Modernista há 100 anos
Escrever sobre o Lolô Cornelsen me soa familiar. A proximidade entre os Cornelsens e os Daitzchmans, família da Berenice, minha mulher – com muitos casos e histórias –, sempre foi grande e multifacetada. Nas gerações seguintes, novos laços se formaram e novas colaborações estão sempre surgindo. Não tive o prazer de conhecer o arquiteto, mas é famosa a sua personalidade vulcânica e inovadora.
Sua obra, extensa e importante, tornou-se fundamental para a nossa história. Modernista raiz, já em 1945 projetava a casa Nelson Justus, com sua ousada planta, que contornava um pátio e um pórtico modernista, certamente muito rejeitada e incompreendida na época, o que nos lembra Baudelaire com sua máxima: “épater la bourgeoisie”. Se bem que, desconfio, Lolô não estivesse muito preocupado em estender pontes para uma sociedade ainda bastante conservadora, desinformada e pouco afeita a inovações. Apenas fazia o que a sua convicção determinava e o que sabia ser a coisa certa a ser feita.
Em 1946, projetou a sua residência, amorosamente batizada com o nome de sua esposa, Cleuza Cornelsen, que viria a ser uma de suas residências mais elegantes, toda branca, com espaços delimitados por paredes raiadas e arqueadas em planta. Contava, ainda, com um mural de azulejos na fachada principal e era gentilmente sustentada por pilotis. Fragilidade esta impiedosamente explorada por seus últimos proprietários, que a derrubaram com uma única bolada de ferro, quebrando seus delicados apoios. Foi substituída por mais um destes prédios vulgares, com fonte e estátua baratas na entrada.
Todo o nosso patrimônio modernista está ameaçado, seja pelo próprio poder público – na maior parte do tempo, insensível – ou pela falta de leis que viabilizem a sua preservação. As residências são as mais ameaçadas e o principal ônus de sua conservação não deve recair sobre os proprietários que um dia fizeram a coisa certa, contratando os melhores arquitetos, mas, sim, em leis e benefícios que tornem mais vantajosa a manutenção do que a demolição de um patrimônio que, afinal, pretende-se de todos.
Explosão de Inovações
Por: Guilherme de Macedo, arquiteto e urbanista formado pela UTFPR com MBA em Incorporações e Negócios Imobiliários pela FGV e em Cidades Responsáveis pela IMED. Atua como diretor-executivo da Lona Group.
Ao olharmos para a arquitetura produzida por Lolô nas décadas de 1950 e 1960, podemos perceber o quanto ele foi inventivo. Projetos inovadores como as residências Belotti, Axelrud e Henrique Wolf apresentam construções que envelheceram muito bem com o tempo e seguem como destaque na paisagem curitibana. A residência Cleuza, construída em 1949, não teve a mesma sorte, apesar de ser considerada um marco da arquitetura moderna – acabou demolida em 1999 e, hoje, faz falta.
Para compreender a imensidão de Lolô, é preciso compreender sua trajetória e seus grandes feitos. Amante dos esportes, praticou diversas modalidades. Como jogador profissional foi campeão pelo Athletico Paranaense no ano de 1945 em uma final de três partidas contra o Coritiba. Criou o símbolo do clube quando desenhou as letras “CAP” no estilo gótico. Fundou uma fábrica de móveis modernos quando os que existiam não atendiam às suas ideias. Concebeu o estádio do Couto Pereira, com várias lojas e serviços, quase como uma dessas arenas de hoje em dia. No
Passeio Público, fez uma das construções modernistas mais belas – que, infelizmente, não figura mais lá. Atravessou o oceano e foi a Moscou representar o Brasil em um congresso internacional.
Próximo ao governador Moysés Lupion, liderou projetos de alto interesse para o Paraná, como a Rodovia do Café e o ferry-boat no litoral. Projetou autódromos como o de Pinhais, o de Jacarepaguá e o de Estoril. Neste último, Senna ganhou sua primeira corrida pela Lotus. Inventou a caixa de brita. Projetou inúmeros hotéis e complexos turísticos pela África e Europa. Inventou o elevador panorâmico. De volta ao Brasil, na década de 1970, queria transformar estradas em rios com as hidrovias do Ivaí e Iguaçu – ideia que trouxe do velho continente e que funcionava por lá. Imaginou resorts e campeonatos de golfe consolidando um tripé turístico entre Foz do Iguaçu, Prudentópolis e o litoral, quase como uma Cancún que surgiu tempo depois.
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*Matéria originalmente publicada na edição #264 da revista TOPVIEW.