Qual a idade para se vestir sozinho?
Desde muito pequena, minha filha Olivia gosta de escolher o que vai vestir. Começou demonstrando preferência por algumas roupas específicas e, com o tempo, foi tentando vestir camisetas, saias e tênis. Hoje, aos três anos, adora explorar o guardaroupa, fazer combinações e vestir o look completo. Escolher as próprias peças e se vestir sozinha talvez sejam um dos primeiros exercícios de autonomia da criança, que pode liberar sua criatividade e demonstrar sua individualidade.
Autonomia e desenvolvimento
Mais cedo ou mais tarde, mães e pais se deparam com esse momento considerado essencial no desenvolvimento da criança. O incentivo é fundamental para que o filho sinta que é capaz e tenha liberdade para explorar. Mas, além de encorajar, que medidas práticas pais podem tomar para apoiar os filhos, respeitando clima e ocasião
Marcos Piangers, autor do best-seller O Papai é Pop (L&PM), é pai de Anita, 11, e Aurora, 4. Como incentivo, ele recomenda deixar tudo ao alcance das mãos. “Uma das coisas que a gente fez foi colocar todas as roupas numa altura acessível. O que acontece é que [a criança] acaba explorando e tendo mais autonomia”, explica o também palestrante de criatividade, tecnologia e paternidade.
Para a psicóloga Karlla Beatriz é fundamental para a criança conhecer o próprio corpo e sua relação com o mundo. Ela cita a psicanalista de crianças e pediatra francesa Françoise Dolto, que fala sobre o quão indicativo de saúde mental é elas se vestirem, demonstrarem autocuidado com o corpo. A filha de Karlla, Mônica, de três anos, tem liberdade para vestir roupas de babado, brilho ou princesas porque a mãe considera importante a própria criança decidir.
“Entendo que ela está exercitando a sua autonomia e penso no que isso significa para o seu desenvolvimento”, comenta a psicóloga. Deixar Mônica livre para escolher as roupas trouxe surpresas para Karlla, que percebeu como a filha é vaidosa: “Nunca cultivamos muito esse valor. Então comecei a entender que se vestir como princesa, usar só roupa rosa, era algo dela, da cultura, que transpassava a educação familiar”.
Super-herói dia e noite
Demonstrar sua individualidade e suas preferências ao se vestir sozinho pode esbarrar em uma situação bastante comum: a criança só quer vestir a roupa preferida, independentemente do clima ou da circunstância. “Faz parte. Lembro que gostava de uma fantasia do super-homem e só queria vestir isso. Minha mãe tinha que esperar eu dormir para tirar”, recorda Piangers sobre sua infância.
“É natural e de uma fase específica. Com o tempo, as crianças vão entendendo [como] se vestir adequadamente.” Respeitando a vontade da filha, Karlla diz que costuma apenas negociar aquilo que é adequado ao clima e à ocasião. “O mais difícil é deixar o pé quentinho em dias frios. Às vezes ela quer andar só de meia ou de sandália”, conta.
Primar pelo conforto, enfim, é fundamental. “Uma criança que corre e brinca é feliz. Uma criança que está parada porque colocou um vestido muito apertado ou arrumou demais o cabelo, e não permite que ela se divirta, é desperdiçar esse período de tempo infantil tão encantador, divertido, inventivo, exploratório”, afirma o autor de O Papai é Pop.
“Cor de menina, cor de menino”
Mesmo que não seja incentivado em casa, as divisões de cores como o azul “de menino” e o rosa “de menina” podem surgir. Marcus Piangers, que se tornou referência ao palestrar e escrever sobre paternidade, diz que quando as crianças começam a entender o que é divisão de gênero (geralmente na escola), a forma mais fácil de explicar é por meio das cores.
Para o autor, entretanto, essa é uma divisão limitadora, que “pode evoluir com uma conversa que leve a explorar novas cores e outras formas de se vestir”. Piangers lembra um amigo de cinco anos de sua filha Aurora, apaixonado por usar vestidos: “Ele joga futebol, sobe nas coisas, se suja todo de vestido, mas é o que gosta de usar”, analisa. “É engraçado e ao mesmo tempo libertador.”
Na galeria acima, você confere uma vitrine de roupas sem gênero.
*Matéria escrita por Paula Melech e publicada originalmente na edição impressa número 201, julho de 2017.