Sandra Kanayama: elegância em vermelho
Bottega. A palavra, que em italiano significa loja, denomina o espaço da marca de Sandra Kanayama. A estilista nascida em Curitiba, descendente de japoneses, completou sua formação em Moda no Instituto Marangoni, em Milão – amálgama cultural que se fez bagagem de um estilo e personalidade sólidos.
Sandra nos recebe vestindo sua alfaiataria de corte impecável, um visual formal o suficiente, mas com a descontração do sorriso fácil, emoldurado pelo batom que é considerado sua marca registrada. “Eu comecei a usar batom vermelho quando morei na Itália e vi que combinava com o meu cabelo, com a minha pele”, lembra, ponderando: “Acredito que seja minha marca registrada mais porque as pessoas veem dessa forma. Mas não sou fiel a nenhuma marca.” No dia da entrevista era um da linha japonesa Shu Uemura, mas os batons vão de M.A.C a Chanel.
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Para quem já viu seu pai, soa natural que o advogado tenha sido a primeira influência de Sandra no universo da moda. “Normalmente são as mães ou as avós, mas no meu caso foi meu pai”, conta. “Ele comprava Elle, Vogue quando eu tinha 13 anos de idade. Ele que me introduziu nesse mundo e me ensinou esse amor pela moda e pelos tecidos.” Por esse motivo, no momento em que Sandra decidiu mudar o rumo profissional, mesmo tendo terminado a faculdade de Direito e desistindo da carreira jurídica já traçada pelo pai, ela teve total apoio da família. “Foi difícil, mas eles estavam do meu lado e hoje em dia são superorgulhosos. Meu pai é um incentivador”, avalia.
E a mudança de profissão se transformou em mudança geográfica. Sandra descobriu seu destino em Milão: “A oportunidade de estudar fora do Brasil é a de vivenciar outras realidades”, explica a designer, que trabalhou na Max Mara, fato que relaciona com a construção de sua personalidade estética.
A essa herança italiana, Sandra junta suas demais referências e, hoje, se denomina uma marca clássica-contemporânea – perfil de suas clientes também: uma estética sóbria, bem cortada, que não caia num lugar comum da formalidade e seja atemporal. Em seu atelier, além das peças prêt-à-porter, a designer atende as clientes com confecção sob medida. E os casacos de alfaiataria – peças-chave de suas coleções, junto aos cocktail dresses – são feitos na Itália. Imaginando um cenário de expansão, Sandra acredita que apostaria em lojas próprias, afinal, uma multimarcas poderia não comportar a essência de suas peças.
Dentre ícones de moda, ela destaca Armani, pela relevância fora do universo fashion, com suas floriculturas, cafés e hotéis, e Carolina Herrera. Apesar dessa admiração, as homenagens no seu dia a dia são para pessoas próximas. Isso porque suas criações são nomeadas de acordo com quem Sandra conhece e respeita, como amigas, sua avó, mãe e clientes. “Hoje em dia tudo é tão rápido que você tem que cuidar das clientes”, observa. “É uma forma de agradecer quem consome a marca e grandes mulheres que admiro.”.
Reencontro consigo
A todo esse mix, Sandra acrescenta sua recente viagem ao Japão. Nessa primeira vez no país, ela diz ter se encontrado de forma muito intensa. “Realmente, é outra realidade. Eu consegui aprender, entender muito da minha personalidade”, conta. “Tem muito a ver com a ligação do corpo com a mente, parece que está no DNA mesmo.”
Com todas as diferenças da moda e na forma de se vestir lá e aqui, Sandra já consegue vislumbrar muito da influência oriental em seu trabalho, principalmente em peças mais minimalistas e nos recortes. “A alfaiataria tem a ver um pouco com a minha ida para a Itália, um pouco com a advocacia e com a minha ida ao Japão também. É uma mistura”, diz.
Sem barreiras geográficas, a estética da marca reflete muito a da própria criadora. A elegância que percorre as coleções faz parte de um jeito de ser, e quando perguntada sobre o significado dessa característica, ela explica: “Vai além da roupa. Em primeiro lugar, é ser educado e gentil. É a forma de tratar, depois de vestir”.
5 dicas de Milão por Sandra Kanayama
10 Corso Como
Loja, livraria, café e galeria de arte. O espaço é um lugar completo e o sonho de Sandra, se um dia investisse em algo semelhante no Brasil. Na galeria sempre há mostras fotográficas e, na livraria, “dá vontade de comprar todos os livros, tem uma seleção incrível”, comenta.
Villa Necchi Campiglio
Fora dos roteiros mais turísticos da cidade, a Villa hoje é um museu, mas pertenceu a uma família abastada, e a suntuosidade do local chama a atenção. É possível fazer um tour e tem um café ao lado. Uma curiosidade é que o filme I am love, com Tilda Swinton, se passa na casa.
Teatro Alla Scala
Assistir a uma ópera no teatro, com uma das melhores acústicas do mundo, é um programa de destaque.
Spontini
A rede de pizzarias, com unidades em vários locais da cidade, tem apenas dois sabores. É uma pizza alta, vendida em pedaços, com ingredientes de qualidade e a massa típica italiana.
Fondazione Prada
O museu é forte indicação de Sandra: apenas pela arquitetura (de Rem Koolhaas) já vale a visita. Por lá, procure o Bar Luce, que teve a decoração projetada pelo cineasta Wes Anderson e propõe uma revisitação dos bares milaneses da década de 1950.
[texto publicado originalmente na edição impressa número 4 do TOPVIEW Journal, agosto de 2017]