ESTILO

Edifício Canadá: ícone da arquitetura paranaense

A importância para as cidades de uma arquitetura moderna e contextualizada

Em seguimento à matéria 60’s – Os principais edifícios residenciais de Curitiba da década de 1960 – na edição #249, destacamos aqui o Edifício Canadá, eleito nas redes sociais do nosso escritório o edifício que melhor representa a Curitiba dos anos 1960. O primeiro “um por andar” da cidade está situado na rua Comendador Araújo, 560, e conta com pouco mais de 250 m² de área privativa por unidade. O projeto é do arquiteto Elgson Ribeiro Gomes, logo no início da década, em 1961. O prédio foi construído e incorporado pela Velloso Camargo.

O Edifício Canadá representa a Curitiba dos anos 1960 e fica na badalada rua Comendador Araújo.

Podemos considerar o Canadá um marco urbano – em uma cidade desprovida de referências naturais, a arquitetura assume esse protagonismo. O projeto, muito à frente do que se costumava fazer em uma ainda provinciana Curitiba, encontrou incorporadores dispostos a correr riscos e, corajosamente, assumiu a linguagem arquitetônica do seu tempo.

“O Canadá materializou um momento em que os melhores arquitetos estavam a serviço das construtoras e dos incorporadores, que lhes davam autonomia projetual, o que resultou em criatividade, inovação e ousadia. Quem ganhou foram os moradores, a rua e a cidade.” – Fábio Domingos

Notabiliza-se pela estrutura em colunas trazida para as fachadas, o que, contemporaneamente, passamos a chamar de “exoesqueleto”, e pela fachada inteiramente livre e sublinhada pelas grandes janelas chanfradas em zigue-zague. O corpo principal do edifício combina linhas diagonais com arcos côncavos e convexos e contém a área social do apartamento em uma ousada proposta espacial, ainda hoje pouco compreendida por uma maioria afeita a espaços retangulares. Esse perímetro, cuidadosamente traçado, além de potencializar as vistas do apartamento e trazer maior luminosidade dos diversos quadrantes, busca uma melhor orientação solar à Leste.

Planta isométrica do edifício feita pela arquiteta Vivian Brune.

Avançando ainda em direção ao Norte, viabiliza aberturas a Nordeste, garantindo maior insolação e aquecimento para a área social integrada. Algo por si só já bastante inovador, ao excluir a sala de visitas ou a sala de jantar separadas. Na ausência de todo esse raciocínio arquitetônico, a fachada principal voltada para a rua estaria apenas orientada para Sudeste, o que, em uma cidade fria como a nossa, se constituiria, certamente, em um grave erro.

“Em 2019, a arquiteta Vivian Brune foi chamada para fazer o projeto de arquitetura de interiores do 17º andar do Edifício Canadá. Um jovem morador com um novo conceito de morar, de acordo com a arquiteta: “Um projeto que questiona a ideia e a estética de residência tradicional, já que, no contexto atual, a restrição de privacidade acontece em ambientes pontuais – e um apartamento passa a ter atividades de moradia, trabalho e até de hospedagem, com a opção de Airbnb.”

Um elegante embasamento com pilares em “V” e esquadrias de aço inox distinguem ainda hoje o acesso ao edifício, criando uma relação amigável e gentil com a via pública e a cidade. Diferentemente de tantos lamentáveis edifícios curitibanos, que, almejando a permanência ou o status por meio de uma falsa antiguidade, já nascem velhos, ou de tantos outros que, imaginando-se modernos, não passam de tristes cópias de modelos importados ou de uma modernidade descartável e decorativa, o Edifício Canadá foi verdadeiramente moderno e não envelhecerá jamais – ao contrário, assim como toda a boa arquitetura, que só melhora com os anos, nasceu contemporâneo. Boa fruição!

Projeto de interiores assinado por Vivian Brune. (Foto: Eduardo Macarios)
(Foto: Eduardo Macarios)
(Foto: Eduardo Macarios)

ELGSON RIBEIRO GOMES

Nascido em Florianópolis, em 1922, Elgson Ribeiro Gomes graduou-se como engenheiro civil pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) em 1945. Em seguida, mudou-se para São Paulo, frequentando a Associação Paulista de Belas Artes, e conheceu o arquiteto Adolf Franz Heep, recém- chegado de Paris, com quem trabalhou de 1950 até 1959. Durante esse período, graduou-se também em Arquitetura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, em 1958. No retorno à capital paranaense, abriu seu próprio escritório. Convidado a lecionar no curso de Arquitetura e Urbanismo da UFPR, permaneceu como docente entre 1963 e 1992. Responsável pela mudança de uma parcela significativa da paisagem moderna da capital paranaense, são de autoria do arquiteto os projetos de alguns dos mais importantes edifícios da região central da cidade.

