Cida Borghetti: a mulher mais poderosa do Paraná
Os dias no novo cargo têm sido intensos. A governadora sequer teve tempo para deixar o gabinete no terceiro andar do Palácio Iguaçu com a sua cara. Só fez pequenos ajustes. Ali, é possível ver fotos da família e uma coleção de imagens de Nossa Senhora Aparecida. “Carrego-as sempre comigo”, diz, sobre as imagens da santa. “Tenho o hábito de pedir proteção a ‘elas’ quando inicia o dia e quando terminamos o expediente, por vezes tarde da noite.” Um dos assessores nos mostrou a agenda da governadora. Os compromissos de Cida Borghetti não param: a cada 25 minutos, um evento novo.
As imagens de Nossa Senhora Aparecida não estão ali à toa. Cida é devota desde antes mesmo de nascer. Grávida de sete meses, sua mãe, Dona Ires Borghetti, envolveu-se em um grave acidente. Ela viajava entre Caçador e Porto União, em Santa Catarina, acompanhada de outros dois filhos, quando o ônibus tombou em uma curva da SC-350. Nesse momento, a mãe teria gritado: “Nossa Senhora Aparecida, nos acuda”. Várias pessoas morreram no acidente, mas Dona Ires saiu ilesa. Na mesma noite, ela deu à luz Maria Aparecida Borghetti. “Meu nascimento é um milagre e, por isso, peço sempre à Nossa Senhora que ilumine minhas decisões”, conta a governadora, de família típica italiana e a décima de 13 filhos.
“O feminismo não pode ser encarado como o contrário do machismo. As mulheres têm conquistas e há outras [conquistas a serem feitas], mas não se pode estar contra os homens.”
Cida considera que sempre esteve na política: teve as primeiras lições sobre o assunto ainda criança, com o pai, Severino. “Ele era um getulista de carteirinha e a conversa ao redor da mesa sempre foi política”, lembra Cida, que, na juventude, foi militante do PDS (Partido Democrático Social, que substituiu a antiga Arena, do Regime Militar).
“[Nós, mulheres] Temos uma sensibilidade diferente para tratar dos problemas diários da máquina pública. Um olhar mais humanizado.”
Já adulta, primeiro quis ser jornalista. Chegou a trabalhar em um programa de entrevistas, mas desistiu da carreira. Abriu uma agência de marketing político. Nessa época, era filiada ao PFL (atual Democratas) e foi nesse período que conheceu o deputado federal Ricardo Barros (PP-PR): Cida lhe ofereceu um jingle de campanha para a prefeitura de Maringá – que ele recusou. Mesmo assim, continuaram a conversar e, dois anos depois, estavam casados.
“Sensibilidade diferente”
Vinda de uma família que gostava de discutir política, trabalhando na área e casada com um dos mais sagazes articuladores do estado, ela diz que nunca imaginou chegar tão longe. “Sinceramente, não me imaginava governadora do Paraná. É uma missão que agradeço a Deus todos os dias.”
“O momento é de construir pontes. Precisamos reduzir esse distanciamento entre a sociedade e a classe política. O avanço do país depende da união de forças.”
Hoje, aos 53 anos, Cida Borghetti é a mulher mais poderosa do estado. Ela é a primeira a governar o Paraná – Emília Belinati, vice de Jaime Lerner, ocupou a cadeira interinamente – e não tem dúvidas de como a presença feminina no comando do executivo pode fazer diferença: “Temos uma sensibilidade diferente para tratar dos problemas diários da máquina pública”, avalia. “Um olhar mais humanizado.” Dá como exemplo que, logo na primeira semana, assinou a correção de uma distorção no salário das merendeiras e dos funcionários de apoio das escolas estaduais, que estavam recebendo menos que o mínimo regional.
Mas, logo depois de deixar transparecer esse olhar humanizado, faz questão de deixar claro que, além do que aponta como sensibilidade feminina, tem um currículo que mescla formação acadêmica e quase 30 anos de trajetória pública. É graduada em Administração Pública, foi deputada estadual por dois mandatos (2003-2010) e deputada federal (2011-2014) e, nos últimos três anos e três meses, foi vice de Beto Richa no governo do Paraná. “Nunca tive medo de desafios e, mais do que isso, sinto-me preparada”, diz Cida, que, se teve quase toda a carreira focada no legislativo, considera-se pronta para ser governadora. “Estou me preparando para isso há muito tempo.”
