Exposição comemora os 20 anos da Galeria Ybakatu
A três dias da abertura, o espaço da exposição comemorativa da Ybakatu parecia a casa de uma família numerosa em obras. Artistas, assistentes de montagem e colaboradores circulavam pelos dois andares do imóvel, se ocupando da disposição de uma escultura, do paradeiro do eletricista, dos filhos que deviam ser buscados na escola, dos docinhos de festa (era aniversário de uma assistente), da iluminação de um recinto. Tuca Nissel, proprietária da galeria, segurava um pacote de gelo contra o queixo, depois de um leve acidente envolvendo uma reprodução de retroescavadeira, obra de João Loureiro.
Com tanto acontecendo, a impressão não era de bagunça, mas de um espaço vivo. Talvez pela postura calma, prática e agregadora da galerista. “Não tem uma curadoria conceitual nessa exposição, é a ocupação de uma casa”, resumiu Tuca, pouco afeita às definições, conceitos e adornos do meio. “A gente anda pela casa, vai dispondo as obras e vendo o que fica bom.”
Foi nesse espírito que a Ybakatu Espaço de Arte surgiu, em 1995. Então se graduando na EMBAP (Escola de Música e Belas Artes do Paraná), Tuca precisava de um local para expor suas esculturas, como parte de um projeto do curso: um quarto no antigo imóvel da família cumpriu a função. Essa primeira exposição foi logo emendada por uma de Debora Santiago e outras mais, até que a galeria tomou a casa na rua Itupava.
Nesses 20 anos, Tuca Nissel abriu mão de sua própria produção para se dedicar a de outros artistas: realizou mais de 100 exposições, criando um espaço importante para artistas curitibanos, inicialmente; participou de grandes feiras no Brasil e na Europa: fechou parcerias de “intercâmbio” com galerias estrangeiras; descobriu e incorporou artistas de diferentes nacionalidades, como o português Isaque Pinheiro.
“Fiquei apaixonada pelo trabalho dele e fui atrás. Comecei a mostrá-lo na ARCO (Madrid), trouxe as obras para cá e vendi para coleções super legais, daqui, da Dinamarca, da Turquia…”, lembra. No lugar de uma possível frustração enquanto escultora, o que se vê é uma galerista orgulhosa por dar visibilidade e criar novas possibilidades para seus artistas.
Olhar e afinidade
O perfil da Ybakatu parece ser definido pelas paixões de Tuca Nissel por determinadas obras e artistas. Eles não têm uma nacionalidade, um tema ou uma linguagem em comum. O curitibano C. L. Salvaro, que atualmente mora em Belo Horizonte, cria a partir da apropriação de objetos do lugar em que vai expor; o holandês radicado em Nova York Sebastiaan Bremer é conhecido pelos desenhos diretos sobre fotografias; o brasileiro radicado na Alemanha Alex Flemming, reconhecido internacionalmente, trabalha com gravura, escultura, pintura. “O que me atrai é a qualidade da produção, da pesquisa…”, a galerista tenta explicar.
E não adianta insistir nas características, qualidades que ela procura em uma obra de arte. “Não existe uma nomenclatura para essas coisas. Não é necessário chegar num mínimo múltiplo comum para desovar”, disse, desconcertada com generalizações. “A coisa é um pouco mais ampla. Não existe isso no meu trabalho.”
Vista de fora, a Ybakatu pode parecer uma grande família, como alguns profissionais do meio sugeriram. Simone Landal, especialista em história da arte do século 20 que acompanhou a trajetória da galeria, ressalta o afeto nessa relação: “Foi a partir do círculo de amizades da Tuca que a galeria foi crescendo, e esse traço, essa ideia de contatos centrados em afeto, sempre esteve presente nas suas ações, mesmo com o passar do tempo, com o profissionalismo, com o envolvimento de muitas outras pessoas”. Novamente, Tuca minimiza, dizendo ter “uma boa relação com todos os artistas”, “sem muito stress”.
Hoje são 28 artistas vinculados (número limite que ela dá conta), com quem procura manter contato constante, conversar sobre as obras, cuidando para não interferir. “Como é uma pesquisa autoral, acho que qualquer tipo de interferência é ruim”, define a galerista. Limite similar ela estabelece para a própria Ybakatu. A estratégia de feiras envolve altos custos – desde envio do projeto, sua aceitação, pagamento do stand, transporte e seguro das obras, etc. – e é duvidosa (como o próprio mercado de arte), podendo não dar retorno imediato. Ainda assim, Tuca é enfática quando afirma nunca ter feito concessões: “Prefiro procurar um mercado para aquilo com que eu trabalho”.
Curitiba não favorece. Se em uma entrevista de 2011 a galerista disse que apesar dos bons artistas, não havia mercado na cidade, hoje considera que o cenário está melhorando com a abertura de novas galerias e mesmo com a Bienal de Curitiba, que ajuda a inserir a capital na rota de curadores internacionais. Ainda assim, ela constata que há mais aceitação para o perfil de seus artistas em São Paulo. Faltam aqui, segundo Tuca, mais interessados em comprar arte e criar coleções.
“Meu trabalho sempre foi de manter um perfil do que eu queria ter na galeria, e não o que as pessoas falavam que eu deveria ter”, relembrou, trazendo termos como “insistência” e “perseverança” para definir essas duas décadas. “É mais a questão do meu olhar e da minha afinidade com a produção de determinados artistas.”
Talvez ela não seja protagonista como naquela primeira exposição, mas construiu um papel de destaque (e encontrou satisfação) no meio-de-campo. Em uma edição da ARCO, em Madrid, a galerista “chorou de emoção” ao receber a ligação de uma colecionadora, agradecendo o trabalho da pintora curitibana Tatiana Stropp que havia comprado. “Poder presenciar essas coisas, saber que de alguma maneira você está fazendo essa conexão, é muito gratificante”, relata Tuca Nissel sobre essa que é sua grande obra.
20 anos da galeria Ybakatu Espaço de Arte
De 21 de novembro a 20 de dezembro.
Terça a sábado, das 14h às 20h; domingo, das 13h às 17h.
Rua Carmelo Rangel, 455, Batel. (41) 3264-4752.
Entrada franca.