FASHION MODA

ESPECIAL IA: a moda é inteligente

Mais uma vez, a moda se torna vanguarda e abraça as novas tecnologias, como a inteligência artificial

Lembra aquele dia em que o Papa Francisco usou uma jaqueta puffer branca? Esse dia foi inesquecí- vel, não é? Só tem um porém: esse dia nunca existiu e a imagem do sacerdote usando essa marcante peça de roupa foi, na verdade, criada por meio de inteligência artificial.

A imagem, feita por Pablo Xavier na ferramenta MidJourney, foi tão convincente que chegou a enganar até mesmo alguns veículos de imprensa, que publicaram a foto como sendo verdadeira – e não apenas uma criação artística do construtor civil que faz trabalhos artísticos nas horas vagas.

Para criar uma coleção de 15 looks,
Guilherme gerou mais de 1.500 imagens.

Feita apenas para uma brincadeira, a imagem reforçou uma discussão que crescia sobre a IA e seus impactos também no mundo da moda. Uma roupa criada por essa tecnologia também é uma peça digital – assim como os NFTs e os 3Ds. A diferença, porém, é que essas peças são produzidas, literalmente, por meio de um computador e de uma base de dados.

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Para isso, no caso do MidJourney – que vem sendo o mais usado por esses artistas –, é preciso descrever, em uma frase, o que a máquina precisa gerar. A partir disso, é possível gerar editoriais de moda (o que a TOPVIEW fez nesta edição), campanhas com modelos digitais e até criar coleções inteiras de roupas.

Foi nesse mundo que Guilherme Duque, estilista de 37 anos, começou a ter contato com a IA. Designer de moda, ele trabalhou com roupas durante boa parte de sua vida. Desenvolveu seu trabalho no mercado das noivas e chegou até a criar uma marca própria no segmento.

Apesar de bem-sucedido, esta não era mais uma posição que lhe despertava a criatividade. Isso fez com que o estilista fechasse seu ateliê e começasse a trabalhar na marca de luxo Gucci, em São Paulo. Porém, o resultado também não o deixava 100% feliz. “Da mesma forma que eu não trabalhava a criatividade no ateliê, no varejo muito menos. Aprendi muito sobre mercado de luxo, tive experiências maravilhosas com viagens pelo mundo, mas não desenvolver meu lado criativo fez com que eu tivesse um burnout”, relembra.

Aria, a avatar criada por Guilherme
Duque, usando sua
coleção para a Shop2gether.

Foi em um momento de autoconhecimento que o estilista procurou novos rumos dentro da criação e conheceu o Brazil Immersive Fashion Week (BRIFW), uma plataforma de fomento à cultura latino-americana na Web 3.0. Lá, ele fez um curso sobre metaverso e, ao realizar seu projeto de conclusão do curso, desenvolveu uma avatar que fosse diferente das brasileiras Lu, do Magazine Luiza, e Satiko, da influenciadora Sabrina Sato.

Sua ideia deu tão certo que, junto a uma equipe de desenvolvedores 3D, criou a Aria Phenix, uma avatar influênciadora digital.

Com a recente visibilidade, a Aria foi convidada pela marca Shop2gether para criar uma coleção digital com peças de jeans “usadas”. Guilherme criou os looks por meio de inteligência artificial e, depois, uma equipe os transformou em peças 3D, para que pudessem ser provadas digitalmente pelo público. “A marca, que apoia estilistas autorais anualmente, queria colocar um viés mais digital na ação e nos chamou para fazer essa coleção”, explica.

Em uma publicação em seu Instagram, a avatar publicou: “Minha coleção para a @shop-2gether foi pensada para transformar peças de jeans em novas criações cheias de estilo e sustentabilidade. Dando vida nova a calças antigas, jaquetas desgastadas e shorts esquecidos, cada peça é única e carrega uma história de moda consciente.”

O sucesso da coleção incentivou o estilista a se aventurar cada vez mais nesse universo e, assim, ele e Aria chegaram entre os 10 finalistas da primeira semana de moda de Inteligência Artificial do mundo, a AI Fashion Week. “Foram mais de 400 coleções inscritas, criadas por designers do mundo todo.”

Para sua primeira semana de moda digital, Guilherme e Aria criaram uma coleção inspirada no Rio de Janeiro, com muitas peças em algodão e renda. O desafio, no entanto, foi manter a consistência de tantas imagens, já que a IA gera opções diferentes do que foi pedido, o que torna difícil manter o conceito intacto de uma coleção de roupas. “Para criar uma coleção de 12 a 15 looks, eu levei uma semana trabalhando todos os dias, na tentativa e erro. Foram geradas 1,5 mil fotos para sair uma coleção de 15 looks”, revelou.

IA como ferramenta do estilista

Apesar de o trabalho de Guilherme parecer simples, nada teria sido feito caso ele não tivesse conhecimento de moda. Para o futuro, o pro¡ssional vê que essa tecnologia será uma grande aliada dos designers, que, segundo ele, não perderão espaço para os criadores que não possuem know-how na área.

“Caso as peças criadas pela IA sejam confeccio- nadas no mundo real, é importante que a pessoa que está construindo aquilo tenha conheci- mentos técnicos. É preci- so ter cuidado porque a IA gera algumas peças que não funcionam fora do digital e a pessoa precisa ter conhe- cimento de moda para entender sobre modelagem e caimento de tecidos”, conclui ele.

*Esta matéria faz parte de um especial sobre Inteligência Artificial na edição #277

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