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Os ensinamentos que meus pais me passaram sobre casamento

Para cada um, o casamento tem um significado diferente

Era a década de 1980 e eu ainda morava com meus pais, por isso, lembro com detalhes tudo o que ali se passava. Eu poderia não lembrar, mas o casamento dos meus pais foi, a meu ver, um dos mais bem-sucedidos que já vi. Eu mesma nunca casei, muito por conselho dele, o pai, que dizia que uma mulher deveria ser independente.

Eu não tinha idade para casar e, na minha casa, o que interessava era que estudássemos para aprender o valor das coisas e das pessoas igualmente. Assim, o casamento nunca estava na pauta. Eles mesmos se casaram rapidamente; em menos de seis meses, estavam trocando alianças e já começando o ritmo de trabalho e filhos. Minha mãe engravidou já na lua de mel, “exatamente nove meses depois do meu casamento”, ela dizia, garantindo que não havia pulado a cerca antes. Muito sérios, os dois tinham na união um pacto de não exigir nada de que o outro não gostasse.

Meu pai detestava festas, não fumava, bebia raramente e achava que não devíamos alimentar futilidades, nada de roupas caras, carros, viagens à Europa ou coisas do gênero. Ostentação com uma grande festa, então, não o pegava de jeito nenhum. Mas, no caso específico do convite de um casamento de uma prima com um homem riquíssimo, ele se viu obrigado a ir. A tal prima era filha de um primo querido dele e a festa aconteceria em um clube chique de Porto Alegre. Isso significava uma viagem longa até lá, umas oito horas de carro. Minha mãe ao volante, dirigindo com o rosto quase colado no para-brisa e indo para o acostamento sempre que precisava ultrapassar. Assim foram ao tal casamento.

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A única coisa que ninguém previu foi que, em meio aos familiares convidados, estava uma outra prima solteira, apaixonada pela noiva. Minha mãe, tensa no meio da festa, percebeu que a prima começava a ficar alterada pelas inúmeras doses de uísque.

Lá pelas tantas, ela inventa de trazer um pote de mel para o pai levar de volta para casa. Como se viam pouco – ela morava na capital e ia raramente ver a fazenda – e para debochar das pompas da festa da prima, resolveu trazer o “presente” para dentro da festa. Minha mãe, apavorada com a falta de etiqueta, pediu a meu pai que interviesse, fizesse algo, pois a alta granfinagem iria achar aquilo um horror e ridicularizaria a família toda, dividida entre herdeiros ricos ou pobres de uma pampa nobre. Não adiantou muita coisa: o pai, educado que só com as pessoas e incapaz de magoar a prima bêbada, acabou por pegar e sair com o pote de mel da festa. Resultado: nunca mais foram a festas de casamento. Aquilo tudo era uma bobagem e, para meu pai, a união verdadeira se fazia no dia a dia e no respeito mútuo.

As comemorações são lindas, mas o que vale é o amor. Se um pote de mel atravessar a sua festa podre de chique, acredite: pode ser um bom presságio!

*Matéria originalmente publicada na edição #300 da TOPVIEW

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