Confissões de uma chef, por Eva dos Santos, do Bistrô do Victor
Há dois anos comecei a pensar no novo menu do Bistrô do Victor, casa que inaugurei e que chefio há seis anos. O impulso para mudar surgiu da vontade de atender aos anseios de alguns e de surpreender tantos outros. Penso na mudança como o início de um novo ciclo porque, com as novidades, eu sempre estive comprometida.
O processo de elaboração desse menu que estreia este ano não foi fácil, porque a grande maioria das opções do cardápio antigo já caiu no gosto dos clientes. Mas decidi que algumas coisas iriam sair, outras ganhariam releituras e outras seriam mantidas, como a Moqueca de Camarão, o Bacalhau na Brasa e a Casquinha de Siri, entre outros.
Devo dizer que o meu processo criativo começa pelo fornecedor. Preciso que ele me garanta o produto do jeito que eu quero e com a frequência que eu preciso. Definido o ingrediente principal, faço a criação do prato mentalmente, pensando na harmonização com ingredientes secundários e terciários. Depois imagino como seria a logística desse prato dentro da cozinha, como seria a apresentação do mesmo e, depois de tudo esquematizado, o próximo passo é a ficha técnica [padronização de quantidades de ingredientes, para garantir que o prato seja feito sempre da mesma forma] que, aliás, sofro para fazer e conto com o estimado suporte do meu subchef, Jefferson Ritzmann de Mello. Aliás, confesso que não sou uma pessoa de receitas. Tenho tudo na cabeça e não gosto de seguir um roteiro para cozinhar. Tenho que admitir, também, que informalmente muitas vezes preparei pratos para amigos que até hoje não sei como fiz. Quem comeu se lambuzou e, quem não comeu, não comerá mais.
Mas, voltando à construção do novo menu, pensei em matéria-prima nova e preparos diferenciados. Assim surgiu a Costela de Tambaqui e a Centolla da Patagônia. Minha ideia é que as pessoas curtam o ritual de se fartar com um caranguejo gigante, mas, em respeito ao ingrediente (para evitar desperdícios), e também pela sazonalidade, os clientes possam ter acesso somente à carne da Centolla. Aliás, gosto de ressaltar que o Bistrô do Victor é bistrô só no nome, porque temos uma enorme variedade de pratos e todos eles muito bem servidos.
Para essas e outras novidades, fiz vários testes, envolvendo funcionários e clientes. Acho muito importante ter feedbacks positivos antes de colocar o cardápio na rua – apesar de ninguém estar imune a uma possível rejeição depois da estreia.
O fato é que, depois de tantos anos pisando em terreno seguro, o processo de elaboração do novo menu me coloca cara a cara com a ansiedade. Vira e mexe penso nos astros do rock que ficam anos sem gravar, curtindo o mesmo sucesso. É verdade que os fãs até gostam dos clássicos, mas o fato é que as novidades sempre serão bem-vindas.