ESTILO GASTRONOMIA

‘A gastronomia do Brasil está em plena forma’: Claude Troisgros completa 45 anos no país

Em entrevista exclusiva para a TOPVIEW, o chef francês apresenta o seu novo restaurante Madame Olympe e a sua visão de quatro décadas de contribuição para o desenvolvimento da alta gastronomia brasileira

Há 45 anos no Brasil, o chef francês Claude Troisgros concedeu uma entrevista exclusiva para a TOPVIEW. Em um almoço descontraído, o profissional, que mantém uma forte ligação com Curitiba ao ser um dos padrinhos do Hospital Pequeno Príncipe, apresentou a sua visão sobre o paladar brasileiro, o futuro da gastronomia e a própria contribuição para a evolução da alta gastronomia no Brasil.

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Troisgros também contou sobre o seu novo restaurante, o Madame Olympe, inaugurado em agosto de 2025. A casa, dedicada à fusão franco-brasileira, está localizada no bairro Leblon, no Rio de Janeiro.

menu madame olympe rio de janeiro
O Madame Olympe, restaurante de Claude Troisgros mantém menu degustação de oito pratos (Foto: Tomas Rangel)

Você está celebrando 45 anos aqui no Brasil. E a sua história se confunde com a evolução e a introdução da alta gastronomia aqui no país. Como você avalia a sua contribuição para a fusão da alta gastronomia francesa à rica oferta de alimentos no Brasil?

Eu sou da terceira geração da família Troisgois. E o restaurante da família existe até hoje em uma cidade pequena próxima de Lyon, no miolo da França. Meu pai e meu tio foram os criadores do movimento chamado “nova cozinha francesa”. Então fui educado nesse local. E quando eu tive a oportunidade de vir trabalhar no Brasil, em 1979, eu esperava ficar dois anos e, na verdade, nunca mais voltei a morar na França. Estou aqui há 45 anos, fazendo a minha vida profissional e familiar.

Quando cheguei no Brasil em 1979, a culinária francesa — a qual fui educado, em um viés mais criativo — ainda era tímida. Por aqui, a cozinha italiana e a portuguesa dominavam, no quesito internacional.

Eu vim para cá para representar um chef chamado Gaston Lenôtre, um chef muito famoso, amigo de meu pai. E eu precisava apresentar uma culinária baseada na nova cozinha francesa. Naquele período, havia uma dificuldade em reproduzir as receitas adequadamente por uma falta de insumos. Assim, comecei a tentar entender a culinária brasileira e me aproximar dos produtos maravilhosos que ela oferece, como a jabuticaba, o maracujá, a goiaba, a banana, o maxixe, o quiabo, a batata salsa e a mandioca. 

A ideia não era criar nada. Era simplesmente trabalhar com produtos frescos, produtos da estação. Dessa forma, eu passei a envolver os produtos brasileiros na nova cozinha francesa. Isso marcou os meus momentos e a minha personalidade.

E me fez ser reconhecido, até hoje, por ter sido um dos primeiros chefs a fazer esse estilo de cozinha. 

E quais evoluções você acredita terem sido alcançadas nesse período?

Em 45 anos, o país evoluiu muito. Na época em que cheguei aqui, o que havia de melhor era exportado. Hoje, temos produtos brasileiros de alto nível, que são incríveis e permanecem aqui. Temos queijos, azeites, vinhos, chocolates e cafés premiados. 

Então vejo uma evolução não só nos produtos, mas nos produtores, no paladar, nos chefs, na mão de obra, nos cozinheiros. Hoje, a gente tem um Brasil em plena forma gastronomicamente falando. 

Você é uma grande estrela de programas televisivos. O quanto os programas de culinária, em especial os reality shows, ajudam a levar o conhecimento da alta gastronomia para pessoas que, até então, não tinham esse espaço?

Eu estou na televisão há 25 anos. Nessa época, já existiam programas como os apresentados por Ana Maria Braga, Ofélia e Olivier Anquier. Mas eu fui um dos primeiros a mostrar a alta gastronomia no Brasil, com um programa chamado Menu Confiança, com Renato Machado, na GNT, que mostrava a receita e harmonização com vinhos — um programa muito cultural ligando o Brasil à gastronomia francesa.

Hoje, é claro que há uma evolução. Temos muitos programas, inclusive os reality shows. Isso faz evoluir muito. Não só para os profissionais, que podem aprender mais e melhorar o repertório. Mas também para os consumidores e os produtores, que buscam melhorar os produtos para atender a esse novo público. 

Há uma gama de programas extraordinários. E a televisão fez evoluir o mercado gastronômico. Estamos no auge desse tipo de produto.

A gastronomia tem voltado para um olhar sustentável e humanista. Como você avalia o futuro da gastronomia?

Eu fui educado em uma família que sempre pregou o não-desperdício de produtos. Essa preocupação é muito importante, porque temos uma Terra sofrendo —  no meu caso, ao estar em uma profissão ligada à terra, preciso ter clareza para fazer a nossa parte, para ajudar o mundo a não cair em um abismo.

Em meus restaurantes, eu tomo cuidado em trabalhar com produtos de primeira qualidade e, sempre que possível, orgânicos. Hoje, 80% dos meus cardápios são montados com produtos orgânicos e estamos trabalhando para aumentar este número. Além disso, escolho produtores próximos aos restaurantes, para reduzir os custos de transporte, poluição e perdas de alimentos.

Os menus buscam aproveitar o máximo possível de todos os produtos. Usamos ossos, cascas, espinhas, para produzir molhos, caldos e pratos novos. 

Aprendi com o meu avô: “lixo é luxo”. Então é preciso ter esse olhar de transformação do que iria para o lixo em um novo insumo. 

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Há pouco mais de três meses, você inaugurou o Madame Olympe, no Rio de Janeiro. O que esse restaurante oferece de novo para os seus clientes? 

O nome Olympe é em homenagem à minha mãe. Durante 38 anos, eu tive um restaurante chamado Olympe, na região do Jardim Botânico, no Rio de Janeiro. Ele foi bastante marcante no mercado da alta gastronomia franco-brasileira, se tornando uma referência não só no Rio de Janeiro, mas no Brasil todo. Mas durante a pandemia, decidimos fechar.

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Uma das etapas servidas no Madame Olympe (Foto: Tomas Rangel)

Mas senti que os clientes continuaram a buscar a alta gastronomia feita por mim. Isso porque eu tenho outros restaurantes, como o Chez Claude (Rio de Janeiro e São Paulo), o Cantina do Claude (Rio de Janeiro) e o Pala7 (Salvador). São ótimos restaurantes, modernos, com boa comida, mas não são de alta gastronomia. E para manter esse espaço, criamos o Madame Olympe, na região do Leblon — inaugurado em agosto deste ano. 

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Claude Troisgros prioriza produtores locais para manter a qualidade no cardápio (Foto: Tomas Rangel)

O cardápio é conduzido pela chef, Jéssica Trindade, que está comigo há 20 anos. O restaurante apresenta um menu degustação de oito etapas, com influências francesas e produtos brasileiros. É uma gastronomia de base, com técnicas francesas e muito bem executada.

 
 
 
 
 
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Em relação aos insumos, usamos ervas aromáticas, legumes e frutas da empresa Verde Orgânico, que trabalha comigo há 40 anos. Além de mel da Barra da Tijuca e pescados que chegam vivos ao restaurante. Esse trabalho nos ajuda a ter produtos frescos diariamente.

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