Chega de tendências? Conheça a opinião de Marcos Novak sobre o tema
Nunca estabeleci lá muitas afinidades com a palavra “tendência”. Causa-me uma certa perturbação sempre que as correntes ligadas à moda ou à arquitetura enveredam-se indistintamente para esse termo. Mas por que, já que se trata de um conceito tão acolhido pelo senso comum? Ampliando-se as devidas análises, o panorama geral dessa palavra sugere um sentido de impulso, exaltação, vocação ou movimento que tende para alguma coisa ou lugar que, na maioria das vezes, opõe-se sistematicamente a condições de estabilidade ou permanência.
Ao infundir esse conceito no campo da arquitetura ou da moda, não há como escapar de certos anacronismos para expor algo que me parece menos ligado às incertas oscilações do futuro do que as referências do passado. Não o passado em si, mas o que podemos chamar de legado, ou seja, aquilo que permanece vivo, compondo um infinito campo de utilidades mentais. Aquilo que Borges chamava de “empório celestial de conhecimentos benévolos”.
Dentro dessa ótica, tanto a arquitetura quanto a moda movem-se lentamente e procuram a permanência no tempo e espaço por meio da matéria que as sustentam. O legado do século 20 é vasto e cada vez mais presente como linguagem no design contemporâneo. Tanto na moda como na arquitetura, alguns ícones blindaram a menor das possibilidades de transformações.
Um exemplo claro dessa sobrevida é a icônica Tweed Jacket Chanel, de 1954, que, até hoje, continua idêntica em suas estruturas. Pretendo seguir a mesma defesa relativa ao famoso perfume da casa: o Chanel No 5, que não mudou uma nota sequer entre seus preciosos aromas desde que foi criado, em 1921. Outro produto à prova de tendências é a bolsa Brillant, da marca de luxo mais antiga do mundo, que acaba de completar 190 anos, a Delvaux.
Do mesmo modo, na arquitetura, algumas sínteses são tão bem balizadas que hoje são confundidas com correntes estéticas atuais. É o caso do Pavilhão de Barcelona, de Mies Van der Rohe, executado em 1929 para uma exposição internacional. Era, portanto, uma construção temporária, “efêmera”, e acabou por conduzir uma infinidade de inspirações modernistas, reconstruído nos anos 1980 para que fosse selado o valor incondicional desse legado.
Diante dessa breve análise, afirmo com certa ufania que as coisas de qualidade realmente não têm época e não querem seguir o discurso das tais tendências por encerrarem uma linguagem estética desprovida de indagações.
Por Marcos Novak, convidado de Marcos Bertoldi.
Marcos Novak – por Marcos Bertoldi
Na edição anterior, a convidada foi minha professora Dilva Busarello. Neste mês, tenho o prazer de apresentar meu aluno, Marcos Novak. O tema “moda e arquitetura” é vasto e permite incontáveis abordagens. A ideia aqui é falar de “tendência”, essa palavra tóxica que contamina tanto a moda quanto a arquitetura. Espaço natural para o meu xará movimentar-se com total desenvoltura, tendo construído em ambas uma reputação sólida.
*Coluna originalmente publicada na edição 223 da revista TOPVIEW.
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