Edifício Canadá

Edifício construído entre 1960-1963, pelo arquiteto Elgson Ribeiro Gomes, importante participação na arquitetura modernista no Paraná. Inovou tanto no programa, como primeiro lançamento de edifício com 1 apartamento por andar em Curitiba, quanto em sua técnica construtiva com primeiro uso de janelas de alumínio em edifício em Curitiba. Fachada marcada por janelas sinuosas, que acompanham as vigas que alternam em cada pavimento. Valorização da estrutura, no movimento das vigas e nos pilares redondos como exoesqueleto.

Apartamento TNI:

Aproveitar os pontos positivos do edifício: a boa metragem quadrada e amplitude dos espaços internos, cada vez mais raros em novas edificações; localização central privilegiada; arquitetura marcante modernista de Curitiba, com espaços e janelas únicas que por si só tornam o espaço único.

Pontos negativos a melhorar: espaços de cozinha e serviço fragmentados em diversos ambientes pequenos e mal iluminados, com cozinha, dispensa, lavanderia, quarto e banheiro de empregada com programa e distribuição em desuso; acabamentos e instalações de infraestrutura em condições precárias, sem manutenção e com muitos improvisos “provisórios”; ambientes escuros e com pouca ventilação cruzada.

Objetivo: atender demanda cotidiana e social atual de uma pessoa jovem, possibilitando diferentes escalas de eventos em espaços amplos e fluídos.

Projeto:

  • Transformar o programa do edifício antigo fragmentado e sem boa distribuição de iluminação e ventilação natural em espaços integrados de convívio e eventos. Adequações na estrutura, com eliminação de algumas paredes para ampliação e integração do espaço de cozinha com os demais ambientes;
  • Diálogo entre o contemporâneo e o antigo, propõe-se manter acabamentos originais em bom estado. Tirar partido das características originais do imóvel: manutenção de todo acabamento existente original em bom estado: piso parquet; esquadria interna em serralheria mantida e reposicionada; revelação da estrutura (vigas e pilares) em concreto aparente onde foram realizadas intervenções; manter armários e portas originais; Remoção de todas intervenções não originais: sancas e detalhes em gesso; instalações aparentes e “gambiarras”; revestimentos de azulejos muito danificados;
  • Proposta de revestimentos: troca de revestimentos por materiais condizentes com a época como os azulejos de tamanho pequeno (ladrilho em mural da cozinha e ladrilhos do banheiro de serviços); ou materiais contemporâneos como o piso monolítico de microcimento, que pode ser aplicado sobre revestimento existente em diversos ambientes e assim cria unidade ao projeto. Uma base em tons modernistas: a madeira com novo tratamento de ebanização, branco, concreto aparente e cimento queimado. Intervenções pontuais de cor em tons de verde/azul e no mural em azulejos da cozinha.
  • Tendo uma base em tons neutros e que respeita o modernismo da época em que foi construído, o complemento do mobiliário solto é composto por peças de clássicos do design modernista + mobiliário, pinturas e objetos contemporâneos, de produção de jovens artistas nacionais/locais + objetos antigos encontrados em antiquários que completam uma atmosfera autêntica e atemporal. O mobiliário é predominando solto, sem ordem fixa, que junto às cores e quadros apoiados no piso reforçam a estética despojada.
  • Um projeto funcional, flexível e de certa forma imperfeito, pronto para mudanças. A opção por bancadas em cimento/concreto, materiais que mostram marcas de uso e estrutura em concreto aparente refletem o espírito leve e desapegado do morador, que aceita a imprevisibilidade como resultado e o imperfeito como parte da memória e do processo.
  • Um projeto que questiona a ideia e estética de residência tradicional, já que no contexto atual a restrição de privacidade acontece em ambientes pontuais e um apartamento passa a ter atividades de moradia, trabalho e até de hospedagem com a opção de Airbnb. A nova porta de acesso principal, em vidro transparente, segue esse conceito além de melhor iluminar o hall social.

*Coluna originalmente publicada na edição #251 da revista TOPVIEW.

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