50 anos da “pedestrianização”
Neste mês, quando comemoramos meio século da Rua das Flores, nosso convidado é o arquiteto e urbanista Milton Naigeboren, formado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), professor universitário licenciado e consultor na Jaime Lerner Arquitetos Associados.
O Calçadão da Rua XV, como também é conhecido o local, é uma das marcas registradas da cidade, desenvolvido em um momento no qual a cidade deixava o seu famoso conservadorismo de lado e buscava um posicionamento de metrópole. Infelizmente, hoje, a rua está gravemente descaracterizada pelas intervenções desastradas e sem rumo, que não souberam abordar com respeito os projetos urbanístico e paisagístico originais. Uma cidade não pode trocar de aparência a cada gestão política. Administradores responsáveis deveriam saber que, mais importante do que substituir, é manter e preservar.
O projeto original, com seus inspirados e inéditos domos de acrílico roxos, elegantes luminárias modernistas na escala do pedestre e floreiras com implantação informal, foi abandonado: o que poderia ser uma imagem criativa e original para o primeiro calçadão brasileiro foi sendo pouco a pouco substituído por equipamentos rançosos e descontextualizados.
Chegamos ao ponto de ter postes de iluminação equivocados na linguagem e na finalidade, mais adequados a grandes avenidas, e com luz branca – como em um açougue sem as carnes –, jardins com traçado simétrico e fontes afrancesadas. Senhores mandatários, jamais seremos Paris. Parem de cancelar e obstruir a criação da nossa identidade. Recuperem o projeto original. Boa leitura!
– Marcos Bertoldi
Os 50 anos da Rua XV
Eram os primórdios dos anos 1970, o país vivia uma explosão de grandes obras viárias. O arquiteto e urbanista Jaime Lerner, aos 34 anos, estava revolucionando e borbulhando opiniões positivas e negativas em relação ao mais novo acontecimento de Curitiba. O pensamento da maioria dos governantes ia em direção aos veículos, acreditando que esse seria o futuro mais inteligente. A obra do Minhocão, em São Paulo, causava furor pela grandiosidade e pela visão de crescimento urbano. Por aqui, o “jovem prefeito” usava seu visionarismo e sua vivência na França para, do dia para a noite, transformar uma das ruas de maior circulação de veículos e congestionamento em um calçadão, dando lugar às pessoas – e não mais aos carros.
O novo calçadão, seguindo os belos traços do arquiteto Abraão Assad, teria as funções de um centro de cidade: comércio, lazer, trabalho e ponto de encontro. Para isso, além do fechamento com piso em petit pavê – tradicional na região central –, seria necessária a criação de equipamentos especialmente desenhados, como os icônicos quiosques em acrílico roxo e luminárias, todos na escala do pedestre, confirmando a nova função do espaço e criando, com isso, o termo “mobiliário urbano”. Os comerciantes não queriam a transformação, pois não conseguiam compreender que não eram os carros que traziam clientes, mas, sim, o caminhar tranquilo e observador dos pedestres. A grande lição é que a visão do urbanista já era a de que a qualidade de vida vem ao encontro de um bom funcionamento das cidades como um todo, tanto humana como economicamente.
Agora que a primeira rua exclusiva de pedestres completa 50 anos, parece óbvio o que foi feito na época, pois, atualmente, sofremos o impacto da quantidade infinita de veículos. Dessa forma, podemos nos questionar por que não implantar mais ruas de pedestres nos bairros, em regiões com vocação comercial. Esses novos calçadões poderiam, além de servir como ponto de encontro, ser área verde e de lazer, compensando a carência de algumas regiões das cidades.
MILTON NAIGEBOREN
Arquiteto e urbanista formado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), professor universitário licenciado e consultor na Jaime Lerner Arquitetos Associados.
*Matéria originalmente publicada na edição #263 da revista TOPVIEW.