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Conheça as novidades do Mukeka

Ivan Lopes fala sobre a nova fase do restaurante e a comida brasileira que almeja: além do arroz e feijão, mas sem precisar ser alta gastronomia

A recém-chegada de um trio de ouro ao Mukeka colocou o restaurante em evidência. Não basta o curioso de uma cozinha tocada a seis mãos – veja só que mãos: as do chef Rodrigo Martins, que foi consultor de importantes restaurantes em Curitiba, como Terra Madre, C La Vie, Olivença e La Varenne; Ivan Lopes, chef fundador do Mukeka, e seu irmão Ivo Lopes, que ganhou fama nacional depois da participação do programa de tevê MasterChef.

Mas o que de fato muda no Mukeka? Tudo. Ou nada. O retorno às origens do restaurante é o objetivo desses cozinheiros experientes – e, num plano mais ambicioso, fazer do endereço uma referência nacional em cozinha brasileira.

Pratos regionais, ingredientes tradicionais reinterpretados e outros inusitados estão na mira de Ivan, que retoma a direção da cozinha no dia a dia. Rodrigo fica a cargo da gestão e controle, e Ivo está à frente de eventos, como aquele em que vai cozinhar ao lado de outros chefs, incorporando a identidade dos convidados ao menu.

Os chefs Rodrigo Martins, Ivan Lopes e Ivo Lopes assumem o Mukeka. Fotos Divulgação
Os chefs Rodrigo Martins, Ivan Lopes e Ivo Lopes assumem o Mukeka. Fotos Divulgação

Por enquanto, pouco muda no cardápio, mas o menu especial servido no jantar de 20 de janeiro dá pistas do que eles pretendem:

Petiscos: carne de sol e ora-pro-nóbis (planta utilizada na cozinha mineira), coxinha de pato e pequi (fruto da culinária sertaneja) e caldinho de abóbora kabotiá e taioba (erva também usada em Minas);
Entrada: picadinho de banana-da-terra com camarão e tapioca;
Pratos principais: pirarucu (peixe de água-doce da Amazônia) curado com cuscuz de milho ao tucupi (molho do caldo da mandioca-brava, típico do norte brasileiro), jambu (erva do Pará famosa por causar leve dormência na boca) e torresmo; paleta de leitão ao forno com purê rústico de mandioca e espinafre ao molho mostarda;
Sobremesa: goiabada cascão com queijo cremoso ao cumaru (semente amazônica bastante aromática) e farofa de castanha de caju.

Talvez pela casa cheia, nesse jantar em cinco tempos a apresentação dos pratos e o serviço foi instável; e os sabores de ingredientes interessantes ficaram “apagados” em alguns momentos. Mas o cumaru curado com cuscuz foi instigante, o ponto do leitão estava impecável, o picadinho de banana-da-terra foi uma boa surpresa e os convidados praticamente lamberam o prato com a versão mais leve, saborosa e bonita de Romeu e Julieta.

Na entrevista abaixo, feita por telefone, o chef Ivan Lopes fala sobre a “nova” cara do Mukeka, o tipo de cozinha brasileira que ambiciona (para além do arroz e feijão mas que não precisa ser alta gastronomia) e os desafios dessa fase que se inicia.

 

Quais são as principais mudanças que estão fazendo no Mukeka? É mais uma mudança de direcionamento ou reaproximação com a ideia inicial do restaurante?
Nesse primeiro momento, o que a gente mais precisa é voltar ao que o Mukeka realmente é: um restaurante de comida brasileira. Voltando a ele, estou vendo que o restaurante fugiu do seu foco. Por enquanto, estamos fazendo mudanças internas: reduzindo o cardápio e, principalmente, refazendo as receitas. Já teve uma redução de 20 a 30 pratos. E alguns clientes estão percebendo a mudança no sabor da comida.

Pode dar exemplos de pratos do antigo cardápio que acredita que descaracterizaram o restaurante?
Bife à parmegiana, hambúrguer, batata frita… Há publico para isso, mas o cliente precisa entender que ele vai ao Mukeka para comer comida brasileira, que não é só arroz e feijão. Tem uma enorme cadeia de ingredientes e a gente quer explorar isso cada vez mais, até fazer festivais de comida regional.

E o que já acrescentou ao menu?
Coloquei, nesse primeiro momento, nosso vongole, que é o berbigão, e um grelhado com legumes ou salada para o clima de verão. Mudei a guarnição do pirarucu para risoto de limão. Todo dia da semana tinha um prato fixo no almoço, nós cortamos ele e todo dia eu boto uma sugestão diferente além do cardápio, a R$ 26,90. Ontem, teve fígado acebolado na cachaça com purê de batata e jiló; hoje, teve picadinho de carne com batata, arroz, farofa e feijão. Feijoada agora é só uma vez por semana, e muito bem feita. A ideia é colocar mês que vem um cardápio novo.

E que linguagem querem dar à comida brasileira? Algo no sentido de alta gastronomia, como Alex Atala [D.O.M.] faz e Roberta Sudbrack fazia? Ou mais simples, como a Mara Salles [Tordesilhas]?
A linguagem que eu quero dar é uma comida como a Mara faz, como o Rodrigo Oliveira [do Mocotó] faz. É uma comida brasileira teoricamente simples, com ingredientes inusitados. Simples e bem feita. Não dá para ir numa linha Alex Atala, Roberta… É legal? É. Mas requer toda uma estrutura. A gente quer fazer o menos ser mais. Não tem segredo: comida tem que fazer muito bem feita, não importa os ingredientes.

E quais são alguns desses ingredientes inusitados com que pretende trabalhar?
Quero resgatar cumaru, explorar a taioba, o ora-pro-nóbis. Como gosto muito da culinária amazônica – peixes, ingredientes – quero explorar mais isso, fazer um prato com aviú, que é um microcamarão de água-doce. Fiz um torresmo com a pele do pirarucu no último jantar. A gente quer abusar da criatividade com esse peixe, entre outras carnes. Tem um ingrediente que eu adoro, que é o cuscuz de milho, que pode ser feito de uma forma como o cuscuz marroquino, soltinho.

O cardápio ideal se aproximaria, então, mais do menu de sexta-feira passada?
Sim, vamos utilizar algumas coisas desse menu. A sobremesa era um Romeu e Julieta de forma diferente. A gente quer abusar dessas coisas: os clássicos da comida brasileira, mas com uma releitura. Precisa fazer isso. A gente precisa dar um valor para os nossos clássicos, para os ingredientes que estão esquecidos. Executá-los de uma forma diferente. É surpreendente para as pessoas e a tendência é os chefs explorarem isso cada vez. A culinária brasileira deu uma alavancada muito grande de um tempo para cá e os chefs estão abusando da criatividade.

Difícil deve ser equilibrar essa criatividade com o lado financeiro…
A nossa guerra é exatamente essa. Tudo é muito caro, para trazer o produto é caro… Mas a gente tenta. Como dizem, o brasileiro não desiste nunca [risos]. Mas aqui mesmo, no sul, está crescendo muito [a entrada] de ingredientes diferentes, no próprio Mercado Municipal de Curitiba. E é preciso saber trabalhar com as coisas enxutas.

Vocês têm intenção de trabalhar com menu degustação?
Menu confiança, como chamo, eu sempre faço [de segunda a quarta-feira, R$ 59]. Gosto muito de criar ali, na hora, misturar isso com aquilo e fazer coisas que não estão no cardápio. Pegar os ingredientes que estão no cardápio e fazer algo diferente com eles.

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