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Beleza natural e consciente: como aderir ao movimento slow beauty

Conversamos com Melissa Volk, criadora de um evento nacional que debate o mercado do slow beauty

Vários setores estão repensando suas práticas, matérias-primas e processos, tudo para ser mais sustentável e menos agressivo ao meio ambiente. A área da beleza é uma delas. Quem puxa essa tendência é o chamado slow beauty, um movimento que tem como pilares a sustentabilidade, saúde e consumo consciente.

A onda slow atingiu vários mercados – no da beleza propõe um olhar mais gentil a respeito do autocuidado, tendo em mente como isso impacta cada pessoa e seu entorno. É aplicar o minimalismo e perceber que, em mais um caso, menos é mais. Dados do relatório da Grand View Research, divulgado em 2018, mostram que o mercado de cosméticos naturais e orgânicos irá movimentar 25,11 bilhões de dólares até 2025. Por aqui, já movimenta cerca de três bilhões de reais, com potencial de crescimento de 20% ao ano. E a tendência é  global: o setor de cosméticos orgânicos movimenta cerca de US$ 9 bilhões em todo o mundo, o que representa 2% do mercado total, aponta estudo da Organic Monitor.

Foi para divulgar esse movimento que a publicitária Melissa Volk criou o Slow.Market.Beauty, um evento que une marcas com essa proposta a consumidores interessados. O projeto nasceu em São Paulo, em 2016, e já está na quarta edição, realizada neste mês em Florianópolis. Foram três dias de conteúdos sobre beleza natural, orgânica, vegana e cruelty free.

Em entrevista à TOPVIEW, Melissa Volk aponta os caminhos para aderir ao movimento e afirma que os brasileiros estão cada vez mais interessados em repensar seus hábitos de beleza.

Como cuidar da beleza de forma consciente? 

A consciência começa em saber o que é bom para seu cabelo, pele, e respeitar seus traços, suas características, sua natureza. É começar sendo gentil consigo em frente ao espelho. A partir daí, ver quais produtos de beleza você realmente precisa, o que de fato irá usar, e começar a substituir os produtos convencionais por produtos livres de químicos nocivos, aos poucos. É legal fazer essa transição de forma natural. 

O ideal é começar a substituição pelos produtos de uso diário: desodorante, sabonete, creme dental, shampoo e condicionador. Dar preferência a produtores locais, naturais, orgânicos, livre de crueldade [com os animais]. [Uma dica é] consumir produtos que ofereçam refil ou de empresas que praticam a economia circular, além de descartar corretamente os frascos dos que acabaram. Quando começa com um respeito a si mesma em frente ao espelho, esse respeito se reflete em todo o consumo, até no descarte. Parece muita coisa, mas tudo está conectado e acaba sendo automático.

slow beauty
Melissa Volk, criadora do Slow.Market.Beauty. Foto: divulgação.

Qual é o impacto de escolher um produto que faça parte da slow beauty? 

Impacta positivamente a saúde; a economia, por incentivar pequenos produtores e empreendedores consciente; o meio ambiente, pois deixamos de despejar pelo ralo um monte de química nociva, que chega aos animais, às plantações e que volta para nós.

É um segmento que está crescendo e é tido com uma tendência para este ano. Qual o próximo passo? 

O slow beauty deixou de ser tendência para ser uma realidade crescente no mundo todo. O aparecimento de diversas marcas e de um consumidor mais atento e exigente impacta nas grandes corporações, que passaram a pesquisar e substituir ingredientes em suas formulações e pararam de fazer testes em animais. Isso também impacta a indústria de insumos, os fabricantes de matéria-prima, o que impacta o setor de embalagens, que está em busca de soluções biodegradáveis e mais ecológicas. É um efeito dominó em toda a cadeia da indústria de beleza. É um caminho sem volta.

“O primeiro passo é o próprio governo entender que é um baita mercado e que pode gerar muita riqueza para o nosso país.”

 Como é o cenário brasileiro no segmento?

O Brasil está em pleno crescimento neste setor. Ainda é pequeno se comparado aos mercados europeu e americano, mas, justamente por esse motivo, o crescimento para os próximos anos é bem significativo. Segundo o relatório da Grand View Research, divulgado em 2018, o mercado de cosméticos naturais e orgânicos irá movimentar 25,11 bilhões de dólares até 2025. No Brasil, o setor já movimenta aproximadamente 3 bilhões de reais, com potencial de crescimento de 20% ao ano até lá. Isso também já reflete no aparecimento de salões de beleza e estética com propostas mais sustentáveis, desde a escolha dos produtos usados até práticas de reciclagem. 

