Gastronomia redefine o luxo na hotelaria mundial
A hotelaria de luxo está redesenhando suas prioridades sob um paradigma claro. Experiência não se hospeda, se vive. E, nesse novo arranjo, três pilares emergem como indissociáveis: gastronomia, arquitetura e enraizamento territorial. Não por acaso, os empreendimentos que lideram essa virada tratam a cozinha, o design e a conexão com o entorno não como serviços, mas como linguagens de identidade.
O movimento é global. Na África, a rede Singita vai além da alta gastronomia e criou escolas culinárias comunitárias que formam jovens chefs na Tanzânia e em Ruanda, com diplomas internacionais. O resultado é uma cozinha que dialoga com a paisagem, valoriza produtores locais e ancora-se na cultura regional, transformando cada refeição em uma experiência imersiva que conecta hóspede, território e comunidade.
No Brasil, a tendência ganha maturidade própria e se expande. O Casa Marambaia, hotel-boutique em Petrópolis, exemplifi ca essa convergência com apenas 12 acomodações, que integram
gastronomia de autor assinada pelo chef Rafa Costa e Silva, à frente do Lasai, restaurante carioca com duas estrelas Michelin.

Agora, o conceito se estende ao residencial com casas projetadas por grandes nomes. Assim, será possível usufruir da gastronomia do hotel, sinalizando que a experiência culinária como âncora migra também para o universo das residências de luxo. Ao inserir serviços na forma de viver, o projeto evidencia sofisticação e excelência, com curadoria de Patrícia Quentel e Patrícia Mayer, sócias-diretoras da CASACOR Rio de Janeiro há mais de 30 anos.
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Nos Lençóis Maranhenses, a OIÁ Casa Lençóis materializa essa lógica de forma radical. O projeto de Marina Linhares, com mobiliários assinados por brasileiros que incluem Carlos Motta e artesanato regional, cria uma atmosfera sofisticada enraizada na cultura local. A gastronomia valoriza ingredientes de horta própria e produtores maranhenses, servida em cenários inusitados, como sob cajueiros ou à beira de lagoas, em que cada refeição se desdobra em um ritual de pertencimento ao lugar.
A Rede Bourbon formalizou o posicionamento ao criar, em 2023, a divisão Bourbon Gastronomia. Restaurantes como o Vezzoso Cucina operam como ativos estratégicos. Um jantar com trufas no Bourbon Cataratas, comandado por Salvatore Loi, encheu de moradores locais e evidenciou que o restaurante transcendeu o público do hotel.
Essa virada conversa com tendências maiores, como a busca por autenticidade, o slow travel, que privilegia profundidade sobre quantidade, e o entendimento de que luxo contemporâneo está também no contemplar aquilo que é local. A arquitetura deixa de ser cenário para se tornar curadora da experiência, enquanto a gastronomia funciona como elo entre corpo e território.
Na hotelaria que importa hoje, quem orquestra bem a cozinha e o espaço orquestra a experiência inteira e redefine o que significa pertencer a um lugar.
*Matéria originalmente publicada na edição #306 da TOPVIEW.