ESTILO

Diversidade na mesa

Sem experiência gastronômica anterior, o ator Gabriel Castro viu no Pão que o Viado Amassou uma oportunidade de levar a questão da visibilidade LGBTQIA+ para novos espaços

Se você perguntasse a Gabriel Castro no começo deste ano sobre pães, ele não saberia muito mais do que um consumidor comum. Em abril, em meio à pandemia, isso mudou. O ator criou O Pão que o Viado Amassou, delivery de pães caseiros. Foi mais precisamente no dia 21, no aniversário da Cher, o que, para o ator, não é mera coincidência, mas, sim, um sinal de bom presságio. “[Antes disso] eu tinha tentado fazer pão duas vezes, mas não foi uma boa experiência gastronômica. Acho que pão deve ser uma comida canceriana [signo], porque, em um dia, ele funciona de um jeito, no dia seguinte, você tem que mudar totalmente o processo para aquilo acontecer (risos)”, brinca.

Tudo começou como uma brincadeira. Gabriel é ator, trapezista e professor de teatro e de circo, então ficou sem trabalho de um dia para o outro, em março. No tempo livre, decidiu tentar fazer pães para presentear os amigos. Não demorou para sugerirem que deveria vendê-los. “A partir do momento em que surgiu este nome, em uma ligação com uma amiga, começou a fazer sentido não a ideia de fazer pães, mas a de que, com a venda de pães, eu poderia abrir caminho para um diálogo”, relembra.

“[A marca] é um posicionamento que ganhou um negócio para falar sobre ele”

O trocadilho não demorou para viralizar – e, com isso, os pães. O passatempo se tornou uma ferramenta para levar a bandeira da visibilidade LGBTQIA+ a mais espaços. “O movimento da marca é o inverso: não é um negócio que tem posicionamento, mas, sim, um posicionamento que ganhou um  negócio para falar sobre ele”, defende.

No começo, eram 20 pães por semana. Depois de ter a primeira matéria em um jornal de Brasília, passou a produzir 100 unidades. O negócio cresceu em um processo muito orgânico e natural. O que não mudou foi o cuidado de Gabriel com a luta que seus produtos espalham. “Quando percebi que a marca era porta-voz para causas de muita gente, tenho muito cuidado para que não seja só uma narrativa. Tenho cuidado com todos os fornecedores e com quem se liga a essa marca”, conta.

Com leveza e bom humor, o ator aborda temas delicados e politiza a conversa. A alegria com que conduz o negócio vem, em parte, do seu ofício original. “Queria um diálogo que tivesse meu tom. A necessidade de catar um sorriso é parte do meu dia a dia”, diz. Sua luta é uma tentativa de falar não só por si, mas, também, por pessoas que estão em posições mais vulneráveis e não conseguem. “Essa marca existe porque existe um grito a ser dado, existe uma necessidade de se reeducar e reconstruir esse pensamento.”

Se uma marca ainda precisa falar sobre isso, é porque ainda temos muito para avançar em igualdade e respeito. Gabriel entende que gerar diálogo e conquistar aliados é mais um passo nessa direção. “A homofobia não vai deixar de existir por conta de uma marca de pães, mas, sempre que recebo um retorno de que alguém levou o pão para casa e comeu com o pai e os dois falaram sobre isso, é um sinal de que a mensagem está rolando, a missão vai se cumprindo.”

Confira outras quatro histórias inspiradoras que fazem parte da matéria principal desta edição.

*Matéria originalmente publicada na edição #242 da revista TOPVIEW. 

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