Você já foi à Rússia? O jornalista Yuri Al’Hanati já e mostra o que fazer no enigmático e esplendoroso país
Viajar para a Rússia é visitar uma história cujos diferentes períodos se justapõem. Os palácios dos czares e a suntuosidade arquitetônica do século 19 misturam-se às obras soviéticas, de mosaicos comemorativos da época de Stalin, passando por prédios funcionais do Regime Kruschev e desaguando nos gigantescos monumentos do georgiano Zurab Tsereteli, construídos recentemente a pedido do presidente Putin. A Copa do Mundo de 2018 pode ser a oportunidade para muitos turistas brasileiros conhecerem o que já foi o centro de uma união de repúblicas que, durante boa parte do século 20, amedrontou o Ocidente e, hoje, após o fim do bloco socialista, abre-se à visitação e investe pesado no turismo.
Com mais da metade da população vivendo na parte europeia do país, a Rússia é representada por suas duas cidades mais importantes, Moscou e São Petersburgo, que alternaram o posto de capital ao longo da história recente. Enquanto Moscou concentra tudo aquilo que se espera de uma clássica cidade russa – como o imponente Kremlin e parques importantes, como o Gorki e o VDNKh, um antigo centro de comércio entre as repúblicas soviéticas –, São Petersburgo se aproxima mais da visão europeia de Rússia do czar Pedro, o Grande. Arquitetura francesa e urbanismo holandês misturam-se em canais, pontes e longos quarteirões de prédios baixos e antigos. Ela também reúne as atrações mais interessantes, como a Catedral Ortodoxa do Sangue Derramado e o belíssimo museu do Hermitage, que era o antigo palácio de inverno da família real russa e hoje possui um acervo comparável ao do Louvre, em Paris. Outros palácios de tirar o fôlego, como o Peterhof e o de Catarina, dão provas a seus espectadores do luxo em que vivia a nobreza durante a época do Império.
Já a parte da história soviética se concentra em Moscou. Galerias de arte soviética, como a Tretiakov e o Instituto de Arte Realista Russa, e um sem-número de prédios e praças destinados a lembrar a herança comunista do país – para não falar da tumba do revolucionário Vladimir Lênin, mumificado no Kremlin para quem quiser ver – dão provas de que a memória do povo russo e de seu passado recente é muito estimada, mesmo que, lado a lado com a foice e o martelo, o mercado de luxo em Moscou prospere. Joias de âmbar, vodcas de grife e o famoso caviar negro fazem a intensa circulação de rublos na capital.
Tudo isso resulta em um país complexo e de difícil leitura à primeira vista, e a frieza do povo russo, embora não seja estranha ao turista curitibano, não facilita muito as coisas. Mas o viajante que se dispuser a olhar a grande nação russa sem tentar resumi-la terá para si o prazer de uma jornada inesquecível por um país tão enigmático quanto esplendoroso.
Aviso aos navegantes:
Aprenda o alfabeto cirílico: a Rússia ainda é um país pouco preparado para recepcionar turistas estrangeiros: poucas pessoas falam outra língua além do russo e, se textos alternativos em inglês estão se proliferando no país, ainda são relativamente escassos. A dica é aprender o alfabeto cirílico para não se sentir tão perdido. Mesmo que aprender russo seja impraticável para uma simples viagem, saber o que aquelas letrinhas quadradas significam pode tirá-lo de boas enrascadas, já que a maioria das palavras-chave são de raiz latina ou muito próximas das línguas saxônicas, como o inglês e o alemão, por exemplo.
Encrenqueiros e valentões: a Rússia ainda é um país muito patriarcal e atrasado em diversos aspectos. Enquanto São Petersburgo tende a ser mais cosmopolita e aberta, a homofobia e o machismo são problemas presentes e palpáveis no restante do país, principalmente em Moscou. A cultura da masculinidade violenta resulta em diversas brigas de rua entre valentões dispostos a provar seu valor. O nacionalismo dos russos também pode resultar em más impressões, principalmente em relação a questões delicadas, como a ocupação da Ucrânia e a ascensão da extrema-direita.
Proibido para turistas: enquanto a maior parte do país é receptiva com turistas, a área conhecida como Norte do Cáucaso ainda vive dias conturbados, com insurgências separatistas e muitos sequestros. As regiões da Chechênia, Daguestão e Ossétia do Norte, bem como suas províncias vizinhas, não são recomendadas aos visitantes pelos principais órgãos internacionais.
O que fazer:
Turismo subterrâneo: as estações de metrô de Moscou e, em menor grau, de São Petersburgo, são lindas e valem visitas à parte. Construídas durante o regime stalinista, são verdadeiros monumentos de ostentação e beleza, decoradas com mármore, ladrilhos, estátuas e lustres à moda soviética. Entre as mais notáveis de Moscou, destacam-se a Komsomolskaya, Prospekt Mira, Novoslobodskaya e Dostoievskaya – esta última, uma verdadeira homenagem ao maior dos escritores russos. A propósito, o sistema de metrôs da capital é um dos melhores do mundo, confiável e rápido.
Literatura por toda parte: para fãs de literatura, um olhar atento pelas principais cidades revelará o quanto seus autores são estimados. Monumentos a Dostoiévski, Tolstói, Gógol e Turguêniev podem ser encontrados com relativa facilidade pelas ruas da capital. Se você estiver com sorte, é possível comprar com os ambulantes das principais praças um sorvete com o formato da cabeça do poeta Vladimir Maiakóvski.
Espetáculos: não é segredo que alguns dos melhores instrumentistas do mundo são russos. Uma viagem ao país pode ser uma boa oportunidade de ver artistas incríveis em ação. Em Moscou, o Teatro Bolshoi fica no centro da cidade e já é um clássico entre os turistas. Já em São Petersburgo, o Teatro Mariinski oferece, em um espaço exuberante, uma programação vasta de óperas e concertos de alto nível, privilegiando autores nacionais. Tchaikovsky, Prokofiev e Glinka provavelmente estarão no repertório.
Vizinhos charmosos
Que tal um passeio pelo mar báltico? Em São Petersburgo, existem diversas linhas de cruzeiros que vão até algumas cidades encantadoras em países vizinhos. Tallinn, na Estônia, é um paraíso medieval preservado em toda a sua glória, enquanto Riga, na Letônia, possui um charme mais antigo e sofisticado. A capital finlandesa, Helsinque, também possui um centro histórico de castelos e prédios imponentes, além da ilha de Suomenlinna, destino de nove em cada dez finlandeses no verão. Já para quem vai assistir aos jogos em Kaliningrado, uma ida a Estocolmo, na Suécia, Varsóvia, na Polônia, ou à capital da Lituânia, Vilnius, pode ser uma boa opção de passeio.
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*Matéria publicada por Yuri Al’Hanati originalmente na edição 210 da revista TOPVIEW.