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Artigo: O impacto da suspensão do contrato de trabalho no 13º salário

Confira o texto de Fernanda Nigri Faria, doutora em Direito do Trabalho

O ordenamento jurídico trabalhista reconhece como hipóteses de suspensão do contrato de trabalho, as situações em que temporariamente são interrompidas as obrigações de prestar trabalho e de pagar os salários respectivos. Em tais casos, apesar de permanecer vigente o vínculo de emprego, não há contagem do tempo de serviço.

Consequentemente, tais períodos não são considerados na apuração do 13º salário.

A Medida Provisória nº 936/2020, convertida na Lei nº 14.020/2020, prevê que o empregador poderá acordar a suspensão do contrato de trabalho mediante convenção coletiva de trabalho, acordo coletivo de trabalho ou acordo individual escrito entre empregador e empregado.

A medida pode ter prazo de duração de até 60 dias, fracionável em dois períodos de até 30 dias. Respaldado na referida lei, o Decreto nº 10.422/2020, admite a prorrogação por até mais 60 dias, de modo a totalizar até 120 dias, ainda que de forma não contínua.

Durante a suspensão, o empregador deve manter os benefícios que concedia e o empregado pode contribuir para o Regime Geral de Previdência Social como segurado facultativo, caso tenha interesse no cômputo desse período em eventual e futuro requerimento de aposentadoria.

Independentemente de tais aspectos, trata-se de típica hipótese de suspensão do contrato de trabalho, na qual não é devido o pagamento do salário nem há contagem do tempo de serviço para fins contratuais, o que afeta outros direitos. Enquanto durar a suspensão, não será devido o recolhimento de Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Tampouco será considerado tal período para apurar o 13º salário e as férias.

O 13º salário é uma parcela apurada à razão de 1/12 avos da remuneração do mês de dezembro, por cada mês de serviço do ano correspondente. A fração igual ou superior a 15 dias é equiparada a um mês para aferir a proporção a ser paga. Além disso, a base de cálculo deve considerar a média dos pagamentos variáveis, tais como horas extras e comissões, devidos entre 1º de janeiro e 31 de dezembro.

Portanto, se adotada a suspensão, deverão ser desprezados os meses em que não se verificar a contagem de tempo de serviço por pelo menos 15 dias.

Assim, a título exemplificativo, caso seja constatado em dezembro de 2020, que o pacto laboral esteve vigente em todos os meses, mas houve a suspensão do contrato de trabalho por 30 dias no mês de julho, a proporção do 13º salário devido será de 11/12 da remuneração.

Mantidos os mesmos parâmetros, alteradas apenas as datas, de modo a considerar como iniciado o período de suspensão em 16 de julho e findo em 14 de agosto, a proporção do 13º salário de 2020 será diferente. É preciso ressaltar que mesmo na possibilidade de que a suspenção no segundo exemplo também seja de 30 dias, em nenhum mês o tempo de serviço a ser considerado será inferior a 15 dias.

A suspensão do contrato de trabalho impõe ao trabalhador um sacrifício maior do que pode aparentar. A perda se verifica de forma cumulativa, podendo impactar o valor do 13º salário e provocar reflexos no FGTS.

Tais aspectos também evidenciam como a pandemia é utilizada como catalisadora do processo que abala as estruturas e princípios do Direito do Trabalho, deslocando o elemento central da proteção.

Sob o discurso de que não haveria outro meio para a preservação das empresas, tem se concretizado o esvaziamento de direitos e garantias fundamentais, em sentido oposto ao da inclusão regulada e protegida do trabalhador no mercado. Essa situação potencializa os contornos de mercantilização do trabalho humano e distancia cada vez mais a sociedade de um ideal de justiça social.

*Escrito por Fernanda Nigri Faria, doutora em Direito do Trabalho, professora da Faculdade de Direito Milton Campos e advogada do Andrade, Nigri & Dantas Sociedade de Advogados

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