Nesta última edição do Slow Market.Beauty em Floripa, as marcas de produtos profissionais representaram 15% dos expositores. Houve muitas oportunidades de negócios com pessoas querendo representar os produtos em regiões próximas, donos de salões procurando opções mais naturais e botânicas. A gente passa da venda de produtos para consumidores finais para toda uma cadeia de profissionais mais conscientes.

Qual é o maior desafio no crescimento do slow beauty por aqui? Os brasileiros estão dispostos a repensar os hábitos de consumo na beleza?

Nossa legislação é o principal desafio hoje. Além de ser caro para o pequeno produtor registrar todos os produtos na Anvisa, a Anvisa também não reconhece cosméticos orgânicos, essa categoria não existe. Então o primeiro passo é o próprio governo entender que é um baita mercado e que pode gerar muita riqueza para o nosso país. Temos uma biodiversidade incrível e empreendedores com vontade e conhecimento. 

Rotulagem também é um desafio. Hoje podemos falar que o produto é natural ou ter a palavra orgânica no nome sem ter ingredientes orgânicos ou uma quantidade significativa de ingredientes naturais. O greenwashing [termo em inglês que indica a apropriação de um discurso sustentável apenas pelo marketing, sem ter ações de verdade] acontece mesmo, mas deveria ser proibido certos apelos nas embalagens e rótulos se o produto não entrega aquilo, porque é novo para muitos consumidores – e eles acabam comprando algo achando que é mais saudável e não é. 

Muitos brasileiros estão, sim, dispostos a mudar seus hábitos. Mas ainda falta informação, opções de lugares físicos para as pessoas testarem os produtos. Cosméticos são pura experiência sensorial e acaba dificultando encontrar apenas em e-commerce e market places, porque falta o sensorial. Este é um dos motivos [da criação] do Slow Market.Beauty: fazer com que o consumidor teste e converse com quem produz para tirar suas dúvidas, adquira conhecimento e tenha mais segurança na hora de comprar um produto online. Obviamente tem gente que não quer repensar, quer seguir com quick fix, padrões estéticos… mas isso sempre irá existir em qualquer lugar do mundo. 

“O que acontece com alimentos há alguns anos está acontecendo com cosméticos. As pessoas estão lendo rótulos.”

Como você vê a preocupação do consumidor pela forma como seus produtos são produzidos? 

O consumidor está cada vez mais atento e exigente. Ele passou a ler o contra rótulo para ver o que tem dentro do produto. O que acontece com alimentos há alguns anos está acontecendo com cosméticos. As pessoas estão lendo rótulos. E isso faz a indústria toda se movimentar. O poder do consumidor é enorme.

Quem é o público que mais consome essa tendência?

O público vegano impulsionou fortemente essa indústria e pessoas que se preocupam com alimentação mais natural e qualidade de vida. Pessoas com alergias ou algum tipo de doença de pele, couro cabeludo e cabelo também buscam opções naturais.

O que levar em consideração na hora de escolher um produto de beleza? 

Seu tipo de pele, cabelos, cidade, clima e estilo de vida. Não adianta querer usar o da influenciadora x, y ou z. Cada um tem uma idade, um tipo de pele, um cabelo. Mora em lugar mais seco, mais úmido, as condições variam. Influenciadores podem ser um ponto de partida, uma referência, uma inspiração, mas só a pessoa sabe o que de fato funciona para ela.  

Qual é a sua dica para quem quer aderir ao movimento?

Comece pesquisando. Pesquise, pergunte, teste. Depois comece a substituir os produtos que vão acabando, os de uso diário. E não desista, porque pode ser que a primeira compra não seja boa para o cabelo ou pele, por exemplo. Existem diversas marcas e produtos hoje em dia. Se não funcionou um, outro poderá funcionar. Se for o caso, é só presentear um amigo ou um familiar, que poderá se adaptar com aquele produto e espalhar essa consciência. Vale lembrar que testamos diversos shampoos e condicionadores convencionais até acharmos o ideal para nós também – o mesmo acontece com os naturais. É um mito dizer que shampoo natural deixa os cabelos pesados e sem vida, tem produtos excelentes. Tem que testar.

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