ESTILO GASTRONOMIA

Curitibano: tradicional ou inovador?

Preso às raízes, o curitibano é um povo que se mantém firme às tradições, inclusive as culinárias. No entanto, sua fama de abraçar restaurantes inovadores coloca essa lenda à prova

Ao contrário dos grandes centros urbanos, Curitiba teve um desenvolvimento tardio. No final do século XIX, a capital paranaense era apenas uma vila de passagem. Ou seja, um local em que onde tropeiros passavam durante sua caminhada para o Rio Grande do Sul. Isso resultou no surgimento de uma cidade voltada às necessidades desse movimento, com restaurantes, armazéns e alojamentos.

No entanto, no início do século XX, imigrantes começaram a chegar na região e, vendo a oportunidade, fundaram empreendimentos de alimentação, como o Bar Stuart, estabelecimento histórico da cidade fundado em 1904 por um imigrante inglês, Joseph Richter. “Com o tempo, porém, vai se criando uma espécie de mito de que Curitiba é uma cidade formada por culturas europeias. E propagar essa cultura alimentar é uma forma de fortalecer essa ideia. Com isso, foi se criando a cultura de que os restaurantes antigos são parte da identidade do curitibano”, afirma o professor de História da África na Universidade Federal do Paraná (UFPR) e orientando de trabalhos sobre História da Alimentação Otávio Luiz Vieira Pinto.

Nesse movimento, surgiram restaurantes que são, até hoje, grandes referências na cidade. Um deles é o Ile de France, que foi fundado em 1953 por um casal de franceses que vieram ao Brasil por conta da 2a Guerra Mundial. Com a culinária francesa, o restaurante chamou a atenção da população, conquistou um público fiel e ajudou transformá-lo no conhecido estabelecimento que é hoje. E, depois de 68 anos no mesmo endereço, no Centro de Curitiba, o restaurante está mudando para a Av. do Batel, 1550.

Outro estabelecimento que guarda a história da cidade é o Madalosso, localizado em Santa Felicidade. Não há um curitibano que não tenha ido provar as iguarias da cozinha do interior da Itália. E, mesmo com sua fundação de longa data, em 1963, os salões imensos do restaurante continuam cheios. “Mesmo que o restaurante tenha os mesmos pratos, ele é um ambiente tradicional em que as famílias costumam se reunir como uma boa família italiana. Além disso, o sentimento de fazer parte da história da cidade é muito gratificante”, conta a gestora do restaurante, Mariana Werner.

Polenta: Prato típico servidos no Madalosso. (Foto: divulgação)

Um novo perfil de curitibanos 

O curitibano gosta de suas tradições e raízes. Isso não é segredo. Porém, não é de hoje que a população da capital paranaense abraça novos empreendimentos e ideias recém-chegadas à cidade. E, para quem fica na dúvida se, afinal, o curitibano é tradicional ou inovador, o professor Otávio responde: “São duas correntes de alimentação que não se excluem. Uma delas serve justamente para fazer a manutenção de uma ideia histórica de Curitiba e a outra traz a ideia de cidade de vanguarda no setor cultural, já que não consegue ser vanguarda econômica, como grandes centros urbanos”, explica.

É nessa vertente que nascem empreendimentos totalmente inovadores para a população curitibana. Um deles é o Raulino Cozinha Autoral, um restaurante de alta gastronomia que se denomina sem rótulos. “Nós usamos coisas da culinária oriental e ocidental, sem ficar preso a etnias, aplicando técnicas e ideias em cada preparo”, afirma André Raulino, chef e fundador do restaurante.

Polvo grelhado, do restaurante Raulino. (Foto: Fernando Zequinão)

Mas o que realmente pega o cliente de surpresa, literalmente, é seu Menu Confiance. O cardápio é um mistério para o cliente, feito com ingredientes que o chef encontrou no próprio dia. “Isso vai totalmente contra o que é o curitibano tradicional. Por isso, chamamos de “Menu Confiance”, pois o cliente precisa confiar no que vamos trazer na mesa para ele “, conta.

Outro restaurante que tem quebrado padrões em Curitiba é o ASU, do chef Danilo Takigawa. Também com alta gastronomia, o estabelecimento deixa o cliente à vontade para escolher a sequência de pratos que quiser, até começando pela sobremesa ou comendo com as mãos. “O conceito é oferecer uma refeição sem muitas formalidades, mais bagunçada. Queremos um serviço democrático, acessível e descolado, em que a pessoa possa ter a experiência com a qual ela se sentir mais à vontade”, afirma Danilo.

Como um bom vanguardista cultural, o curitibano sempre abraçou propostas inovadoras nesse meio. Por isso, não vai pensar duas vezes para frequentar o novo Âmbar Espaço Cultural, um local que une música, comida, bebida, cultura e serviços. “Nós temos operações de comida, música ao vivo, exposições de arte, café, coquetelaria, wine bar, salão de beleza, loja de roupas e muito mais”, afirma o proprietário do Âmbar, Pietro Nadalin Rodrigues. Sobre a aceitação do público, Pietro dispara: “O curitibano já aceitou”, referindo-se à agenda de reservas lotada para as próximas duas semanas.

Para saber mais

Livro: Curitiba, lares e bares: viagens pelas histórias e estórias nos dias e noites dos bares e afins de Curitiba 

Autor: Raul Guilherme Urban 

(Foto: reprodução)

Livro: Paraná: uma história 

Autor: Diego Antonelli

(Foto: reprodução)

*Matéria originalmente publicada na edição #253 da revista TOPVIEW

Deixe um comentário