções?
Nunca estabeleço uma relação de oposição com o retratado. Você tem que respeitar a maneira como ele se sente mais seguro para se colocar. Mas nunca deixo de tentar ir além, de fazer da forma como eu acho que deve ser feito. Nesse sentido, tenho, nas minhas demandas, pessoas que confiam totalmente no meu trabalho. Muita vezes, as melhores imagens estão [mais] nesses poucos segundos quando se tenta ir além do que nas horas que se passaram…

Quem são as suas principais referências no campo da fotografia?
A minha primeira referência fotográfica foi o americano Irving Penn, que descobri logo no começo da minha trajetória. [Ele tem] um olho extremamente sensível, de um senso estético muito apurado e ousado para sua época. [Tenho] um pouco também da influência dos humanistas franceses, como Robert Doisneau (“O Beijo do Hotel de Ville”, foto famosa), com quem eu trabalhei na agência Rapho, em Paris. Jean-Baptiste Mondino, supercriativo e trabalha superbem a cor. Difícil essa [pergunta] também, referências são sempre um pouco de muitas coisas…

O que esse humanismo francês agrega ao seu olhar e à sua técnica?
Comecei meu trabalho fotográfico fazendo fotos de rua, cenas de rua… segui com os retratos, sempre me interessei pelas pessoas e suas histórias. Ensinou-me a observar, a ter paciência, a esperar e saber o momento exato de apertar o botão, aquele momento em que até mesmo você não sentiu que prendeu a respiração e só percebe depois que fez o clique final.

Você considera o trabalho dessa geração muito distante do que se faz hoje em dia?
Não, enquanto uma estética voltada para a fotografia documental, em preto e branco, que se interessa pelo Homem e sua dignidade, é um tema sem fim.

Qual é a principal lição que guarda do tempo em que morou na França?
Meus dez anos de França estão presentes em todos os dias da minha vida depois que voltei. Influenciou muito o meu trabalho, as minhas relações com as pessoas e foi determinante na minha percepção do que gira ao meu redor.

Qual foi a última exposição de fotografia que mais te encantou?
Museu de Fotografia de Fortaleza: uma coleção interessante, importante e colocada numa arquitetura bem pensada!

Você também tem um lado mais artístico. A que ele dá vazão?
Não gosto muito dessa expressão, “lado artístico”, isso não diz nada… A questão é ter uma forma de perceber e ver as coisas de uma maneira própria. É a sensibilidade de cada um que determina um trabalho autoral.

 

Montando a luz em #katzdan_studio Beauty shoot!

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Quais questões deseja explorar na produção autoral?
Tudo o que envolve pessoas e seus universos.

E como o seu trabalho vem sendo afetado pela nova relação das pessoas com a fotografia (diz-se que, hoje, todo mundo é fotógrafo…)?
Faço um trabalho específico, que envolve criatividade pessoal, muita responsabilidade, uma exigência técnica e qualidade extremas. Brinco com os próprios clientes que eles nunca me chamam para trabalhos fáceis (risos)… Já refiz muitos trabalhos de clientes que optaram por profissionais do universo de hoje, em que todo mundo é fotógrafo, que não estavam realmente capacitados e com o conhecimento necessário.

Você tende a fotografar bastante com o celular – fazer selfies, tirar fotos de comida, da paisagem…?
Sim, faço muitas fotos com celular. É o meu jornal de bordo diário e muito pessoal. Faço selfies, acho um ótimo exercício de consciência corporal, para qualquer pessoa.

Mas acha que existe um excesso de imagens? Como lida com ele?
Sim, mas é você que determina o tempo que tem para essas imagens. Elas mesmas são efêmeras. Uma imagem na rede postada pela manhã já é “velha” no final do dia!

Como fazer algo que se destaque e que seja significativo, nesse contexto?
É o contexto que determina se é significativo. O importante é fazer algo pessoal e seguir suas intuições.

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