“Nunca tive medo de desafios e, mais do que isso, sinto-me preparada. Estou me preparando para [o cargo de governadora] há muito tempo.”
De cabelos, maquiagem e vestuário sempre impecáveis, Cida surfa na onda do empoderamento feminino. Fã do estilo de gestão da primeira-ministra alemã Angela Merkel, suas primeiras indicações da nova equipe são mulheres, uma delas em um ambiente em que o comando sempre foi masculino: ela entregou a direção da Polícia Militar à coronel Audilene Rocha. É a primeira mulher a dirigir a PM paranaense. No Brasil, apenas duas assumiram essa função. Já a Secretaria de Educação ficou a cargo da professora Lúcia Cortez. “Há uma mudança quantitativa e qualitativa muito importante e sentida em nosso país – uma mulher preside o STF [Supremo Tribunal Federal], outra comanda a PGR [Procuradoria-Geral da República]. Há lideranças expressivas na Câmara Federal e, no Senado, há várias executivas de grandes empresas”, avalia.
Apesar da defesa da mulher, a governadora não levanta a bandeira do movimento feminista. “É preciso ter certo equilíbrio para se analisar temas como esse. O feminismo não pode ser encarado como o contrário do machismo. As mulheres têm conquistas e há outras [conquistas a serem feitas], mas não se pode estar contra os homens. Tanto mulheres quanto homens têm direito a um mundo mais igualitário e justo.”
Questionada sobre a influência do marido na própria formação política, ela responde com elogios a Ricardo Barros, “um político de resultados” e “um dos gestores mais respeitados do país”. “Ele é um dos maiores especialistas em orçamento público e um conselheiro sempre disposto a auxiliar quem o procura”, afirma.
Vaidosa, mas prática
Apesar de ser pré-candidata à reeleição, Cida evita falar sobre campanha. Prefere focar nos projetos e nos planos de gestão dos próximos sete meses. “Nossa gestão será marcada pela eficiência e proximidade com a sociedade civil organizada”, gosta de repetir. Mas, na conversa, deixa escapar uma dica do mote da campanha: “O momento é de construir pontes”, avalia. “Precisamos reduzir esse distanciamento entre a sociedade e a classe política. O avanço do país depende da união de forças.” Nesse momento, a principal preocupação do seu grupo político é atrair apoios para uma coligação.
Com a agenda e a cabeça cheias, a governadora tenta arranjar tempo para se cuidar. Durante as pausas de uma entrevista à rádio Jovem Pan, tentava encaixar consultas com a nutróloga. “Faço questão de não descuidar de uma alimentação saudável. Para atividades físicas, confesso que ando sem tempo, o que não me deixa feliz.” O cargo, garante, não fez a vaidade desaparecer. “Gosto de cuidar da minha pele, do cabelo. Tomo bastante água e uso filtro solar [FPS] 70 ou 100 todos os dias.” Na bolsa, além do filtro solar com cor, sempre há batom, blush, rímel e delineador. “Sim, sou vaidosa. Porém, devido à dinâmica dos meus dias, sou bastante prática.” Sobre estilo, a governadora se inspira em Marisa Ribeiro – estilista que aconselha clientes a comprar menos – e conta que o look preferido é jeans, camisa branca ou rosa e um suéter amarrado no pescoço.
Outro prazer do qual não abre mão é cozinhar. “Faço sem receita, no olho. Aprendi isso com minha nonna Adele”. Ela também quer continuar guiando seu Alfa Romeo 156. “Tenho um carinho especial por ele e, sempre que posso, nessa agitada vida, gosto de eu mesma dirigi-lo”, conta. “E dirijo bem (risos)”. Mas, esposa e mãe de políticos – a filha, Maria Victoria, está no primeiro mandato como deputada estadual –, responde qual é o assunto nos almoços de domingo: “É política”, diz, com um sorriso.
Raio X
Cida Borghetti é graduada em Administração Pública pela Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul), com especialização em Políticas Públicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Em 1990, assumiu o primeiro cargo: a presidência do Provopar de Maringá. Também passou pela chefia do escritório de representação do Paraná em Brasília (1998-2000). Foi deputada estadual por dois mandatos (2003-2010) e deputada federal (2011-2014). Nos últimos três anos e três meses, foi vice de Beto Richa no governo do Paraná.
*Matéria publicada originalmente por Marc Sousa na edição 211 da revista TOPVIEW.