A melhor herança

Heranças de família vão muito além de bens materiais. Estão atreladas a paixões diversas, ao modo de se viver e encarar o dia a dia. Quando menos esperamos, lá estamos nós repetindo o que nossos pais ou avós faziam. E mais: passando adiante tudo isso.

Tenho fortes lembranças ligadas a carros. Desde pequena, lembro de encantar-me com eles – seja nas ruas, nas lojas ou na televisão. Fui da época em que os domingos de manhã eram reservados a se emocionar vendo a Fórmula 1. Que emoção eu sentia em pensar o quão rápido aquelas máquinas podiam correr.

Mas essa paixão tinha herança: era do meu avô Ismael Calixto. Como queria tê-lo conhecido! Infelizmente, foi a bordo do seu novo fusca que, em agosto de 1973, veio a trágica morte precoce. Mesmo as tragédias de carro assombrando a família, não tivemos medo dessa criação revolucionária para a humanidade.

A paixão transmitida a meu pai, chegou até mim. Lembro-me da emoção de cada carro adquirido. Eu queria saber todas as especificações técnicas e desde pequena já perguntava: “vai de zero a 100 km/h em quanto tempo?” Como se entendesse… Lembro-me, ainda, de uma vez quando meu pai chegou em casa com uma moto, minha mãe ficou apavorada e eu me animei com a emoção em andar em sua garupa com o vento no rosto.

Nossas viagens de carro me trazem o gosto da infância. Minhas férias em Foz do Iguaçu sempre tinham o momento da observação da estrada, o ver como dirigir, o escutar as histórias das viagens de meu pai com meu avô… Elas eram contadas inúmeras vezes e até hoje reverbera a clássica história de quando ele tinha 13 anos e dirigiu de Curitiba até Foz do Iguaçú com um Galaxie Landau, no ano em que estavam afastando a estrada.

Pode-se perceber que não tardou em eu querer estar no comando dessa paixão de família. E assim foi: todos os fins de semana, após atormentar meu pai, eu saía com meu pai com cerca de 12 anos para tomar o volante. Não precisava me ensinar, pois desde sempre observava atenta os pés e mãos dele nas trocas de marcha. No dia dos 18 anos, com a carteira de habilitação em mãos, minha maior emoção da vida seria sair sozinha. Meu primeiro carro foi um Fiat 147 – todo mexido para sua máxima potência (risos) –, com o qual passei belos dias entre a faculdade e as festas. Escolho cada carro meu e sei de todas as especificações e tudo o que eu e ele precisamos.

Quando me livro de todos os pensamentos é quando estou no controle da máquina com a minha música preferida. Amo pegar a estrada! E com os meus filhos não seria diferente… herança passada com sucesso. Eles amam desde motocross a caminhões. Me fascina ver aquelas carinhas tomando o controle dos motorizados.

Com os olhos embargados de emoção em escrever essa matéria, digo para vocês: medo da máquina poderosa? Não! Como diz no seriado F1 da Netflix, “Dirigir para viver”. Registro aqui a participação especial de meu pai, Elias Calixto Neto, e meus filhos.

*Coluna originalmente publicada na edição #247 da revista TOPVIEW.