Faça chuva ou faça sol
Há quem diga que, em Curitiba, gastronomia e espaços ao ar livre não combinam e que são, inclusive, ideias opostas. Contudo, a capital mais fria do Brasil tem mostrado que outro famoso ditado é verdade: “os opostos se atraem”.
Com a pandemia, o que já era uma tendência de urbanização local – boa parte influenciada pela gestão de Jaime Lerner e pelos cafés europeus – tornou-se uma necessidade para manter os empreendimentos gastronômicos abertos e lucrativos.
Na capital paranaense, bares, restaurantes, confeitarias e cafés podem colocar mesas e cadeiras na calçada. Essa possibilidade está prevista na Lei 9.688/1999 e no decreto 1.737/2005, mas exige que o estabelecimento tenha o alvará de licença na Secretaria Municipal do Urbanismo e pague taxas anuais.
Além disso, os donos dos estabelecimentos devem seguir algumas regras, como não bloquear a passagem de pedestres e respeitar o recuo das calçadas.
Cidades como São Paulo (SP) e Maringá (PR) também permitem o uso das calçadas por estabelecimentos comerciais mediante um alvará e algumas taxas.
Já considerada uma “instituição” em Curitiba, a trattoria e panificadora Marcolini foi um dos primeiros estabelecimentos a adotar a prática, na região do Batel.
“Naquela época [em 1996], quem era governador do estado era o Jaime Lerner. Ele foi um grande incentivador para colocar as mesas para fora e abriu as portas para mim na Secretaria de Urbanização na época em que nem existia lei para isso. O Jaime queria trazer o ar parisiense de comer na calçada para cá”, diz o proprietário do local,
Fabiano Marcolini.
Nascido em Ribeirão Preto (SP), o empresário adotou a capital mais fria do Brasil como seu lar
e conta que tem muito carinho por seu espaço na rua, apesar das dificuldades: “Para dar estabilidade às mesas, fui um dos primeiros a colocar petit pavê na cidade. Era caríssimo na época”.
Ele não se arrepende da decisão e revela que, inclusive, as vendas de champagne são maiores para os clientes que optam por sentar do lado de fora. “As pessoas que sentam na área externa vão para curtir um sol, ver as pessoas, ler um bom livro e estar com os pets. A calçada é um espaço democrático, mais informal, mas a excelência da comida é a mesma”, ressalta Marcolini.
Segundo Luciano Bartolomeu, diretor geral da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes do Paraná (Abrasel-PR), o uso das calçadas não é benéfico somente para os comerciantes como, também, ajuda no desenvolvimento da cidade como um todo.
“Gostamos de estar na rua – e os estabelecimentos ajudam a criar um ambiente mais seguro. Com o comércio, a calçada tende a ficar mais ocupada, mais bem iluminada, e cria-se um senso de comunidade com os vizinhos. Isso é bom para o cliente, para o pedestre e para os donos de comércio”, aponta.
Em Curitiba, a maioria dos espaços com mesas nas calçadas está localizada no Centro e na região do Batel – com destaque para a Rua Prudente de Morais, atualmente.
Entre os estabelecimentos que permeiam a região, está o Chinchu Bar y Parrilla. Nascido e criado no Rio Grande do Sul, seu proprietário, Afro Júnior, quis trazer suas memórias afetivas do churrasco para o Paraná.
Ele concorda que os benefícios de ocupar as calçadas refletem na cidade e em seu empreendimento. Segundo ele, 50% do faturamento do restaurante vem da área externa.
“As pessoas querem lugares abertos. A rua deve ser um incentivo – e não um fator limitador. Na hora de fazer a reserva, tem gente que faz questão de pedir uma mesa aqui fora. Você cria uma relação diferente com o cliente, estabelece proximidade, afetividade, e conhece melhor até seus vizinhos. Ter gente para ir à rua e explorar os espaços públicos é bom para qualquer cidade”, finaliza.
*Matéria originalmente publicada na edição #264 da revista TOPVIEW.